Lei Nº 16710 DE 11/10/2017


 Publicado no DOM - São Paulo em 12 out 2017


Dispõe sobre princípios e diretrizes para a elaboração e implementação das políticas públicas pela primeira infância no Município de São Paulo e sobre o Plano Municipal pela Primeira Infância e dá outras providências.


Gestor de Documentos Fiscais

João Doria, Prefeito do Município de São Paulo, no uso das atribuições que lhe são conferidas por lei,

Faz saber que a Câmara Municipal, em sessão de 4 de outubro de 2017, decretou e eu promulgo a seguinte lei:

CAPÍTULO I - DISPOSIÇÕES GERAIS

Art. 1º Esta lei estabelece princípios e diretrizes para a elaboração e implementação das políticas públicas para a primeira infância pelo Município de São Paulo.

§ 1º As políticas públicas para a primeira infância são instrumentos por meio dos quais o Município assegura o atendimento dos direitos da criança na primeira infância, com vistas ao seu desenvolvimento integral, considerando-a como cidadão de direitos.

§ 2º Para os efeitos desta lei, considera-se primeira infância o período que abrange os primeiros seis anos completos ou setenta e dois meses de vida da criança.

§ 3º Dado o caráter processual e a interconexão do ciclo vital, esta lei inclui disposições sobre ações a serem realizadas no período da gestação, no contexto da família e das instituições.

§ 4º As políticas públicas a que se refere esta lei, bem como os planos, programas e serviços de atenção à criança executados pelo Município, serão formulados segundo o princípio da prioridade absoluta estabelecida no art. 227 da Constituição Federal e explicitada no art. 4º da Lei Federal nº 8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente), e no art. 3º da Lei Federal nº 13.257, de 8 de março de 2016 (Marco Legal da Primeira Infância).

Art. 2º As políticas públicas e seus desdobramentos práticos em planos, projetos, ações e suas avaliações visarão assegurar a plena vivência da infância enquanto valor em si mesma e, simultaneamente, como etapa de um processo contínuo de crescimento, aprendizagem e desenvolvimento.

Parágrafo único. As políticas e ações referidas no "caput" deste artigo devem atender às peculiaridades dessa faixa etária e manterão intrínseca relação com aquelas direcionadas às etapas posteriores da vida da criança e do adolescente.

CAPÍTULO II - PRINCÍPIOS E DIRETRIZES

Art. 3º As políticas, os programas, planos, projetos e serviços voltados ao atendimento dos direitos da criança na primeira infância obedecerão aos seguintes princípios:

I - atenção ao interesse superior da criança;

II - desenvolvimento integral, abrangendo todos os aspectos da personalidade, com foco nas interações e no brincar, segundo a visão holística da criança;

III - respeito à individualidade e ritmo próprio de cada criança;

IV - valorização da diversidade das infâncias presentes no Município;

V - inclusão das crianças com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação e outras situações que requerem atenção especializada;

VI - fortalecimento do vínculo e pertencimento familiar e comunitário;

VII - participação da criança na definição das ações que lhe dizem respeito de acordo com o estágio de desenvolvimento e as formas de expressão próprias da idade;

VIII - corresponsabilidade da família, da sociedade e do Estado na atenção integral aos direitos da criança;

IX - investimento público na promoção da justiça social, da equidade e da inclusão sem discriminação da criança deve ser prioridade, para que se garanta isonomia ao acesso de bens e serviços que atendam crianças na primeira infância;

X - valorização e formação adequada e permanente dos profissionais que atuam diretamente com a criança, observado o Plano Municipal da Educação;

XI - incremento da cultura do cuidador por meio da proteção integral e a promoção da criança como cidadã ativa e participante da sociedade.

Art. 4º São diretrizes para a elaboração e implementação das políticas pela primeira infância:

I - abordagem multidisciplinar e intersetorial em todos os níveis, inclusive nos territórios de atuação dos serviços de atendimento da população;

II - participação das famílias e da sociedade, por meio de organizações representativas;

III - consideração do conhecimento científico acumulado sobre a vida e o desenvolvimento infantil e da experiência profissional nos diversos campos da atenção à criança;

IV - planejamento com perspectiva de curto, médio e longo prazo para os planos e programas;

V - previsão e destinação de recursos financeiros segundo o princípio da prioridade absoluta na garantia dos direitos da criança e do adolescente;

VI - monitoramento permanente, avaliação periódica e ampla publicidade das ações e dos resultados.

