Lei Nº 5279 DE 06/12/2018


 Publicado no DOE - MS em 7 dez 2018


Institui a Política Estadual de Agroecologia, Produção Orgânica e de Extrativismo Sustentável Orgânico, e dá outras providências.


Portal do SPED

O Governador do Estado de Mato Grosso do Sul.

Faço saber que a Assembleia Legislativa decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

Art. 1º Esta Lei institui a Política Estadual de Agroecologia, Produção Orgânica e de Extrativismo Sustentável Orgânico, com o objetivo de integrar, articular e adequar as políticas, programas e as ações indutoras da transição agroecológica, da produção orgânica e de base agroecológica e extrativismo sustentável, a fim de contribuir para o desenvolvimento sustentável e a qualidade de vida da população, por meio do uso sustentável dos recursos naturais e da oferta e do consumo de alimentos saudáveis.

Art. 2º A Política Estadual de Agroecologia, Produção Orgânica e de Extrativismo Sustentável Orgânico orientar-se-á pelos seguintes princípios:

I - desenvolvimento sustentável;

II - participação e protagonismo social e empresarial;

III - preservação e conservação ecológica com inclusão social;

IV - segurança e soberania alimentar;

V - equidade socioeconômica, de gênero e étnica;

VI - diversidade agrícola, biológica, territorial, da paisagem e cultural;

VII - reconhecimento da importância dos movimentos de agroecologia para a agrobiodiversidade e segurança alimentar;

VIII - fomento e incentivo à criação de cadeias produtivas orgânicas.

Art. 3º Para fins desta Lei, considera-se:

I - agricultura familiar: realizada por agricultores familiares de acordo com a definição da Lei Federal nº 11.326, de 24 de julho de 2006, que estabelece requisitos socioeconômicos de caracterização;

II - agroecologia: ciência ou campo do conhecimento transdisciplinar que estuda os agroecossistemas, fundamentada em conceitos, princípios e metodologias, visando ao desenvolvimento das relações entre capacidade produtiva, equilíbrio ecológico, equidade social e uso e conservação da biodiversidade e dos demais bens naturais por meio da articulação entre conhecimento técnico-científico, saberes e fazeres ancestrais e culturas populares e tradicionais, com foco na sustentabilidade;

III - transição agroecológica: processo gradual e orientado, de conversão de um sistema agrícola para o paradigma agroecológico, em que são incorporadas práticas e manejos ecologicamente sustentáveis e tecnologias ambientalmente seguras, de acordo com os princípios, diretrizes e as normas da agroecologia ou da produção orgânica;

IV - sistema orgânico de produção: aquele em que se adotam técnicas específicas, mediante a otimização do uso dos recursos naturais e socioeconômicos disponíveis e o respeito à integridade cultural das comunidades rurais, tendo por objetivo a sustentabilidade econômica e ecológica, a maximização dos benefícios sociais, a minimização da dependência de energia não renovável, empregando, sempre que possível, métodos culturais, biológicos e mecânicos, em contraposição ao uso de materiais sintéticos, a eliminação do uso de organismos geneticamente modificados e de radiações ionizantes, em qualquer fase do processo de produção, processamento, armazenamento, distribuição e comercialização, e a proteção do meio ambiente;

V - economia solidária: empreendimentos socioeconômicos em que se estabelecem relações econômicas baseadas na cooperação, solidariedade e na colaboração, organizadas e protagonizadas por múltiplos setores sociais e econômicos;

VI - serviços ambientais: ações realizadas intencionalmente, visando à preservação e à conservação dos ecossistemas e dos bens naturais como água, solo, biodiversidade, florestas, fauna e flora, as quais podem ser apoiadas, estimuladas e/ou recompensadas por meios econômicos e não econômicos;

VII - agrobiodiversidade: diversidade genética natural de espécies vegetais, animais e microbianas de relevância para a agricultura, agropecuária, alimentação e práticas correlatas que refletem a interação entre agricultores familiares, urbanos e periurbanos, povos e comunidades tradicionais e ambientes locais, conservados e produzidos sob condições ecológicas locais nos diferentes ecossistemas;

VIII - produtos da sociobiodiversidade: bens e serviços gerados com recursos da biodiversidade, destinados à formação de sistemas produtivos de interesse da sociedade, que promovam a manutenção e a valorização de suas práticas, saberes e fazeres, e assegurem os direitos decorrentes, para gerar renda e melhorar sua qualidade de vida e de seu ambiente;

