Consulta Nº 6 DE 03/02/2022


 


DIFAL – Operações e Prestações que destinem bens e serviços a consumidor final não contribuinte do ICMS, localizado em outra unidade federada: DIFAL-ICMS devido pelo destinatário até início dos efeitos da Lei Complementar Federal n.º 190/22


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RELATÓRIO.

A empresa estabelecida no Estado de Santa Catarina, tendo por atividade a fabricação e venda de compensados e laminados, através da Petição Consulta Formal (27611155), relata que seus principais clientes são construtoras, não contribuintes do ICMS, e que diversas estão localizadas no Estado do Rio de Janeiro.

À título de exemplo das operações praticadas, no arquivo Documento Doc. 03 Nota Fiscal de remessa ao RJ (27611159), foram anexados documentos fiscais demonstrando a remessa de mercadorias para clientes não contribuintes situados no Estado do Rio de Janeiro. Acrescenta que essa situação não é isolada, de forma que ao longo dos anos ocorrerão operações semelhantes às destacadas.

Considerando que as operações praticadas com os referidos clientes envolvem remessas interestaduais de mercadorias, observa a consulente estar obrigada, segundo o artigo 155, incisos VII e VIII, alínea “b”, da CF/88, ao recolhimento do diferencial de alíquotas do ICMS (DIFAL ao Estado de destino), até 2021, pautado no Convênio CONFAZ n° 93/15, a consulente expõe o que segue.

- O Supremo Tribunal Federal (STF), por meio do julgamento do Tema n.° 1.093 (RE n° 1.287.019), entendeu pela inconstitucionalidade da cobrança do DIFAL com base estritamente no convênio mencionado, tendo em vista a inexistência de lei complementar federal instituindo referido imposto.

- Quando da declaração de inconstitucionalidade, o STF modulou os efeitos da decisão para 2.022, para oportunizar que o Congresso Nacional editasse a correspondente lei complementar, a qual pautaria a cobrança para aquele ano em diante. Estabeleceu o STF, contudo, que caso a lei complementar não fosse editada, a cobrança do DIFAL não poderia ser realizada.

- Em dezembro/2021, o Congresso Nacional aprovou o projeto de lei (PL n° 32/21), instituindo o referido imposto e apresentando as normas gerais para que os Estados procedam com a respectiva cobrança.

- Ocorre que o mencionado projeto de lei veio a ser sancionado pela Presidência da República apenas em 04/01/22, transformando-se na Lei Complementar n.º 190/22, publicada em 05/01/22.

A dúvida da consulente reside na data de início da vigência da cobrança do DIFAL, anteriormente exigido nos termos do artigo 3°, XVIII, da Lei Estadual n.° 2.657/96 e do Regulamento do ICMS do Rio de Janeiro, tendo em vista a publicação da Lei Complementar n.° 190/22, a qual ocorreu em 2022, e a necessidade do respeito à anterioridade nonagesimal e de exercício.

Entende a consulente que o DIFAL somente poderá ser cobrado pelo Estado do Rio de Janeiro a partir de 01/01/23, o que pretende demonstrar.

- Da análise da Lei Complementar n.º 190/22 (definida pelo STF como necessária à cobrança do tributo), aponta que o legislador condicionou a produção dos efeitos à observância da anterioridade prevista no artigo 150, inciso III, alínea “c”, da CF/88.

- Da leitura do dispositivo entende a consulente que os efeitos da LC n.° 190/22 necessariamente deverão observar tanto a anterioridade nonagesimal, como a anterioridade de exercício, em razão da menção expressa à alínea “b” na parte final do artigo.

- O legislador, em estrita observância das previsões constitucionais, trouxe disposição explícita quanto à produção dos efeitos da LC n.° 190/22, tendo em vista se tratar da instituição de um novo tributo.

- No julgamento do Tema 1.093, o STF não deixou qualquer margem para discussão, afirmando que cabe à Lei Complementar instituir o DIFAL.

- Por se tratar da instituição de tributo, no Senado Federal, ao elaborar parecer que baseou a aprovação do projeto de lei do DIFAL, concluiu que “o princípio da anterioridade plena já está expressamente observado pelo art. 3º do substitutivo”.

Dessa forma, entende a consulente que a cobrança do DIFAL pelo Estado do Rio de Janeiro está condicionada à produção de efeitos da lei complementar federal, conforme decidiu o STF.

Assim, em razão da necessidade de observância da anterioridade nonagesimal e de exercício pela LCF n° 190/22, conclui que o DIFAL do ICMS apenas poderá ser cobrado a partir de 01/01/23.

Contudo, se o Estado do Rio de Janeiro entender não ser aplicável o princípio da anterioridade anual à cobrança aqui consultada, entende a consulente que deve ser respeitada a anterioridade nonagesimal contada a partir da publicação da LC n.° 190/22. Isso porque, ao editar a mencionada LC, o Congresso Nacional inseriu dispositivo expresso no artigo 3°, determinando que os efeitos apenas serão produzidos quando decorridos 90 dias da publicação da lei, em atenção ao artigo 150, inciso III, “c”, da CF/88. Logo, o DIFAL apenas poderia ser cobrado a partir de 05/04/22.

