Resposta à Consulta Nº 29767 DE 10/07/2024


 


ICMS – Indústria gráfica – Atividade de estampagem gráfica (serigrafia ou “silk screen”) em item de vestuário remetido por encomendante – Decisão Normativa CAT-04/2015. I. A despeito dos outros requisitos, para se configurar impresso personalizado, é condição essencial que o impresso não seja objeto de operação de circulação de mercadoria posterior. O impresso deve ser de uso exclusivo do encomendante. II. Se a atividade de estampagem (serigrafia) é efetuada sobre mercadoria destinada a posterior comercialização, tratar-se-á de industrialização resultando em operação de circulação de mercadoria que não se caracteriza como impresso personalizado e está sujeita à incidência do ICMS. Já se a atividade gráfica é efetuada sobre bem pertencente à usuário final, tratar-se-á de prestação de serviço, potencialmente sujeita ao ISS.


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ICMS – Indústria gráfica – Atividade de estampagem gráfica (serigrafia ou “silk screen”) em item de vestuário remetido por encomendante – Decisão Normativa CAT-04/2015.

I. A despeito dos outros requisitos, para se configurar impresso personalizado, é condição essencial que o impresso não seja objeto de operação de circulação de mercadoria posterior. O impresso deve ser de uso exclusivo do encomendante.

II. Se a atividade de estampagem (serigrafia) é efetuada sobre mercadoria destinada a posterior comercialização, tratar-se-á de industrialização resultando em operação de circulação de mercadoria que não se caracteriza como impresso personalizado e está sujeita à incidência do ICMS. Já se a atividade gráfica é efetuada sobre bem pertencente à usuário final, tratar-se-á de prestação de serviço, potencialmente sujeita ao ISS.

Relato

1. A Consulente, contribuinte enquadrada no Regime Periódico de Apuração (RPA), que declara no Cadastro de Contribuintes do ICMS do Estado de São Paulo (CADESP) exercer, como atividade principal, a “impressão de material para outros usos” (CNAE 18.13-0/99) e, dentre as atividades secundárias, o “comércio varejista de artigos do vestuário e acessórios” (CNAE 47.81-4/00), informa que recebe de consumidor final item de vestuário (camisetas classificadas no código 6109.90.00 da Nomenclatura Comum do Mercosul - NCM) para realizar a impressão de estampagem gráfica com tinta (serigrafia ou “silk screen”).

2. Ante o exposto, considerando que, após a realização do processo de estampagem, as camisetas são retornadas ao encomendante, questiona se tal atividade é considerada como uma industrialização por encomenda, sob a incidência do ICMS, ou uma prestação de serviço, ao abrigo do ISS.

Interpretação

3. Do relato, é possível depreender que a Consulente recebe peças de vestuário (camisetas – NCM 6109.90.00) remetidas por encomendante consumidor final, para realização de processo de estampagem sob a técnica de serigrafia com tinta, retornando o produto ao encomendante após a realização da impressão gráfica personalizada. Nesse compasso, antes de se adentrar na situação de fato, são necessárias algumas considerações teóricas sobre o tema considerando a atuação da Consulente enquanto indústria gráfica.

4. Destaca-se que a questão jurídica dos impressos personalizados gira em torno da correta delimitação do campo de incidência do ICMS, imposto de competência estadual, e do Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS), de competência municipal. Trata-se, portanto, de eventual conflito de competência tributária.

5. Nos casos relacionados a supostos conflitos de competência tributária, esse órgão consultivo tem expedido o entendimento de que a Constituição Federal de 1988, em linhas gerais, repartiu entre os entes federativos a competência da tributação sobre o consumo em função da etapa do ciclo econômico em que a atividade se encontra: industrial (União); comercial (Estados e Distrito Federal); e prestação de serviços (Municípios e Distrito Federal).

6. A Constituição Federal de 1988 dispõe, em seu artigo 155, inciso II, que aos Estados compete a tributação sobre as operações relativas à circulação de mercadoria e sobre a prestação dos serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação e, em seu artigo 156, inciso III, que aos Municípios compete a tributação sobre os serviços de qualquer natureza, não compreendidos no artigo 155, inciso II, e definidos em lei complementar.

7. Diante disso, dois requisitos mínimos são exigidos para que se considere determinada prestação de serviço abrangida pela competência municipal: (i) o serviço não pode estar compreendido no campo de incidência do imposto estadual; e (ii) o serviço deve estar previsto em lei complementar.

8. Observa-se que a Lei Complementar nº 116/2003 estabelece que o ISS tem como fato gerador a prestação de serviços constantes de sua lista anexa. No entanto, há de se ressaltar que a Lista anexa à Lei Complementar e sua aplicação sobre o fato em concreto deve ser interpretada à luz da Constituição Federal, uma vez que, por óbvio, a legislação infraconstitucional não pode contrariar as disposições constitucionais.