IX - certificação orgânica: ato pelo qual um organismo de avaliação da conformidade credenciado, seja social, comunitário ou outros, dá garantia por escrito de que uma produção ou um processo claramente identificados foi metodicamente avaliado e está em conformidade com as normas de produção orgânica vigentes;

X - extrativismo sustentável: conjunto de práticas associadas ao manejo sustentável dos recursos naturais, seja de origem animal, vegetal ou mineral, em ecossistemas nativos ou modificados, orientadas pelo uso do conhecimento e práticas tradicionais e ancestrais;

XI - segurança alimentar e nutricional: realização do direito de todos ao acesso regular e permanente a alimentos de qualidade, em quantidade suficiente, sem comprometer o acesso a outras necessidades essenciais, tendo como base práticas alimentares promotoras de saúde que respeitem a diversidade cultural e que sejam ambiental, cultural, econômica e socialmente sustentáveis.

Parágrafo único. Equiparamse à agroecologia os sistemas denominados de agricultura ecológica, orgânica, biológica, biodinâmica e natural, nos termos estabelecidos na Lei Federal nº 10.831, de 23 de dezembro de 2003.

Art. 4º São diretrizes da Política Estadual de Agroecologia, Produção Orgânica e de Extrativismo Sustentável Orgânico:

I - o apoio e o fomento aos sistemas de produção agroecológicos e orgânicos consolidados e em transição agroecológica e orgânica;

II - a soberania, segurança alimentar e o direito humano à alimentação saudável, por meio da oferta de produtos de base agroecológica, orgânicos e/ou oriundos do extrativismo sustentável, isentos de contaminantes que ponham em risco a saúde humana e os recursos naturais;

III - o estímulo à diversificação da produção agrícola, territorial e da paisagem rural;

IV - a promoção da utilização dos recursos naturais, com manejo ecologicamente sustentável à integração e complementaridade das atividades agropecuárias e das agroflorestais;

V - a transversalidade, a articulação e a integração das políticas públicas municipais, estaduais e federais;

VI - o estímulo ao consumo de alimentos agroecológicos e orgânicos, por meio da promoção, divulgação e de investimentos no aumento da produção e comercialização dos produtos;

VII - a consolidação e o fortalecimento da participação e do protagonismo social em processos de garantia da qualidade, de metodologias de trabalho em desenvolvimento rural e do conhecimento de manejos de agroecossistemas;

VIII - a valorização da sociobiodiversidade e dos produtos da agrobiodiversidade, considerando os aspectos de cada bioma; e o reconhecimento dos sistemas agroecológicos e orgânicos como passíveis de retribuição por serviços ambientais prestados pelos agricultores;

IX - o apoio ao fortalecimento das organizações da sociedade civil e das redes sociais de economia solidária, cooperativas, associações e de empreendimentos econômicos que promovem a agroecologia, o extrativismo sustentável e a produção orgânica;

X - o estímulo à construção e à socialização de conhecimentos nos diferentes níveis e modalidades de ensino, na pesquisa, extensão, por meio do apoio às pesquisas científicas, sistematização de saberes e experiências tradicionais, metodologias de trabalho, aplicados aos sistemas agroecológicos, extrativismo sustentável e de produção orgânica;

XI - o incentivo à diversificação e à geração de renda no meio rural, por meio do apoio à agroindustrialização e ao turismo rural;

XII - a integração de ações de produção agroecológica e orgânica com ações de inclusão social, superação da pobreza e combate às desigualdades regionais;

XIII - o apoio à comercialização e ao acesso a mercados diversificados, priorizando-se a organização de cadeias curtas, dos empreendimentos cooperativos, de economia solidária e das feiras de venda direta ao consumidor;

XIV - o incentivo à permanência da população no meio rural e à sucessão nas propriedades rurais, por meio de políticas públicas integradas, associando a produção agroecológica e orgânica com a diversidade cultural e qualidade de vida no meio rural;

XV - a implementação de políticas de estímulo econômico que favoreçam a produção das bases estabelecidas, assim como o acesso da população a esses produtos;

XVI - o apoio ao desenvolvimento da agricultura dessas bases nas áreas urbanas e periurbanas;

XVII - o apoio à geração e à utilização de energias renováveis que contribuam para a eficiência energética no meio rural e para a minimização de impactos ambientais.

