Publicado no DOE - GO em 27 set 2023
Inclusão de produtos no regime de substituição tributária.
(...) formula consulta sobre o enquadramento de dois de seus produtos no regime de substituição tributária, o que entende indevido, questionando:
1. Os produtos “Lacto Pró M” e “Lacto Pró V”, de fabricação da Consulente, pelo simples fato de terem o NCM 0404.90.00 devem ser incluídos na regra do ICMSST, indicados no CEST 23.002.00?
2. O Enquadramento à regra do ICMS-ST impõe o preenchimento concomitante do: (a) grupo; (b) do descritivo e; (c) do NCM; do produto sujeito ao ICMS-ST?
3. Para o caso dos produtos “Lacto Pró M” e “Lacto Pró B”, não é possível enquadrá-los no grupo de sorvete (Grupo 21 e Segmento 23 do Convênio 142/18), visto que são produtos lácteos, com registro no MAPA, se afastando dos sorvetes, que segue as regras da Anvisa?
4. Os produtos “Lacto Pró M” e “Lacto Pró B” são descritos como “bebida láctea UHT”, portanto diversos do chamado “preparado para fabricação de sorvete em máquina”. Dessa forma também não se incluem no ICMS-ST do CEST 23.002.00?
5. Os produtos “Lacto Pró M” e “Lacto Pró B” são utilizados para a produção de receitas culinárias diversas, assim, e por serem transformados, não se incluem na regra do ICMS-ST?
É o relatório.
A Nomenclatura Comum do Mercosul (NCM) é determinada pela aplicação de regras e procedimentos para definir um código numérico único para cada mercadoria. Uma vez definido o código, ele é utilizado por todos os países membros do Mercosul, tendo como base o Sistema Harmonizado (SH) de Designação e de Codificação de Mercadorias. Isso significa que em todos os países do Mercosul, as regras para classificar um produto em determinado código são idênticas.
O código NCM é composto de 8 dígitos: o primeiro e o segundo representam o capítulo, o terceiro e o quarto representam a posição, o quinto e o sexto a subposição, o sétimo representa o item e oitavo o subitem. A classificação de um produto em um ou outro código depende fundamentalmente da composição e da finalidade para a qual o produto foi desenvolvido.
Feito esse esclarecimento sobre o NCM, verifica-se que os produtos “Lacto Pró M” e “Lacto Pró V” são enquadrados no código 0404.90.00 (capítulo 04: Leite e laticínios; ovos de aves; mel natural; produtos comestíveis de origem animal, não especificados nem compreendidos noutros capítulos. Posição 04: Soro de leite, mesmo concentrado ou adicionado de açúcar ou de outros edulcorantes; produtos constituídos por componentes naturais do leite, mesmo adicionados de açúcar ou de outros edulcorantes, não especificados nem compreendidos noutras posições. Subposição 90, item 0, subitem 0: outros).
O enquadramento nesse código já foi questionado pela Secretaria da Receita Federal, porém, nos autos do processo nº 0033557-46.2010.4.01.3400, em ação que tramitou na Justiça Federal do DF, ratificou-se o enquadramento dos produtos no código 0404.90.00 e não no 2202.90.00, pretendido pela Receita Federal. Desse modo, é despicienda qualquer consideração acerca do enquadramento neste ou noutro código.
A classificação de um produto em determinado código incumbe ao contribuinte, a quem cabe declarar aos órgãos oficiais de fiscalização qual o NCM da mercadoria comercializada. O Fisco, diante de possível fraude ou erro na classificação, poderá, após oportunizar ao contribuinte o contraditório e ampla defesa, proceder à mudança na classificação, mas isso não é o que se verifica no caso em concreto analisado.
Até o advento do Protocolo ICMS 18/23, o produto classificado no NCM 0404.90.00 não era submetido ao regime de substituição tributária. Com a mudança, o Protocolo ICMS 20/05 passou a incluir no inciso II, do §1º, da Cláusula Primeira, a substituição tributária para os produtos enquadrados nas posições 0404 da NCM/SH e no CEST 23.002.00, dispondo da seguinte forma:
Cláusula primeira Nas operações interestaduais com sorvetes de qualquer espécie e com preparados para fabricação de sorvete em máquina, realizadas entre estabelecimentos localizados em seus territórios, fica atribuída ao estabelecimento industrial ou importador, na qualidade de sujeito passivo por substituição, nos termos e condições deste protocolo, a responsabilidade pela retenção e recolhimento do ICMS devido pelas subsequentes saídas, realizadas por estabelecimento atacadista ou varejista.
§ 1º O disposto nesta cláusula aplica-se:
(...)
II - aos preparados para fabricação de sorvete em máquina, classificados nas posições 1806, 1901, 2106 e 0404 da NCM/SH e enquadrados no CEST 23.002.00.
Não cabe ao Estado de Goiás, por meio de seus órgãos de fiscalização tributária, excepcionar determinado produto regularmente enquadrado no código 0404.90.00 do regime de substituição tributária por argumentos que se afastam da análise pertinente à legislação de regência.