Art. 5º Constituem áreas prioritárias para as políticas públicas de atenção às crianças na primeira infância:

I - a saúde materno-infantil;

II - a segurança alimentar e nutricional, combatendo a desnutrição e obesidade infantil, assim como os demais transtornos alimentares na infância;

III - a educação infantil;

IV - o combate à pobreza;

V - a convivência familiar e comunitária;

VI - a assistência social à família e à criança;

VII - a cultura da infância e para a infância;

VIII - o brincar e o lazer;

IX - a interação no espaço público e o direito ao meio ambiente sustentável;

X - a participação na gestão urbana;

XI - a proteção contra toda forma de violência;

XII - a prevenção de acidentes;

XIII - a proteção contra a publicidade enganosa e abusiva voltada às crianças e a exposição precoce aos meios de comunicação.

Art. 6º As políticas públicas voltadas à primeira infância, dentre outras metas, deverão contemplar ações multidisciplinares que visem:

I - no setor de educação:

a) a universalização da educação infantil para as crianças de 4 (quatro) e 5 (cinco) anos;

b) o atendimento total na creche para crianças de 0 (zero) a 3 (três) anos segundo a demanda, priorizando as situações de pobreza e extrema pobreza, vulnerabilidade social e riscos ao desenvolvimento;

c) a educação integral, considerando a indissociabilidade entre o cuidar e o educar, tendo as interações e o brincar como eixos estruturantes;

d) a melhoria permanente da qualidade da oferta, com implementação de uma proposta pedagógica intencionalmente planejada e periodicamente avaliada, com instalações e equipamentos que obedeçam aos padrões de infraestrutura estabelecidos na legislação, com profissionais qualificados e materiais pedagógicos adequados à proposta pedagógica;

e) a ampliação da participação da família no planejamento e nas ações escolares;

f) a qualidade da alimentação escolar e sua adequação às necessidades de desenvolvimento em cada fase da vida durante a primeira infância;

g) a formação permanente e em serviço dos educadores e do pessoal técnico e auxiliar;

h) a ampliação do acervo de livros infantis, brinquedos e outros materiais de apoio às práticas pedagógicas nas escolas e creches municipais;

i) a ampliação do acesso a tecnologias que promovam a aprendizagem, com abordagens apropriadas para a respectiva faixa etária, do ponto de vista pedagógico;

j) o desenvolvimento de ações voltadas à prevenção da gravidez e das doenças sexualmente transmissíveis na adolescência;

k) a atenção diferenciada para as estudantes grávidas e mães de bebês;

II - no setor de saúde:

a) a orientação, o preparo e o amparo da gestante, bem como a orientação sobre crescimento e desenvolvimento saudável do bebê e da criança pequena;

b) a atenção humanizada à gravidez, ao parto e ao puerpério;

c) a promoção da amamentação no local de trabalho, com base nas diretrizes de proteção da maternidade, da Organização Internacional do Trabalho;

d) a implementação dos "Dez Passos para o Sucesso do Aleitamento Materno" nas maternidades, incluindo o fornecimento de leite materno para recém-nascidos doentes e vulneráveis;

e) o aconselhamento qualificado para amamentação nas instalações de saúde;

f) a aproximação entre as unidades de saúde e as comunidades e o incentivo às redes comunitárias que protegem, promovem e apoiam a amamentação;

g) o acesso ao exame de diagnóstico precoce da gravidez, ao pré-natal, com profilaxia de prevenção de doenças e tratamento das doenças diagnosticadas, ao atendimento que aborde a dimensão emocional da gestante e sua família, visita à maternidade de referência e apoio a grupos de desenvolvimento da parentalidade;

h) a prevenção, detecção precoce e tratamento imediato das doenças prevalentes na primeira infância;

i) a ampliação dos exames de rotina da saúde bucal, ocular e auditiva, bem como a orientação a respeito das doenças mais frequentes na infância;

j) a garantia de vacinas para toda a população infantil, conforme as recomendações do Programa Nacional de Imunização;

k) a informatização do sistema de registro e cadastro da carteira de vacinação e unificação dos serviços de saúde, com acesso aos dados por todos os órgãos municipais que promovam o atendimento da criança na primeira infância e aos familiares, se solicitado;

l) a orientação aos familiares sobre o exercício da parentalidade, aleitamento materno, alimentação complementar saudável, formação do vínculo afetivo, crescimento e desenvolvimento infantil integral, cuidados especiais a crianças com transtorno global de desenvolvimento, prevenção de acidentes e educação sem uso de castigos físicos, nos termos das alterações introduzidas pela Lei Federal nº 13.010, de 26 de junho de 2014, nas Leis Federais nº 8.069, de 1990, e nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996;

m) a disponibilização de protocolos e instrumentos de atendimento familiar que apoiem o desenvolvimento ativo das competências familiares promotoras do desenvolvimento integral;

n) a formação permanente dos profissionais, incluindo o preparo para atuação intersetorial;

