Importação. Arrendamento Mercantil (Leasing) Internacional: Incidência do ICMS. Despacho Aduaneiro de Nacionalização. Base de Cálculo. Valor Residual.
O presente processo foi inicialmente protocolado na repartição fazendária de vinculação da empresa em 21/05/2018, em meio físico e, posteriormente, digitalizado para ser inserido no Sistema Eletrônico de Informação (SEI), em 22/01/2021, por meio das Petições 12731261, 12731307, 12731341, 12731384 e 12731423.
Conforme expôs na Petição 12731261, a empresa acima qualificada tem por objeto a construção de rodovias, ferrovias, barragens, terraplenagem e pavimentação, execução de obras de saneamento básico, obras de arte especiais, desenvolvimento urbano, locação de equipamentos, operação de mina e consultoria, importação e exportação de equipamentos usados, de acordo com seu Estatuto Social.
Como prestadora de serviços, CNAE 4211101 - Construção de rodovias e ferrovias, é contribuinte do ISSQN, conforme Lei Complementar n.º 116/03.
Relata que para o exercício de suas atividades, necessita de maquinário e equipamento pesado, próprio às atividades de mineração e construção civil, destacando que a grande maioria dos mencionados bens não possui similar no Brasil, pelo que realiza com frequência operação de importação dos mesmos. Nesse contexto, também se apresenta como contribuinte do ICMS, na medida em que aluga e/ou adquire tais equipamentos e maquinário para o exercício de suas atividades.
Acrescenta que para viabilizar a importação dos bens em questão, sempre optou por celebrar contratos de arrendamento mercantil, mais apropriados ao tipo de negócio realizado, sendo facultado à consulente, a depender do equipamento, sua durabilidade e utilidade para os fins propostos, a devolução dos mesmos, com troca por equipamentos mais novos, ou a aquisição do equipamento para integrar seu ativo imobilizado.
Entende a consulente não haver incidência do ICMS na entrada de mercadoria objeto de arrendamento mercantil internacional no Brasil. Faz tal afirmativa no pressuposto de que o ICMS incide sobre a transferência da propriedade do bem, não havendo que se falar na “exação no momento do desembaraço aduaneiro, pois nesse momento não há qualquer operação de compra e venda”.
Em outras palavras, entende a consulente que a real incidência do ICMS será verificada tão somente ao final do contrato de arrendamento mercantil, se, e somente se, a consulente optar por adquirir o bem arrendado. Nesse contexto, tomará como base de cálculo do imposto o valor indicado como residual do bem, consoante se verifica no contrato de arrendamento mercantil internacional (Petições 12731307, 12731307, 12731341 e 12731384).
Por outro lado, entende que, na hipótese de, ao final do contrato, optar por devolver o bem arrendado, em momento algum irá incidir o ICMS, uma vez que, nos termos da legislação aplicável, e consoante entendimento do STF sobre a matéria, não haverá transferência de propriedade do bem arrendado, sendo esse bem, durante todo o contrato, única e exclusivamente de propriedade da empresa arrendadora/locadora.
Em síntese, versa a presente consulta jurídico-tributária acerca da não incidência do ICMS na importação de bens objeto de arrendamento mercantil, com base no inciso XX do artigo 47 do Livro I do Regulamento do ICMS - RICMS/00, aprovado pelo Decreto nº 27.427/00, e, na hipótese de alienação, o imposto seria calculado com base no valor residual do bem, de acordo com os §§ 3º e 4º do artigo 4º do mesmo Livro I c/c Resolução SEFAZ n.º 1.000/16.
Ante o exposto, Consulta:
1) Nas operações de arrendamento mercantil internacional, na entrada do bem no estabelecimento da consulente, ainda que não haja a antecipação da opção de compra, haverá a incidência do ICMS? Se não, quais informações devem constar no preenchimento da Guia para Liberação de Mercadoria Estrangeira sem comprovação do recolhimento do ICMS (GLME)?
2) A consulente deverá emitir Nota Fiscal de entrada no momento do recebimento do bem arrendado/alugado? Se sim, o CFOP a ser indicado na NF é 1.555 - entrada de bem do ativo imobilizado de terceiro, remetido para uso no estabelecimento?