9. Sendo assim, uma atividade essencialmente comercial, ainda que fornecida em conjunto com a prestação de serviço constante da lista anexa à Lei Complementar nº 116/2003, não ser pode considerada como uma prestação de serviço tributável por ISS. Isso porque considerar uma atividade econômica essencialmente comercial como inserida no campo de competência municipal representaria um desvirtuamento do próprio texto constitucional, que expressamente insere a circulação de mercadoria no campo de competência estadual (ICMS).

10. Nesse prisma, para solucionar conflitos de competência tributária envolvendo a incidência de ICMS ou ISS quando o fornecimento de mercadoria a consumidor final ocorre em conjunto com prestação de serviço constante da lista anexa à Lei Complementar nº 116/2003, conforme amparado por jurisprudência dos tribunais superiores, um dos critérios utilizados envolve a análise da preponderância entre o dar e o fazer. Assim, nos casos em que há a preponderância da obrigação de dar, a atividade imaterial prestada seria meramente acessória à obrigação de dar. Já para os casos em que há a preponderância do fazer, as mercadorias fornecidas são, na verdade, meros insumos utilizados para a consecução da atividade-fim do serviço.

10.1. Nesse ponto, recorda-se que, ainda que as partes tenham liberdade e autonomia para pactuar suas disposições contratuais, ao direito tributário não importa o nomen iuris contratual, mas sim o substrato econômico, isso é, o fato econômico subjacente ao contrato. Ou seja, os tributos não incidem, ipsis litteris, sobre o contrato tal como acordado (mera qualificação jurídica dada pelas partes), mas, sim, sobre a materialidade do fato econômico subjacente ao contrato e efetivamente praticado.

11. Não obstante o exposto, há ainda de se ressaltar que a mera análise de preponderância entre a obrigação de dar e fazer pode não se mostrar suficiente para dirimir os conflitos de competência tributária envolvendo o ICMS e o ISS.

12. Isso porque, conforme repartição de competência tributária sobre o consumo (item 5 acima), o ICMS incide sobre as “operações relativas à circulação de mercadorias”, que fundamentalmente são aquelas operações que impulsionam a mercadoria da fonte produtora ao consumidor final. Ocorre que uma atividade essencialmente imaterial (obrigação de fazer) aplicada sobre uma mercadoria ou bem pode estar inserida no ciclo de produção e comercialização, atraindo a incidência de ICMS.

13. Assim, para além do critério de preponderância das obrigações de dar e fazer, a destinação da mercadoria ou bem sobre a qual eventual atividade imaterial é executada é elemento determinante para identificar a etapa do ciclo econômico em que essa atividade se localiza e, desse modo, é também um dos elementos fundamentais para se estabelecer a incidência do imposto competente. Nesse sentido, se a atividade imaterial é efetuada sobre mercadoria destinada a posterior comercialização, tratar-se-á de operação de circulação de mercadoria, sujeita ao ICMS (ainda que a atividade conste da Lista de Serviços anexa à Lei Complementar nº 116/2003); já se a atividade imaterial é efetuada sobre bem pertencente à usuário final, tratar-se-á de prestação de serviço, potencialmente sujeita ao ISS.

14. Com efeito, este entendimento não é novo e encontra guarida em decisões do Supremo Tribunal Federal, a exemplo das ADI nº 4.389/DF-MC, AI nº 803.296/SP-AgR e RE nº 606.960/ES-AgR.

14.1 A rigor, como exposto nestas decisões, para se definir a competência tributária, o primeiro critério a se utilizar é o da destinação do bem ou mercadoria sobre o qual a atividade é exercida. Havendo comercialização subsequente, tratar-se-á de processo industrial, portanto, operação de circulação de mercadoria, sujeita ao ICMS. Apenas em caso negativo, é que o conflito de competência será resolvido mediante a análise da preponderância entre as obrigações de dar e fazer.

15. Mediante essa linha teórica exposta acima que a Decisão Normativa CAT-04/2015 foi elaborada e deve ser interpretada. Nesse sentido, a Decisão Normativa CAT-04/2015 sumarizou o entendimento acima exposto para os casos de impressos personalizados (publicitários ou não) promovidos pela indústria gráfica.

16. Nesse sentido, para melhor visualização, faz-se necessário a exposição de alguns excertos da referida Decisão:

“1. O ICMS não incide sobre as operações de saída de impressos personalizados promovida por indústria gráfica, desde que: (i) a personalização do impresso fique caracterizada; (ii) pelo valor e pela natureza do material utilizado, não prepondere a circulação de mercadorias; e (iii) o impresso seja destinado ao uso exclusivo do encomendante.

2. Sendo assim, para se enquadrarem nessa categoria, os impressos não podem ser objeto de nova operação de circulação de mercadoria. Logo, para fins da não incidência, o impresso não pode ser destinado a consumo em industrialização (tais como rótulos, etiqueta e materiais de embalagem), nem destinado a ser objeto de comercialização posterior, e, nem mesmo, ser destinado a acompanhar outras mercadorias (a exemplo de sacolas e manuais).