Por fim, não desconhece a consulente que a LC n.° 190/22 também incluiu na LC n.º 87/96 o artigo 24-A, § 4º. Referida disposição condiciona a exigência do DIFAL às operações praticadas com não contribuintes ao 1° dia útil do terceiro mês subsequente à disponibilização do portal eletrônico contendo “as informações necessárias ao cumprimento das obrigações tributárias, principais e acessórias, nas operações e prestações interestaduais”, sendo o referido portal foi disponibilizado em 31/12/21.

Assim, caso não acolhidos nenhum dos marcos temporais anteriores, entende a consulente que não há como fugir da conclusão de que a exigência do DIFAL somente poderá vigorar a partir de 01/03/22.

Considerando que (i) o STF afirmou que caberia à Lei Complementar instituir o DIFAL como novo tributo, e; (ii) que a Lei Complementar n.° 190/22 foi publicada apenas em 2022, com menção expressa à necessidade de se respeitar a anterioridade nonagesimal e de exercício, entende a consulente que o DIFAL somente poderá ser cobrado pelo Estado do Rio de Janeiro a partir de 01/01/23.

A Consulta:

1) Indaga a consulente se está correto o seu entendimento.

2) Do contrário, se, por algum motivo, o Estado do Rio de Janeiro entender não ser aplicável o princípio da anterioridade anual à cobrança aqui consultada, questiona qual seria então o início da vigência da cobrança do diferencial de alíquotas:

- 90 dias após a publicação da LCF nº 190/22, considerando a anterioridade nonagesimal prevista na legislação, ou seja, em 05/04/22?, ou;

- primeiro dia útil do 3° mês subsequente à disponibilização do portal mencionado no caput do art. 24-A da LCF nº 87/96 (inserido pela LCF n° 190/22), conforme previsto no § 4º do referido dispositivo, ou seja, em 01/03/22, considerando que a disponibilização do portal ocorreu em 31/12/21?

O processo encontra-se instruído com cópias digitalizadas que comprovam a habilitação do signatário da inicial para peticionar em nome da empresa, que estão no arquivo Procuração e Substabelecimento (2761115). A documentação referente ao pagamento da TSE está no arquivo Comprovante de Recolhimento (27611160).

ANÁLISE, FUNDAMENTAÇÃO E RESPOSTA.

A publicação da Lei Complementar federal n.º 190/22, de 04 de janeiro de 2022, está suscitando muitas dúvidas, dividindo contribuintes e os diversos entes tributantes no tocante à produção dos seus efeitos.

Diante desse cenário, no exercício da competência lhe atribuída pelo inciso I do artigo 36 do Anexo IV do artigo 36 da Resolução SEFAZ n.º 48/19, a Coordenadoria de Consultas Jurídico-Tributárias (CCJT) formou o entendimento que passa expor a seguir.

No contexto nacional de uma nova sistemática de tributação pelo ICMS, o Estado do Rio de Janeiro se destaca por inserir em sua legislação norma específica, em decorrência da Emenda Constitucional n.º 87/15, que introduziu a partilha do ICMS entre os Estados de origem e destinatário, como uma alternativa para reduzir os efeitos da guerra fiscal entre os Estados, nas saídas interestaduais de mercadorias destinadas a consumidor final, não contribuinte do ICMS.

Nesse sentido, no exercício da competência que lhe foi atribuída pelo inciso II do artigo 155 da Constituição Federal de 1988, disciplinando o inciso VII do § 2º do seu artigo 155, com redação dada pela Emenda Constitucional n.º 87/15, e com fundamento no inciso II, do artigo 124[1], do Código Tributário Nacional (CTN), o Estado do Rio de Janeiro editou a Lei Estadual n.º 7.071/15, com efeitos a partir de 01/01/16, acrescentando o inciso IV ao artigo 19 da Lei Estadual n.º 2.657/96[2], estabelecendo que o destinatário da mercadoria ou serviço é solidariamente responsável pelo pagamento do ICMS relativo ao diferencial de alíquotas devido em operações ou prestações interestaduais destinadas a não contribuinte do ICMS, nas hipóteses dos XVIII e XIX do artigo 3º da lei estadual[3] .

Cabe lembrar que, nos termos do artigo 6º do CTN, “a atribuição constitucional de competência tributária compreende a competência legislativa plena, ressalvadas as limitações contidas na Constituição Federal, nas Constituições dos Estados e nas Leis Orgânicas do Distrito Federal e dos Municípios, e observado o disposto nesta Lei”, o que implica na possibilidade dos entes federativos legislarem em matéria de Direito Tributário, dentro das atribuições de cada um.

Com efeito, inexistindo o destaque na nota fiscal de remessa ou DARJ com pagamento em nome do destinatário, e não consignado o recolhimento no campo próprio do documento auxiliar da Nota Fiscal eletrônica (DANFE), emitido pelo fornecedor localizado em outra unidade federada, desde a referida data, o legislador estadual estabeleceu a responsabilidade solidária da pessoa física ou jurídica não contribuinte do ICMS, residente ou domiciliada no Estado do Rio de Janeiro, em realizar o pagamento do imposto devido, quando o mesmo não fosse pago pelo remetente. Ressalta-se que é dever do fornecedor, de acordo com o disposto no inciso IV do artigo 4º da Lei Federal n.º 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor), informar o seu cliente da obrigação tributária em relação ao Fisco fluminense.