3) Nas operações de arrendamento mercantil internacional, na hipótese de exercer a opção de compra ao final do contrato, haverá a incidência do ICMS? Se sim, a base de cálculo será aquela prevista no contrato como valor residual do bem previsto no contrato, nos termos dos §§ 3º e 4º do artigo 4º do (Livro I) do RICMS/00?
4) Ainda na hipótese de exercer a opção de compra, a consulente está obrigada a emitir Nota Fiscal de entrada? Se sim, o CFOP a ser indicado é o de n.º 1.551 - Compra de bem para o ativo imobilizado?
5) Nas operações de arrendamento mercantil internacional, na hipótese de devolução do bem ao arrendador/locador ao final do contrato, considerando não haver a transferência da propriedade do bem, haverá incidência do ICMS?
6) Na hipótese de devolução do bem ao arrendador/locador ao final do contrato, a consulente estará obrigada a emitir eventual nota fiscal de saída? Se sim, o CFOP a ser indicado é o de n.º 6.555 - Devolução de bem do ativo imobilizado de terceiro, recebido para uso no estabelecimento?
O processo encontra-se instruído com cópias digitalizadas da documentação referente ao pagamento da TSE - arquivo Petição (12731261), fls. 15/17, e com cópias digitalizadas que comprovam a habilitação do signatário da inicial para peticionar em nome da empresa – documento Petição (12731261), fls. 26/27. A AFR – 64.10, de jurisdição da consulente, através da informação fiscal que se encontra em cópia digitalizada na Petição (12731423), fls. 10/12, registrou: (i) que o contribuinte não estava sob ação fiscal na data da protocolização do processo, e; (ii) consta (m) o (s) seguinte (s) auto (s) de infração e/ou Nota (s) de Lançamento e/ou inscrição (ões) em dívida ativa conforme anexo (s). (Vide fls. 141).
Considerando que todas as inscrições estaduais da consulente (raiz do CNPJ 18.540.906) foram baixadas, entendemos que o processo está em condições de prosseguimento.
ANÁLISE E FUNDAMENTAÇÃO.
No RE nº 540.829-SP prevaleceu a tese de que o ICMS não incide sobre operação de arrendamento mercantil internacional cujo objeto seja bem suscetível de devolução ao arrendante e enquanto não houver, e se houver, o exercício da opção de compra pelo arrendatário.
Com efeito, a decisão consubstanciada no RE nº 540.829-SP, em termos práticos, contrariando o entendimento até então vigente do fisco fluminense, bem como do fisco de outros estados, estendeu ao leasing internacional a não incidência do ICMS prevista no inciso VIII do artigo 3º da Lei Complementar federal n.º 87/96, reproduzido de forma impositiva no inciso XX, do artigo 40, da Lei n.º 2.657/96 e inciso XX do Livro I do RICMS/00:
“Art. 3º - O imposto não incide sobre:
[...]
VIII - operações de arrendamento mercantil, não compreendida a venda do bem arrendado ao arrendatário;”.
Frente à decisão definitiva proferida pelo Supremo Tribunal Federal, julgado em sede de repercussão geral, pacificando entendimento de que não mais deve ser exigido o ICMS nas importações em que não haja a transferência de propriedade, foi afastada a ocorrência do fato gerador do ICMS no momento do desembaraço aduaneiro de mercadoria ou bem importados do exterior, alinhando a legislação fluminense com a nova orientação, nos termos do artigo 3º da Resolução SEFAZ n.º 1.000/16, dispondo que:
“Art. 3º - O ICMS, quando devido, será recolhido por ocasião do despacho aduaneiro de nacionalização da mercadoria ou bem importados ou nas hipóteses de extinção do regime aduaneiro especial previstas na legislação federal, nos termos da legislação estadual”.
RESPOSTA.
1) Não. Com base no exposto acima, em operações objeto de arrendamento mercantil, o ICMS, quando devido, será recolhido por ocasião do despacho aduaneiro de nacionalização da mercadoria ou bem importados. Nos termos do § 1º do artigo 212 do Regulamento Aduaneiro (Decreto n.º 6.759/09) “considera-se nacionalizada a mercadoria estrangeira importada a título definitivo”.