Ademais, o argumento trazido pela consulente de que os produtos “Lacto Pro M” e “Lacto Pro V” são bebidas lácteas não afastam o enquadramento no CEST 23.002.00 e no código 0404.90.00 da NCM. As múltiplas finalidades para as quais os produtos podem ser utilizados abrangem inclusive a “fabricação de sorvete em máquina”. Acrescente-se que a publicidade estampada no sítio eletrônico da marca ilustra que a produção de sorvetes é uma das finalidades dos produtos. Descreve que o produto “lacto pro v”, por exemplo, é “extremamente versátil e pode ser usado em sorvetes expresso, milk-shakes, sundaes, drinques, flans e em outras sobremesas geladas”. Da mesma forma, divulga que o “lacto pro m” é “um novo conceito na produção da calda base (láctea), picolés e sorvetes de massa” (https://daus.global/produtos/lactopro-v/, acesso em 27/09/2023 às 09h43).
Além disso, a alegação de que produtos lácteos não podem ser incluídos na regra do ICMS-ST não procede, pois não há vedação legal ou mesmo lógica e razoável que obstem a sistemática.
Quanto ao fato de o produto comercializado pela consulente ser regulado pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento e não pela Anvisa, não se verifica relevância para o deslinde da questão. A RDC nº 713/2022 da ANVISA define no seu art. 2º o que se entende por “gelados comestíveis” e “preparados para gelados comestíveis”:
Art. 2º Para fins desta Resolução, aplicam-se as seguintes definições:
I - gelados comestíveis: produtos congelados obtidos a partir de uma emulsão de gorduras e proteínas, ou de uma mistura de água e açúcares; e
II - preparados para gelados comestíveis: produtos que, após serem submetidos ao congelamento, resultam em gelados comestíveis, sem necessidade de adição de outros ingredientes.
Para a ANVISA, os produtos da consulente não se enquadram na definição dos incisos I ou II do art. 2º da RCD nº 713/2022, pois haverá necessidade de adição de outros ingredientes. Ou seja, os produtos comercializados pelo consulente não são prontos para consumo. Por esse motivo, a ANVISA não é competente para fiscalizar a respectiva produção.
Também é equivocada a afirmação de que a inclusão do NCM 0404 no CEST 23.002.00 é inválida. A definição dada pela ANVISA para o que entende por "preparados para gelados comestíveis" se destina exclusivamente para fins de aplicação da RDC nº 713/2022. Essa definição não vincula o MAPA ou o Confaz que, no Anexo XXII do Convênio ICMS 142/2018, descreve o item 2.0 como "preparado para fabricação de sorvete em máquina".
Outro argumento apresentado pelo consulente é que o regime de substituição tributária é incompatível com os produtos que sofrem transformação ou alteração em sua embalagem original.
De fato, a regra geral estabelecida pela cláusula nona do Convênio ICMS nº 142/2018 é no sentido de não aplicar o regime de substituição tributária às operações interestaduais que destinem bens e mercadorias a estabelecimento industrial para emprego em processo de industrialização como matéria-prima, produto intermediário ou material de embalagem. No entanto, o caput do dispositivo ressalva a possibilidade de disposição em contrário.
Cláusula nona - Salvo disposição em contrário, o regime de substituição tributária não se aplica:
I - às operações interestaduais que destinem bens e mercadorias submetidas ao regime de substituição tributária a estabelecimento industrial fabricante do mesmo bem e mercadoria;
II - às transferências interestaduais promovidas entre estabelecimentos do remetente, exceto quando o destinatário for estabelecimento varejista;
III - às operações interestaduais que destinem bens e mercadorias a estabelecimento industrial para emprego em processo de industrialização como matéria-prima, produto intermediário ou material de embalagem, desde que este estabelecimento não comercialize o mesmo bem ou mercadoria;
IV - às operações interestaduais que destinem bens e mercadorias a estabelecimento localizado em unidade federada que lhe atribua a condição de substituto tributário em relação ao ICMS devido na operação interna;
V - às operações interestaduais com bens e mercadorias produzidas em escala industrial não relevante, nos termos deste convênio.
§ 1º Ficam as unidades federadas de destino autorizadas a não aplicar o regime de que trata o caput desta cláusula nas operações entre estabelecimentos de empresas interdependentes, exceto se o destinatário for varejista.
§ 2º Para os efeitos desta cláusula, não se considera industrialização a modificação efetuada no bem ou na mercadoria pelo estabelecimento comercial para atender à especificação individual do consumidor final.
§ 3º Na hipótese desta cláusula, exceto em relação ao inciso V desta cláusula, a sujeição passiva por substituição tributária caberá ao estabelecimento destinatário, salvo disposição em contrário na legislação da unidade federada de destino.
§ 4º O disposto no inciso IV desta cláusula somente se aplica a partir do primeiro dia do primeiro mês subsequente ao da disponibilização, pelas unidades federadas, em seus respectivos sítios na internet, do rol dos contribuintes e respectivos segmentos de bens, mercadorias ou itens, detentores de regimes especiais de tributação que lhes atribuam a responsabilidade, na condição de substituto tributário, pela retenção e recolhimento do ICMS devido pelas operações subsequentes.