III - no setor de assistência social:

a) o apoio à formação, fortalecimento ou restauração do vínculo afetivo entre a criança, a família e a comunidade, com programas específicos para os casos em que a criança esteja em abrigo ou em programa de proteção social;

b) a adoção de medidas sociais preventivas e a ampliação dos programas de atendimento à criança na primeira infância em situações de vulnerabilidade e risco;

c) a priorização do Programa Família Acolhedora, nos termos do art. 34 da Lei Federal nº 8.069, de 1990, e da Resolução nº 145, de 15 de outubro de 2004, do Conselho Nacional de Assistência Social - CNAS;

d) o apoio à participação das famílias em redes de proteção e cuidado da criança em seus contextos sociofamiliar e comunitário;

e) o estímulo à notificação de toda forma de violência contra a criança e a adoção de medidas educativas, visando ao respeito e ao cuidado integral na primeira infância;

f) a promoção da cultura de paz como forma de redução da violência;

g) a formação permanente dos profissionais, incluindo o preparo para atuação intersetorial;

IV - no setor da cultura e lazer:

a) o respeito à formação cultural da criança relativamente à identidade cultural e regional e à condição socioeconômica, étnico-racial, linguística e religiosa;

b) a participação das crianças em manifestações artísticas e culturais, com ênfase no patrimônio cultural de seus territórios e da cidade;

c) a realização de exposições itinerantes pela cidade de produções artísticas das crianças, bem como de programas de visitas a museus, exposições, feiras culturais;

d) a ampliação dos espaços e programas de lazer e recreação, prioritariamente nas áreas de maior vulnerabilidade social.

Parágrafo único. Além dos setores mencionados nos incisos I a IV do "caput" deste artigo, outros setores poderão desenvolver ações concomitantes às definidas neste artigo.

Art. 7º Terão prioridade nas políticas, programas, planos, projetos e serviços voltados ao atendimento da criança na primeira infância:

I - as famílias identificadas nas redes de saúde, educação e assistência social e pelos órgãos do Sistema de Garantia dos Direitos da Criança e do Adolescente que:

a) se encontrem em situação de vulnerabilidade e de risco;

b) sofram violações a seus direitos, prejudicando seu papel protetivo de cuidado e educação;

c) tenham crianças com deficiência;

II - as crianças que estejam sofrendo:

a) violação ou relativização dos direitos;

b) violência, castigos fisicos e humilhantes, exploração ou em situação degradante;

c) desnutrição ou obesidade infantil;

d) abandono ou omissão que as privem dos estímulos essenciais ao desenvolvimento físico, social, emocional e cognitivo.

CAPÍTULO III - DO COMITÊ GESTOR

Art. 8º As políticas setoriais voltadas ao atendimento dos direitos da criança de 0 (zero) a 6 (seis) anos serão articuladas com vistas à constituição da Política Municipal Integrada pela Primeira Infância, prevendo-se instância de coordenação multissetorial, na forma de Comitê Gestor lntersetorial, conforme dispuser o regulamento.

CAPÍTULO IV - DO MONITORAMENTO E AVALIAÇÃO

Art. 9º Compete ao Comitê Gestor Intersetorial referido no art. 8º desta lei articular as políticas e outras iniciativas voltadas ao desenvolvimento das crianças de 0 (zero) até 6 (seis) anos de idade, visando promover a integralidade do atendimento, bem como monitorar e avaliar periodicamente a implementação da Política Municipal Integrada pela Primeira Infância.

Art. 10. Para efeitos de monitoramento e avaliação, fica o Poder Executivo Municipal autorizado a criar e manter instrumento individual de registro unificado de dados relativos ao crescimento e desenvolvimento da criança, bem como dos programas e serviços públicos municipais dos quais seja beneficiária direta ou indireta.

CAPÍTULO V - DO PLANO MUNICIPAL DA PRIMEIRA INFÂNCIA

Art. 11. As políticas públicas a que se referem o art. 6º desta lei serão objeto do Plano Municipal da Primeira Infância, referenciado e articulado com os Planos Estadual e Nacional pela Primeira Infância, observando-se, na sua elaboração:

I - duração decenal ou superior;

II - abrangência de todos os direitos da criança nessa faixa etária;

III - concepção integral da criança como pessoa, sujeito de direitos e cidadã;

IV - inclusão de todas as crianças, com prioridade absoluta às que se encontram em situação de vulnerabilidade e risco;

V - elaboração conjunta e participativa de todos os setores e órgãos municipais que atuam em áreas que têm competências diretas ou relacionadas à vida e desenvolvimento das crianças;

VI - participação da sociedade, por meio de organizações representativas, das famílias e crianças na sua elaboração;

VII - articulação e complementaridade com as ações da União e do Estado na área da primeira infância;

VIII - monitoramento contínuo do processo, incluindo os elementos que compõem a oferta dos serviços, e avaliação dos resultados a cada 2 (dois) anos.

