ICMS - PROCEDIMENTOS FISCAIS - Para apuração das operações ou das prestações realizadas pelo sujeito passivo, o Fisco poderá utilizar quaisquer procedimentos tecnicamente idôneos, previstos no art. 194 do RICMS/2002.
EXPOSIÇÃO:
A Consulente, empresária individual de responsabilidade limitada optante pelo Simples Nacional, tem como atividade principal informada no cadastro estadual a fabricação de cervejas e chopes (CNAE 1113-5/02).
Informa que é fabricante de cerveja artesanal de padrão extremamente diferenciado, até mesmo dentro do segmento de cervejas artesanais, que contém extratos primitivos elevados que requerem maior necessidade de maltes para se chegar ao resultado.
Esclarece que suas receitas são baseadas em perfil que constitui um alto corpo, com açucares não fermentáveis residuais, o que também requer maior necessidade de maltes para se chegar ao resultado.
Afirma que a consequência deste processo inovador é a menor eficiência no processo produtivo, sendo que as cervejas são, em sua grande maioria, cervejas turvas, que exigem uma filtragem rápida e em menos estágios, comprometendo a eficiência produtiva em prol da qualidade ímpar.
Alega que as cervejas que produz têm quantidades extremamente elevadas de lúpulos, que retêm grande parte do líquido, comprometendo ainda mais sua eficiência, deixando qualquer índice usual de outras empresas destoante dos índices do seu processo produtivo.
Assevera que essas e várias outras características singulares do seu processo fabril, conforme se verifica em laudo técnico, demonstram que seu processo produtivo é único, tendo sido desenvolvido entre 2015 e 2018 de uma forma precária e que, desde 2019, com a aquisição do novo sistema de produção, totalmente personalizado para os objetivos de atingimento de padrão e qualidade diferenciados, vem evoluindo para o atingimento, em 2020, de uma eficiência cada vez maior, tanto no aproveitamento do material, quanto no atingimento da qualidade e diferenciação almejados.
Aduz que a consequência desta evolução técnica, amplamente comprovada por laudo, seja em razão do aprendizado na forma de produzir, seja em razão da compra de novos equipamentos e do reaprendizado na forma de produzir com os novos equipamentos, foi o crescimento dos índices de eficiência e de um refinamento técnico do produto, ímpares em relação ao mercado de cervejas artesanais.
Salienta que em procedimento fiscal auxiliar, de natureza exploratória, destinada a aumentar o grau de conhecimento sobre as atividades econômicas e que não caracteriza início de ação fiscal, nos termos do art. 66 do RPTA, a fiscalização vem lhe solicitando que refaça a escrituração e apuração do imposto, utilizando como critério registros do Ministério da Agricultura, que não consideram os índices de eficiência atuais, sendo que a consequência do não atendimento seria o arbitramento das operações, por conclusão fiscal, baseada nos índices de 2020, nos termos do inciso V do art. 194 do RICMS/2002.
Entende que o referido inciso V do art. 194 não descreve os meios a serem utilizados, quais os parâmetros técnicos utilizados e quais conclusões poderiam ser obtidas.
Com dúvida sobre a aplicação da legislação tributária, formula a presente CONSULTA.
CONSULTA:
1 - A conclusão fiscal prevista no inciso V do art. 194 do RICMS/2002 pode utilizar como premissa a produtividade industrial de exercícios diferentes, com a adoção de equipamentos produtivos diferentes, para arbitrar a produtividade de um determinado exercício?
2 - Para o fisco descaracterizar a produtividade industrial de um determinado produto em um determinado espaço de tempo, apenas o comparativo, sem quaisquer outros indícios, com outros intervalos de tempo ou outros processos produtivos ou outros contribuintes, de natureza não idêntica, é suficiente? No caso de resposta negativa, quais outros parâmetros seriam complementares e idôneos e deveriam ser provados pelo fisco?
3 - Existe alguma normativa interna da SEF/MG que regule os procedimentos necessários para a realização da conclusão fiscal ou esses procedimentos são de livre escolha do Auditor Fiscal?
RESPOSTA:
1 a 3 - Inicialmente, saliente-se que a CONSULTA de Contribuinte se presta, tão somente, a esclarecer dúvidas sobre interpretação da legislação tributária, não lhe cabendo indicar ou analisar documentos e/ou procedimentos fiscais referentes à caracterização ou à comprovação de infrações tributárias relacionadas com situações em concreto.
O art. 142 do Código Tributário Nacional (CTN - Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966) estabelece que compete à autoridade administrativa verificar a ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente, determinar a matéria tributável, calcular o montante do tributo devido, identificar o sujeito passivo e, sendo o caso, propor a aplicação da penalidade cabível.
Para tanto e visando proporcionar à autoridade fiscal os meios necessários ao cumprimento de seu ofício, o art. 190 do RICMS/2002 determina que as pessoas sujeitas à fiscalização do ICMS deverão exibir às autoridades fiscais, sempre que exigido, as mercadorias, os livros fiscais e comerciais e todos os documentos, programas e meios eletrônicos, em uso ou já arquivados, que forem necessários à fiscalização e lhes franquearão seus estabelecimentos, depósitos, dependências, arquivos, veículos e móveis, a qualquer hora do dia ou da noite, se à noite estiverem funcionando.
Nesse sentido, o art. 193 do referido Regulamento dispõe que os livros, meios eletrônicos e os documentos que envolvam, direta ou indiretamente, matéria de interesse tributário são de exibição e entrega obrigatórias ao Fisco Estadual, não tendo aplicação qualquer disposição legal excludente da obrigação de entregá-los ou exibi-los, ou limitativa do direito de examiná-los.