§ 5º O rol dos contribuintes e respectivos segmentos de bens, mercadorias ou itens, de que trata o § 4º desta cláusula, deve ser encaminhado à Secretaria Executiva do CONFAZ, para disponibilização em seu sítio eletrônico na internet.
Logo, havendo clara disposição no sentido de incluir os produtos do NCM 0404 no regime de substituição tributária, o Convênio 142/2018 é respeitado e a substituição tributária é aplicável.
Diante do exposto, as dúvidas do consulente podem ser respondidas objetivamente da seguinte forma:
1. Os produtos “Lacto Pró M” e “Lacto Pró V”, de fabricação da Consulente, pelo simples fato de terem o NCM 0404.90.00 devem ser incluídos na regra do ICMS-ST, indicados no CEST 23.002.00?
Resposta: Sim. O enquadramento no NCM 0404.90.00, a finalidade compatível com a CEST 23.002.00, a descrição dos produtos e o Protocolo ICMS nº 18/23 determinam a inclusão dos produtos no regime de substituição tributária.
2. O Enquadramento à regra do ICMS-ST impõe o preenchimento concomitante do: (a) grupo; (b) do descritivo e; (c) do NCM; do produto sujeito ao ICMS-ST?
Resposta: A norma que inclui determinado produto no regime de substituição tributária deve ser analisada dentro do microssistema jurídico que a contém. Assim, o enquadramento no ICMS-ST deve considerar a descrição do produto, seu código NCM e a finalidade do produto.
3. Para o caso dos produtos “Lacto Pró M” e “Lacto Pró V”, não é possível enquadrá-los no grupo de sorvete (Grupo 21 e Segmento 23 do Convênio 142/18), visto que são produtos lácteos, com registro no MAPA, se afastando dos sorvetes, que segue as regras da Anvisa?
Como já demonstrado ao longo do parecer, as definições da ANVISA dispostas no RCD nº 713/2022 não se aplicam aos produtos da consulente, pois não se enquadram no que a agência reguladora conceitua de “gelados comestíveis” ou de “preparados para gelados comestíveis”, disciplinados por aquela resolução. Por outro lado, os produtos mencionados podem ser corretamente classificados no grupo 21 e segmento 23 (sorvetes e preparados para fabricação de sorvetes em máquinas) do Anexo I do Convênio ICMS 142/2018, visto que induvidosamente o “lacto pro M” e o “lacto pro V” podem ser utilizados para fabricação de sorvetes.
4. Os produtos “Lacto Pró M” e “Lacto Pró V” são descritos como “bebida láctea UHT”, portanto diversos do chamado “preparado para fabricação de sorvete em máquina”. Dessa forma também não se incluem no ICMS-ST do CEST 23.002.00?
O fato de o produto ser descrito como “bebida láctea UHT” não afasta a possibilidade de sua utilização na fabricação de sorvetes e enquadramento no CEST 23.002.00. Logo, é correto o enquadramento dos produtos na categoria de "preparados para fabricação de sorvete em máquinas".
5. Os produtos “Lacto Pró M” e “Lacto Pró V” são utilizados para a produção de receitas culinárias diversas, assim, e por serem transformados, não se incluem na regra do ICMS-ST?
A cláusula nona do Convênio ICMS 142/2018 ressalva a possibilidade de inclusão de produtos intermediários, matérias primas ou materiais de embalagem no regime de substituição tributária. Portanto, a inclusão dos produtos de NCM 0404.90.00 no ICMS-ST encontra suporte fático e jurídico na norma regente.
Em face do exposto, com fulcro na legislação tributária e nos apontamentos transcritos, a Gerência de Orientação Tributária firma o entendimento de que os produtos “Lacto Pró M” e “Lacto Pró V”, classificados no NCM 0404.90.00 e enquadrados no CEST 23.002.00 pelo Protocolo ICMS 18/23, são submetidos ao regime de substituição tributária, não havendo incompatibilidade com a sistemática de tributação o fato de serem considerados insumos para fabricação de sorvetes ou outros produtos finais. A Cláusula nona do Convênio ICMS 142/2018 ressalva a possibilidade de haver substituição tributária em insumos quando norma específica assim dispuser.
Em que pese a ANVISA, para finalidades fiscalizatórias próprias, não considerar os produtos “Lacto Pró M” e “Lacto Pró V” na definição de “gelados comestíveis” ou de “preparados para gelados comestíveis”, o Convênio ICMS 142/2018 os enquadra corretamente no grupo 21 do anexo I (preparados para fabricação de sorvetes em máquinas), não havendo que se falar em antinomia ou incongruência entre os dispositivos mencionados. Os produtos são considerados, para fins de substituição tributária, insumos para fabricação de sorvetes, classificados no NCM 0404 e no CEST 23.002.00, submetendo-se a registro e fiscalização no Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento - MAPA.
É o parecer, o qual submetemos a consideração superior.
GOIANIA, 27 de setembro de 2023.
HELVECIO VIEIRA DA CUNHA JUNIOR
Auditor Fiscal da Receita Estadual