CAPÍTULO VI - DO APOIO ÀS FAMÍLIAS

Art. 12. Os programas destinados ao fortalecimento da família no exercício do cuidado e educação dos filhos na primeira infância articularão as ações voltadas à criança no contexto familiar com os programas sociais e serviços de atendimento aos direitos das crianças no território.

Art. 13. As políticas e programas governamentais de apoio às famílias, incluindo visitas domiciliares e programas de promoção da maternidade e da paternidade corresponsáveis, buscarão a articulação das áreas de saúde, nutrição, educação, assistência social, cultura, trabalho, habitação, meio ambiente e direitos humanos, entre outras, com vistas ao desenvolvimento integral da criança.

Art. 14. A oferta de programas e ações de visita domiciliar que estimulem o desenvolvimento integral na primeira infância será considerada estratégia de atuação do Poder Executivo e deverão contar com profissionais qualificados, apoiados por medidas que assegurem sua permanência e formação continuada.

CAPÍTULO VII - DA PARTICIPAÇÃO SOClAL

Art. 15. A sociedade participará da proteção e da promoção da criança na primeira infância, solidariamente com a família e o poder público, dentre outras formas:

I - formulando políticas e controlando ações, por meio de organizações representativas;

II - integrando conselhos de áreas relacionadas à primeira infância, com funções de acompanhamento, controle e avaliação;

III - executando ações diretamente ou em parceria com o poder público;

IV - desenvolvendo programas, projetos e ações compreendidos no conceito de responsabilidade social e de investimento social privado;

V - criando, apoiando e participando das redes de proteção e cuidado à criança nas comunidades;

VI - promovendo ou participando de campanhas e ações que visem aprofundar a consciência social sobre o significado da primeira infância no desenvolvimento do ser humano.

CAPÍTULO VIII - DAS PARCERIAS

Art. 16. Para fins de execução das políticas públicas de primeira infância, o Poder Executivo poderá firmar convênios com órgãos da Administração Direta ou Indireta, com outras esferas de governo, bem como celebrar parcerias com o setor privado e termos de fomento e colaboração, na forma da lei.

§ 1º As parcerias de que trata o "caput" deste artigo serão precedidas, obrigatoriamente, de licitação ou chamamento público, aos quais se dará ampla publicidade.

§ 2º A opção por parcerias com a iniciativa privada ou com entidades sem fins lucrativos para execução do previsto no "caput" deste artigo não substituirá o dever do poder público de manter a rede de atenção direta.

CAPÍTULO IX - DISPOSIÇÕES FINAIS

Art. 17. O art. 7º da Lei nº 14.485 , de 19 de julho de 2007, passa a vigorar acrescido dos seguintes itens:

"Art. 7º .....

CV - .....

- última semana de maio: Semana Municipal do Brincar;

.....

CLI - .....

d) semana do dia 1º a 7 de agosto: Semana Municipal da Primeira Infância."

Art. 18. Cada Secretaria Municipal responsável pelo atendimento da criança na primeira infância, no âmbito de sua competência, elaborará proposta orçamentária para financiamento dos programas, serviços e ações.

Art. 19. O Município informará à sociedade, anualmente, a soma dos recursos aplicados no conjunto dos programas e serviços voltados à primeira infância e o percentual estimado que os valores representam em relação ao respectivo orçamento realizado.

Art. 20. O Poder Executivo regulamentará a presente lei no prazo de 180 (cento e oitenta) dias da sua publicação.

Art. 21. As despesas decorrentes da execução do disposto nesta lei correrão por conta das dotações orçamentárias próprias, suplementadas se necessário.

Art. 22. Esta lei entrará em vigor na data de sua publicação.

PREFEITURA DO MUNICÍPIO DE SÃO PAULO, aos 11 de outubro de 2017, 464º da fundação de São Paulo.

JOÃO DORIA,

PREFEITO

ANDERSON POMINI,

Secretário Municipal de Justiça

JULIO FRANCISCO SEMEGHINI NETO,

Secretário do Governo Municipal

Publicada na Secretaria do Governo Municipal, em 11 de outubro de 2017.