Dessa forma, é entendimento da CCJT que as controvérsias acerca da cobrança do ICMS nas operações e prestações que destinem bens e serviços a consumidor final não contribuinte do ICMS, localizado em outra unidade federada, como consequência da ADIN 5469 e da LC 190/22, residem tão-somente na data em que será atribuído ao remetente da mercadoria ou do bem ou o prestador de serviço, localizado em outra unidade federada, a responsabilidade pelo pagamento do ICMS correspondente à diferença entre as alíquotas interna da unidade federada de destino e interestadual – DIFAL, que passou a ser devido a partir de 01/01/16, com as alterações constitucionais trazidas pela EC 87/15, e continua sendo.

É oportuno salientar que na decisão relativa à ADIN 5469, foram consideradas inconstitucionais diversas cláusulas do Convênio ICMS 93/15, não sendo reconhecido que o denominado DIFAL, nas operações ou prestações que destinem mercadorias, bens e serviços a consumidor final domiciliado ou estabelecido em outra unidade federada, seja um novo imposto, mas sim uma nova sistemática de distribuição de um imposto já existente, que antes era totalmente devido ao Estado de origem e passou a ser dividido com o Estado de destino, a demandar lei complementar federal. Tampouco houve majoração da carga tributária em desfavor do contribuinte.

Importante também realçar que uma mudança na legislação, com uma interrupção por demais duradoura na cobrança de um imposto já existente, que resultará em cargas tributárias diferenciadas em razão da procedência da mercadoria, afronta o artigo 152 da Constituição Federal de 1988, e teria como consequência inevitável distorções no mercado, além de amplo impacto nas contas públicas, tudo na contramão dos objetivos da EC n.º 87/15.

Por todo o exposto, é entendimento desta Coordenadoria de Consulta que nas operações e prestações que destinem bens e serviços a consumidor final não contribuinte do ICMS, localizado em outra unidade federada, até que sejam produzidos os efeitos da Lei Complementar federal n.º 190/22, o ICMS relativo ao DIFAL será cobrado do destinatário, pessoa física ou jurídica não contribuinte do ICMS, residente ou domiciliada no Estado do Rio de Janeiro.

No que tange à produção de efeitos da Lei Complementar federal n.º 190/22, publicada em 05.01.2022, sob a ótica desta Coordenadoria, há dois prazos:

1º) Para a lei em geral, fica postergado o início da produção de seus efeitos para 05.04.2022, consoante expressamente disposto no seu artigo 3º;

2º) No que concerne especificamente às regras de sujeição do remetente localizado em outra unidade federada diretamente à legislação Estado do Rio de Janeiro, relativamente ao diferencial de alíquotas devido à unidade federada de destino, deve ser observado o disposto no artigo 24-A da Lei Complementar n.º 87/96, ora introduzido (pela LC 190/22), segundo o qual estas entrarão em vigor "no primeiro dia útil do terceiro mês subsequente ao da disponibilização do portal", o que ocorreu em 30.12.2021, tema disciplinado pelo Convênio ICMS n.º 235, de 27 de dezembro de 2021.

Portanto, a partir de 01.03.2022, passam a produzir efeitos as regras específicas da Lei Complementar 190/2022 (que alteram a LC 87/96) que determinam que seja exigido do remetente o pagamento do diferencial de alíquotas devido ao estado destino, conforme as normas do Convênio ICMS n.º 236, de 27 de dezembro de 2021.

Por fim, cumpre-se informar que a resposta a esta consulta não produzirá os efeitos que lhe são próprios (artigos 162 e 163 do Decreto n.º 2.473/79) na hipótese de já se ter iniciada, e ainda não concluída, alguma fiscalização junto à empresa consulente, ou caso a mesma já tenha sofrido alguma autuação, ainda pendente de decisão final, cujo fundamento esteja direta ou indiretamente relacionado às dúvidas suscitadas.

Esta consulta perderá automaticamente a sua eficácia normativa em caso de mudança de entendimento por parte da Administração Tributária ou seja editada norma superveniente dispondo de forma contrária.

[1] Art. 124 - São solidariamente obrigadas:

[...];

II - as pessoas expressamente designadas por lei.

[2] Art. 19 - Respondem solidariamente pelo pagamento do imposto:

[...]

IV - o destinatário das operações referidas nos incisos XVIII e XIX do artigo 3º”.

[3] Art. 3º - O fato gerador do imposto ocorre:

[...]

XVIII - na saída de mercadoria de estabelecimento de contribuinte localizado em outra unidade da Federação, destinada a consumidor final não contribuinte localizado neste Estado; e

XIX - na prestação de serviço por contribuinte localizado em outra unidade da Federação, para consumidor final não contribuinte localizado neste Estado.