No tocante à GLME, o artigo 2º da Resolução SEFAZ n.º 1.000/16 é claro, dispondo que “faz-se necessária a solicitação de aposição do visto na Guia para Liberação de Mercadoria Estrangeira sem Comprovação do Recolhimento do ICMS - GLME, com fundamento na presente Resolução, por ocasião da liberação de bens ou mercadorias importadas, sem que haja transferência de propriedade”.
2) Conforme informação da AFR -64.10 e constatado em consulta ao Sistema Integrado de Cadastro dos Contribuintes do ICMS do Estado do Rio de Janeiro, as inscrições estaduais do conjunto de estabelecimentos vinculados à mesma raiz do CNPJ da empresa consulente foram baixadas, não estando a empresa não contribuinte do ICMS obrigada à emissão da Nota Fiscal Eletrônica (NF-e), modelo 55, instituída pela Ajuste SINIEF 7/05, na entrada ou eventual saída de seus bens.
Cabe acrescentar que o transporte da mercadoria ou bem importado até o estabelecimento do importador ou responsável deve estar acompanhado dos documentos previstos no artigo 7º do Livro XI do Regulamento do ICMS - RICMS/00, aprovado pelo Decreto nº 27.427/00.
Acrescentamos ainda as normas relativamente à emissão de Nota Fiscal Avulsa Eletrônica (NFA-e) por pessoa jurídica não contribuinte do ICMS, conforme o disposto nos §§ 7º e 8º do artigo 35 do Anexo I do Livro VI do RICMS/00:
“Art. 35 - A Nota Fiscal Avulsa Eletrônica (NFA-e) é o documento emitido e armazenado eletronicamente, de existência apenas digital, assinado digitalmente pela Secretaria de Estado de Fazenda, que poderá ser utilizada por:
[...]
V - pessoas não obrigadas à emissão de documentos fiscais e que dela necessitarem.
[...]
§ 7.º Não é exigida a emissão de NFA-e por não contribuinte do ICMS para acobertar a:
I - circulação de bem do ativo fixo e material de uso e consumo pertencente à pessoa jurídica;
II - circulação de móveis e utensílios pertencentes às pessoas físicas;
III - devolução de mercadorias;
IV - importação de bens e materiais de uso e consumo, observado o disposto no parágrafo único do art. 5.º do Livro XI deste Regulamento;
§ 8.º Na hipótese do § 7.º, poderá ser utilizada simples declaração ou romaneio, ou, no caso de empresa prestadora de serviço sujeito ao ISSQN, documento fiscal previsto na respectiva legislação municipal ”.
A não exigência de NFA-e não impede, porém, que a pessoa jurídica, a seu critério, emita NFA- e para acobertar a movimentação do ativo. Esse documento terá o fim específico de acobertar o transporte (inciso V do mesmo artigo).
3) Sim. Conforme respondido no item 1, em operações objeto de arrendamento mercantil o ICMS, quando devido, será recolhido por ocasião do despacho aduaneiro de nacionalização da mercadoria ou bem importados.
Destacamos também anteriormente que na prática a nova orientação decorrente do entendimento firmando através do RE nº 540.829-SP estendeu ao leasing internacional a não incidência do ICMS prevista no XX, do artigo 40, da Lei n.º 2.657/96 (e inciso XX do Livro I do RICMS/00), razão pela qual entendemos se aplicar igualmente ao caso o disposto no § 3º do artigo 4º da Lei n.º 2.657/96 - isto é, na alienação de bem objeto de arrendamento mercantil, o imposto será calculado com base no seu valor residual.
4) Respondida nos itens anteriores.
5) Não, conforme respondido acima.
6) Respondida nos itens anteriores.
Por fim, saliente-se que o exposto aplica-se, exclusivamente, ao arrendamento mercantil internacional idôneo, isto é, o negócio jurídico praticado sem a finalidade de dissimular a ocorrência do fato gerador do tributo ou a natureza dos elementos constitutivos da obrigação tributária. Ou seja, é preciso que haja não apenas o leasing sob a ótica formal (existência de um contrato denominado "contrato de arrendamento mercantil ou leasing"), mas, sobretudo, o leasing do ponto de vista material, no qual esteja claramente demonstrada a opção de compra ao final, por preço honesto e proporcional, insuscetível de induzir à conclusão de que o contrato típico foi utilizado de forma a mascarar um contrato de compra e venda.