3. O material destinado a fins publicitários pode se incluir na categoria de impresso personalizado não sujeito à incidência do ICMS, desde que (i) a finalidade seja restrita à de mera divulgação de mensagem publicitária nele estampado (isso é, sem utilidade adicional significativa em benefício de outrem que não o encomendante) e, como destacado no item 1, (ii) pelo valor e pela natureza do material utilizado, não prepondere a circulação de mercadorias. A título exemplificativo, seria o caso de folhetos, catálogos, folders, cartazes e banners, confeccionados em papel, papelão ou papel plastificado.

(...)” [grifos nossos]

17. Portanto, a rigor, a primeira análise a ser feita é se o impresso gráfico (ainda que aposto em outra mercadoria ou bem como no caso das camisetas) será objeto de nova operação de circulação de mercadoria (saída isolada, integrada a outras mercadorias, ou utilizada como insumo em processo industrial) – item 2 da Decisão Normativa CAT-04/2015.

18. Como exposto na referida Decisão Normativa CAT-04/2015, deve-se analisar a personalização do impresso gráfico, bem como se pelo valor e natureza do material utilizado, isso é, se não se trata efetiva industrialização de mercadoria (atividade de circulação de mercadoria em razão de industrialização na modalidade de beneficiamento de mercadoria, com a impressão do material gráfico personalizado que agregue valor ao produto).

19. É nesse sentido que a Decisão Normativa CAT-04/2015 dispôs que o impresso deve ser destinado ao uso exclusivo do encomendante. E, é também nessa linha que, em se tratando de impresso gráfico, a referida Decisão Normativa CAT-04/2015 dispôs que a finalidade do bem repassado a terceiro deve estar restrita à divulgação da mensagem publicitária – ou seja, não deve haver utilidade adicional em benefício de outrem alheia à divulgação da mensagem publicitária do encomendante.

20. Portanto, dependerá da destinação que será dada ao impresso gráfico, ainda que aposto ou acompanhado a outra mercadoria ou bem - se a indústria gráfica produziu bem sob encomenda, que será objeto de mercancia posterior pelo encomendante, ainda que consumidor final do substrato (“camiseta”), subsiste relação comercial entre o encomendante e a indústria gráfica, mediante processo de industrialização de mercadoria. Nesse caso, os objetos são mercadorias e o processo de personalização (estampagem) deve ser considerado um processo industrial. Assim, a saída desses produtos para o encomendante adquirente será regularmente tributada por ICMS.

21. Dessa feita, a análise da incidência tributária sobre o produto da indústria gráfica sempre será casuística, levando-se em conta não só o produto em si, como também o contexto negocial envolto (isso é, em que etapa da cadeia de agregação de valor a atividade gráfica e seu produto encontram-se inseridos).

22. Observa-se, ainda, que o entendimento acima exposto e contido na Decisão Normativa CAT-04/2015 não se alterou em face da nova redação do item 13.05 da Lista de Serviço anexa à Lei Complementar nº 116/2003 (redação dada pela Lei Complementar nº 157, de 2016). Inclusive, a nova redação ratificou o entendimento acima exposto, incorporando a exceção de ser destinada “a posterior operação de comercialização ou industrialização” mesmo que “incorporados, de qualquer forma, a outra mercadoria que deva ser objeto de posterior circulação”.

23. Diante disso, note-se que as informações apostas no relato não permitem concluir qual destinação será dada pelo cliente encomendante ao produto contendo o impresso personalizado produzido e estampado pela Consulente. Além disso, não ficou claro, quanto à personalização da camiseta, qual atividade a Consulente efetivamente realiza além do processo de serigrafia já que não esclarece se também é responsável pela criação da estampa, diagramação, dentre outras atividades imateriais relacionadas ao processo de personalização.

24. Assim, caso a atividade de estampagem gráfica por serigrafia seja realizada sobre mercadoria – de propriedade da própria Consulente ou de terceiro – destinada a posterior circulação (comercialização, industrialização ou, ainda, distribuição gratuita), tal atividade será considerada parte do ciclo de industrialização da mercadoria e, portanto, estará sempre sujeita à incidência do ICMS.

25. Do oposto, restando evidente a personalização do impresso gráfico, bem como pela análise do valor e a natureza do material utilizado na produção gráfica seja possível concluir que não prepondera a circulação de mercadoria, sendo a personalização gráfica aposta em item de vestuário destinado para uso e benefício exclusivo do encomendante, tal atividade não estará sujeita ao imposto estadual, tratando-se, portanto, de prestação de serviço, potencialmente sujeita ao ISS.

A Resposta à Consulta Tributária aproveita ao consulente nos termos da legislação vigente. Deve-se atentar para eventuais alterações da legislação tributária.