Art. 5º São instrumentos da Política Estadual de Agroecologia, Produção Orgânica e de Extrativismo Sustentável Orgânico:

I - a assistência técnica e extensão rural orientada à agroecologia, produção orgânica e ao extrativismo sustentável orgânico;

II - a pesquisa científica, a sistematização de conhecimentos tradicionais e sua divulgação para a sociedade;

III - a comercialização e o acesso a mercados;

IV - a agroindustrialização;

V - a certificação;

VI - a fiscalização, a análise de contaminantes do ar, do solo e da água;

VII - o armazenamento e o abastecimento;

VIII - os convênios, as parcerias e os termos de cooperação com entidades públicas e privadas;

IX - os fundos estaduais, o crédito rural, as linhas de financiamento e os subsídios;

X - as compras institucionais e os programas públicos;

XI - o seguro agrícola e a subvenção do seguro;

XII - o cooperativismo, o associativismo e a economia solidária;

XIII - a educação e a capacitação técnica;

XIV - a diferenciação tributária e fiscal;

XV - o Plano Estadual de Agroecologia, Produção Orgânica e de Extrativismo Sustentável Orgânico (PLEAPO).

Art. 6º Para atingir a finalidade e as diretrizes desta Lei, o Estado poderá:

I - criar linhas de crédito, inclusive com subsídios, para transição e produção agroecológica, produção orgânica e extrativismo sustentável orgânico;

II - estabelecer convênios, parcerias com entidades de extensão rural, instituições de pesquisa e ensino, universidades públicas e privadas, cooperativas e associações, e organizações da sociedade civil organizada em organizações não governamentais (ONGs);

III - conceder tratamento tributário diferenciado e favorecido para produtos, insumos, tecnologias e máquinas para a agroecologia, produção orgânica e o extrativismo sustentável orgânico;

IV - financiar, por meio de editais públicos, projetos de agroecologia, produção orgânica e extrativismo sustentável, de ONGs, cooperativas e associações, e de empreendimentos de economia solidária;

V - estabelecer para os produtos oriundos dos sistemas agroecológicos, orgânicos e do extrativismo sustentável, critério de preferência nas aquisições institucionais e nos programas públicos do Estado;

VI - conceder incentivos e apoios aos municípios e/ou às regiões que criarem Planos Municipais de Agroecologia e de Produção Orgânica e Planos Regionais de Agroecologia e de Produção Orgânica;

VII - estabelecer incentivos às empresas e às instituições de pesquisa que promoverem os produtos agroecológicos e orgânicos, e desenvolverem insumos e tecnologias aplicadas a sistemas de produção agroecológica e de produção orgânica;

VIII - estabelecer mecanismos de pagamento por serviços ambientais às agricultoras e aos agricultores da zona rural, urbana e periurbana, com sistemas agroecológicos, de produção orgânica ou em transição agroecológica;

IX - criar organismo estadual de avaliação de conformidade e certificação orgânica;

X - criar mecanismo estadual de avaliação de conformidade de produção agroecológica e extrativismo sustentável (selo).

Art. 7º O Plano Estadual de Agroecologia, Produção Orgânica e de Extrativismo Sustentável Orgânico, instrumento da PEAPO, com a finalidade de planejamento e com vistas a atingir os objetivos desta Lei, considerará:

I - ações direcionadas para produtores agroecológicos e orgânicos consolidados;

II - ações direcionadas para os produtores em transição agroecológica e sistemas orgânicos;

III - ações para as organizações sociais, cooperação, associação, economia solidária e sociedade civil;

IV - ações para incentivos ao consumo, acesso a mercados e comercialização;

V - ações de pesquisa, educação (em todos os níveis), capacitação, assistência técnica e extensão rural;

VI - ações de fomento ao incremento da produção, processamento, insumos, tecnologias, crédito e incentivos econômicos;

VII - instâncias de gestão, parcerias, participação, controle e protagonismo social;

VIII - diagnóstico da realidade e metas de conversão produtiva.

Art. 8º O Plano Estadual de Agroecologia, Produção Orgânica e de Extrativismo Sustentável deverá constar no Plano Plurianual (PPA) do Estado de Mato Grosso do Sul.

Art. 9º Poderão constituir fontes de financiamento da PLEAPO:

I - recursos do Tesouro do Estado e dos fundos estaduais;

II - recursos oriundos de convênios com a União e com outros entes da Federação;

III - recursos e fundos internacionais;

IV - recursos de empresas e de instituições financeiras, de organismos multilaterais e de organizações não governamentais;

V - recursos oriundos de operações de crédito.

Art. 10. Revoga-se a Lei nº 4.106, de 27 de outubro de 2011.

Art. 11. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Campo Grande, 6 de dezembro de 2018.

REINALDO AZAMBUJA SILVA

Governador do Estado