Por sua vez, o art. 194, também do RICMS/2002, fixa que para apuração das operações ou das prestações realizadas pelo sujeito passivo, o Fisco poderá utilizar quaisquer procedimentos tecnicamente idôneos, tais como: análise da escrita comercial e fiscal e de documentos fiscais e subsidiários; levantamento quantitativo de mercadorias; levantamento quantitativo-financeiro; levantamento quantitativo de mercadorias e valores (quantivalor); conclusão fiscal; aplicação de índices técnicos de produtividade no processo de industrialização ou relacionados com a prestação de serviço; exame dos elementos de declaração ou de contrato firmado pelo sujeito passivo, nos quais conste a existência de mercadoria ou serviço suscetíveis de se constituírem em objeto de operação ou prestação tributáveis; auditoria fiscal de processo produtivo industrial; ou análise da pertinência do itinerário, distância e tempo extraídos da leitura de registrador instantâneo e inalterável de velocidade e tempo (tacógrafo), com a operação ou prestação de serviço constante do respectivo documento fiscal.
Cumpre ressaltar que, nos termos do § 4º do precitado art. 194, constatada, por indícios na escrituração do contribuinte ou por qualquer outro elemento de prova, a saída de mercadoria ou a prestação de serviço sem emissão de documento fiscal, o valor da operação ou da prestação será arbitrado pela autoridade fiscal para fins de exigência do imposto e multas, se devidos, tomando como critério, conforme o caso, o preço unitário das saídas, das entradas ou das prestações mais recentes verificadas no período, sem prejuízo do disposto nos artigos 53 e 54 do RICMS/2002, cujos incisos I e VI, ambos do aludido art. 53, preceituam, respectivamente, que valor da operação ou da prestação será arbitrado pelo Fisco quando não forem exibidos à fiscalização os elementos necessários à comprovação do valor da operação ou da prestação, inclusive nos casos de perda ou extravio de livros ou documentos fiscais ou em qualquer outra hipótese em que sejam omissos ou não mereçam fé as declarações, os esclarecimentos prestados ou os documentos expedidos pelo sujeito passivo ou por terceiro legalmente obrigado.
Assim sendo, observa-se que, caso o Fisco não receba a documentação solicitada à Consulente, ele poderá, com supedâneo nos supramencionados arts. 142 do CTN e 194 do RICMS/2002, utilizar a técnica da conclusão fiscal para apuração dos índices de produtividade da Consulente e, bem assim, o valor das saídas de suas mercadorias, baseando-se em informações anteriormente prestadas pela própria Consulente e/ou em índices técnicos fornecidos por outros órgãos oficiais da Administração Pública, tais como, por exemplo, aqueles divulgados pelo Ministério da Agricultura.
Por oportuno, esclareça-se que a técnica da conclusão fiscal consiste, basicamente, na análise dos dados relativos a entradas de matéria-prima e outros insumos de produção; estoque inicial e final declarado pelo contribuinte; despesas, estritamente necessárias à manutenção do empreendimento; depreciação dos itens do ativo permanente; valor das saídas informadas no Livro de Registro de Apuração do ICMS; dentre outras informações acessíveis ao Fisco. A partir desse conjunto de informações, o Fisco poderá verificar a correção do montante de ICMS recolhido pelo contribuinte em determinado período de apuração.
Maria Rita Ferragut, em sua obra “Presunções no Direito Tributário”, assim se manifesta sobre a questão da utilização do arbitramento pelo Fisco:
O arbitramento do valor ou preço de bens, direitos, serviços e atos jurídicos poderá validamente ocorrer sempre que o sujeito passivo ou terceiro legalmente obrigado:
- não prestar declarações ou esclarecimentos;
- não expedir os documentos a que esteja obrigado; e
- prestar declarações ou esclarecimento que não mereçam fé ou expedir documentos que também não a mereçam.
Dessa forma, tem-se como perfeitamente possível o procedimento previsto na legislação tributária (art. 194 do RICMS/2002) quando o contribuinte não apresentar as informações e/ou provas solicitadas pelo Fisco.
Na situação exposta pela Consulente, resta claro que o Fisco almeja conhecer, com a maior exatidão possível, o complexo e inovador processo industrial da Consulente e, por esse motivo, expediu as intimações para que a Consulente lhe fornecesse a documentação necessária à apuração da verdade material dos fatos ocorridos.
Contudo, caso a Consulente não atenda a essas intimações, caberá ao Fisco, por dever de ofício, aplicar as técnicas fiscais previstas na legislação tributária mineira, em especial aquelas previstas no precitado art. 194 do RICMS/2002, as quais, como visto acima, não configuram ofensa ao princípio da verdade material.
Por fim, se da solução dada à presente CONSULTA resultar imposto a pagar, este poderá ser recolhido sem a incidência de penalidades, observando-se o prazo de 15 (quinze) dias contados da data em que a Consulente tiver ciência da resposta, desde que o prazo normal para seu pagamento tenha vencido posteriormente ao protocolo desta CONSULTA, observado o disposto no art. 42 do RPTA.
DOT/DOLT/SUTRI/SEF, 4 de fevereiro de 2021.
Alberto Sobrinho Neto |
Marcela Amaral de Almeida |
Ricardo Wagner Lucas Cardoso
Coordenador
Divisão de Orientação Tributária
De acordo.
Ricardo Luiz Oliveira de Souza
Diretor de Orientação e Legislação Tributária
De acordo.
Marcelo Hipólito Rodrigues
Superintendente de Tributação