ITCMD – Transmissão causa mortis – Crédito decorrente de reclamação trabalhista proposta pelo cônjuge sobrevivente com trânsito em julgado antes do falecimento do outro cônjuge – Regime de comunhão universal de bens. I – O ITCMD incide sobre a transmissão de qualquer bem ou direito havido por sucessão legitima ou testamentária, inclusive a sucessão provisória. II – Nos regimes de comunhão parcial ou universal de bens comunicam-se as verbas trabalhistas a que se tem direito na constância da sociedade conjugal. III – É devido o ITCMD referente à transmissão causa mortis de quantia decorrente de reclamação trabalhista do meeiro sobrevivente, cujo trânsito em julgado ocorreu antes do falecimento de seu cônjuge, não sendo aplicável a isenção prevista no artigo 6º, inciso I, alínea "e" da Lei nº 10.705/2000.
Ementa
ITCMD – Transmissão causa mortis – Crédito decorrente de reclamação trabalhista proposta pelo cônjuge sobrevivente com trânsito em julgado antes do falecimento do outro cônjuge – Regime de comunhão universal de bens.
I – O ITCMD incide sobre a transmissão de qualquer bem ou direito havido por sucessão legitima ou testamentária, inclusive a sucessão provisória.
II – Nos regimes de comunhão parcial ou universal de bens comunicam-se as verbas trabalhistas a que se tem direito na constância da sociedade conjugal.
III – É devido o ITCMD referente à transmissão causa mortis de quantia decorrente de reclamação trabalhista do meeiro sobrevivente, cujo trânsito em julgado ocorreu antes do falecimento de seu cônjuge, não sendo aplicável a isenção prevista no artigo 6º, inciso I, alínea "e" da Lei nº 10.705/2000.
Relato
1. A Consulente, responsável por determinado Tabelionato de Notas e Protesto de Letras e Títulos de Comarca Paulista, informa que será lavrada a escritura pública de inventário e partilha de bens de senhora falecida em 03/03/2018, no estado civil de casada, sob o regime da comunhão universal de bens, e tendo deixado dois filhos maiores.
2. Acrescenta que no patrimônio a ser inventariado está incluído o direito de crédito oriundo de reclamação trabalhista na qual figurou como reclamante o seu esposo, ação essa que transitou em julgado ainda quando a autora da herança era viva, tendo sido a guia de retirada do valor apurado em referida ação emitida após o falecimento da autora da herança.
3. Diante do exposto, remanesce a dúvida no que concerne ao reconhecimento da isenção do recolhimento do ITCMD sobre a metade ideal (50%) do valor de referida ação a ser inventariada, tendo por base o artigo 6º, inciso I, alínea “e” da Lei nº 10.705/2000. Acrescenta que, embora a ação tenha sido proposta pelo viúvo, houve a comunicação do valor com a autora da herança em virtude do regime de bens.
4. Diante do exposto, questiona se o ITCMD é devido.
Interpretação
5. Inicialmente, cabe mencionar que a Lei nº 10.705/2000, que instituiu o Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação de Quaisquer Bens ou Direitos (ITCMD), neste Estado, estabelece, em seu artigo 2º, que o imposto incide sobre a transmissão de qualquer bem ou direito havido por sucessão legitima ou testamentária, inclusive a sucessão provisória.
6. De acordo com o artigo 1.667 do Código Civil, o regime de comunhão universal importa a comunicação de todos os bens presentes e futuros dos cônjuges e suas dívidas passivas, com as exceções previstas no artigo 1.668, o qual transcrevemos abaixo, juntamente com o artigo 1.659 do mesmo Código:
“Art. 1.668. São excluídos da comunhão:
I - os bens doados ou herdados com a cláusula de incomunicabilidade e os sub-rogados em seu lugar;
II - os bens gravados de fideicomisso e o direito do herdeiro fideicomissário, antes de realizada a condição suspensiva;
III - as dívidas anteriores ao casamento, salvo se provierem de despesas com seus aprestos, ou reverterem em proveito comum;
IV - as doações antenupciais feitas por um dos cônjuges ao outro com a cláusula de incomunicabilidade;
V - Os bens referidos nos incisos V a VII do art. 1.659.”.
"Art. 1.659. Excluem-se da comunhão:
(...)
V - os bens de uso pessoal, os livros e instrumentos de profissão;
VI - os proventos do trabalho pessoal de cada cônjuge;
VII - as pensões, meios-soldos, montepios e outras rendas semelhantes.".
7. Da leitura célere dos dispositivos acima, poderia se interpretar, equivocadamente, que a de cujus não teria direito a receber os direitos sobrevindos da ação trabalhista proposta pelo cônjuge sobrevivente, esposo, visto não existir a comunhão de proventos do trabalho pessoal de cada cônjuge (artigo 1659, inciso VI do Código Civil), situação que excluiria o valor recebido da sucessão, visto que apenas o cônjuge sobrevivente seria o beneficiário de tal verba.
8. Todavia, entendemos não ser essa a melhor interpretação ao caso apresentado, pelos motivos abaixo explanados.
9. Sobre o tema, o ilustre doutrinador Flávio Tartuce expõe que:
“Em previsão controversa e que gera muitos debates técnicos e práticos, o inciso VI do comando estatui que não se comunicam os proventos do trabalho pessoal de cada cônjuge, o que inclui o salário, as remunerações em sentido amplo, a aposentadoria, entre outros. Sobre tal polêmico preceito, como aponta a doutrina majoritária, é necessária uma interpretação restritiva, pois caso contrário haveria um esvaziamento quase que total do regime de bens da comunhão parcial. Chegar-se-ia ao absurdo de se entender que se os rendimentos do trabalho não se comunicam, os bens sub-rogados desses rendimentos também não e, sendo assim, praticamente nada ou quase nada se comunicaria nesse regime.” (TARTUCE; Flávio. Código Civil Comentado, 2019, p.1925).
10. Corroborando com posicionamento acima, cabe apontar que a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça já está sedimentada no sentido de que nos regimes de comunhão parcial ou universal de bens comunicam-se as verbas trabalhistas a que se tem direito na constância da sociedade conjugal, devendo essas ser partilhadas mesmo quando da separação conjugal (RECURSO ESPECIAL Nº 1.439.857 - RS (2014/0045973-7).
11. Há de se observar, também, que a dúvida apresentada surgiu pelo fato de não ter ocorrido o efetivo pagamento das verbas devidas antes do falecimento da parte, pois caso essa situação tivesse se concretizado, e os respectivos valores estivessem depositados em alguma conta corrente, poupança ou aplicação ou se os cônjuges, por exemplo, tivessem adquirido algum bem imóvel com esse valor, tal questionamento não subsistiria.
12. Sendo assim, considerando que o regime de casamento adotado pelas partes é o regime de comunhão universal, e que houve a comunicação do valor com a autora da herança em decorrência do trânsito em julgado da reclamação trabalhista que estabeleceu o direito ao crédito, a esposa, na época ainda com vida, fazia jus a receber sua parte no valor percebido por seu cônjuge em processo trabalhista.
13. Por sua vez, o artigo 6º, inciso I, alínea "e", da pela Lei nº 10.705/2000, estabelece como isenta do imposto, entre outras hipóteses, a transmissão causa mortis de quantia devida pelo empregador ao empregado, não recebida em vida pelo respectivo titular.
14. Na situação sob análise, conforme informações trazidas pela Consulente, a quantia recebida caracteriza-se como valor devido ao esposo da de cujus, por seu empregador, e não propriamente à de cujus, situação que descaracteriza a isenção prevista no dispositivo acima mencionado.
15. Portanto, em resposta ao questionamento formulado, informamos que é devido o ITCMD na situação em tela, não sendo aplicável, à luz das informações trazidas na consulta, a isenção estabelecida pela alínea “e” do inciso I do artigo 6º da Lei nº 10.750/2000.
A Resposta à Consulta Tributária aproveita ao consulente nos termos da legislação vigente. Deve-se atentar para eventuais alterações da legislação tributária.