ICMS. SUJEIÇÃO PASSIVA TRIBUTÁRIA. DISSOLUÇÃO DE EMPRESA. 1) A apresentação de pedido de dissolução da empresa na Juceal, sem a devida liquidação, não extingue a personalidade jurídica de imediato, nos termos dos arts. 51, 1.102 e 1.109 do Código Civil, de 2002, e do art. 207 da Lei nº 6.404, de 1976; 2) Poderá ser atribuída a condição de sujeito passivo: i) à empresa, contribuinte do imposto, desde que esta ainda não tenha sido extinta (dissolvida e liquidada); e ii) a todos os sócios, por responsabilidade solidária, conforme art. 7º-A, §§ 1º e 2º, da Lei nº 11.598/2007, c/c art. 124, II, do CTN; 3) A responsabilidade do sócio se restringe aos fatos geradores ocorridos no período em que fazia parte do quadro societário da empresa, conforme art. 7º-A, § 2º, da Lei nº 11.598/2007; porém, sugere-se que essa análise seja realizada após apresentação da impugnação ao lançamento, com a juntada de documentos que comprovem o exato período demarcatório de responsabilidade de cada sócio.
INTERESSADO: Gerência de Monitoramento e Informações Fiscais – GMIF
RELATÓRIO
Trata-se de Consulta Fiscal formulada pela Gerência de Monitoramento e Informações Fiscais – GMIF, nos termos do Memorando GMIF nº 44/2017 (fl. 2), relativamente à interpretação da legislação tributária estadual, no que diz respeito à escolha do sujeito passivo da obrigação tributária quando da lavratura de auto de infração para empresa baixada na Junta Comercial do Estado de Alagoas - Juceal.
Alega a GMIF, em síntese, que no termo de distrato, que deu causa a extinção da empresa na Juceal, consta a informação falsa de que a empresa não teria passivo a ser liquidado, quando, na verdade, ela já estaria, na época, inscrita na Dívida Ativa deste Estado, com montante de débito superior a R$ 2.000.000,00 (dois milhões de reais).
Argumenta, ainda, que há divergências de posicionamentos entre fiscais de tributos estaduais lotados na Gerência de Representação Fiscal - GRF desta Secretaria de Fazenda, e que, em razão da possibilidade de decadência do crédito tributário, necessita de uma resposta a esta consulta o mais breve possível.
Nesse sentido, questiona, especificamente, se:
1) o auto de infração deve ser lavrado em face da empresa ou dos sócios desta?
2) caso seja lavrado em relação aos sócios, e caso haja mudança do quadro societário, esse auto será lavrado contra os sócios remanescentes ou em relação aos sócios que participaram da sociedade à época do fato gerador das infrações fiscais?
É o relatório, passo à análise.
FUNDAMENTAÇÃO
Preliminarmente, deve ser averiguado qual o exato momento de ocorrência da extinção da pessoa jurídica. Assim, importa destacar as disposições dos arts. 51, 1.102 e 1.109 do Código Civil, aprovado pela Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002, in verbis:
Art. 51. Nos casos de dissolução da pessoa jurídica ou cassada a autorização para seu funcionamento, ela subsistirá para os fins de liquidação, até que esta se conclua.
§ 1o Far-se-á, no registro onde a pessoa jurídica estiver inscrita, a averbação de sua dissolução.
§ 2o As disposições para a liquidação das sociedades aplicam-se, no que couber, às demais pessoas jurídicas de direito privado.
§ 3o Encerrada a liquidação, promover-se-á o cancelamento da inscrição da pessoa jurídica. [grifo nosso]
Art. 1.102. Dissolvida a sociedade e nomeado o liquidante na forma do disposto neste Livro, procede-se à sua liquidação, de conformidade com os preceitos deste Capítulo, ressalvado o disposto no ato constitutivo ou no instrumento da dissolução.
Parágrafo único. O liquidante, que não seja administrador da sociedade, investir-se-á nas funções, averbada a sua nomeação no registro próprio.
Art. 1.109. Aprovadas as contas, encerra-se a liquidação, e a sociedade se extingue, ao ser averbada no registro próprio a ata da assembléia.
(...) [grifo nosso]
No mesmo sentido, prescreve o art. 207 da Lei das Sociedades por Ações, Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976, vejamos:
Art. 207. A companhia dissolvida conserva a personalidade jurídica, até a extinção, com o fim de proceder à liquidação. [grifo nosso]
Vê-se, da interpretação dos dispositivos retrotranscritos, que se considera extinta a pessoa jurídica somente no momento do encerramento de sua liquidação, assim entendida a total destinação do seu acervo líquido. A liquidação da sociedade empresarial, por sua vez, tem rito e formalidades previstos nos arts. 1.033 a 1.038, e nos arts. 1.102 a 1.112, todos do Código Civil.
Assim, a dissolução não extingue a personalidade jurídica de imediato, já que a pessoa jurídica continua a existir até que se conclua sua liquidação, que consiste, em síntese, na realização do ativo, no pagamento do passivo e na destinação do saldo que houver (líquido) ao titular ou, mediante partilha, aos componentes da sociedade, na forma prevista na a lei, no estatuto ou no contrato social.
A extinção da empresa, de fato, é o término da sua existência; é o perecimento da organização ditada pela desvinculação dos elementos humanos e materiais que dela faziam parte.
Dessa despersonalização do ente jurídico, por consequência, decorre a baixa dos respectivos registros, inscrições e matrículas nos órgãos competentes, inclusive no Cadastro de Contribuinte do Estado de Alagoas - CACEAL.
No caso concreto ora em análise, a GMIF alega que a empresa está baixada na Junta Comercial do Estado de Alagoas – Juceal, e que há informações no contrato de distrato que a empresa não teria passivo a ser liquidado, embora estivesse inscrita na Dívida Ativa deste Estado, com montante de débito superior a R$ 2.000.000,00 (dois milhões de reais).
Nota-se, das informações apresentadas pela GMIF, que não se pode afirmar com exatidão se efetivamente ocorreu a extinção da pessoa jurídica, na forma prevista pela lei, que compreende, como visto anteriormente, as fases da dissolução e de liquidação.
No que concerne à determinação do sujeito passivo da obrigação tributária principal, quando da lavratura do auto de infração, cabe destacar o que dispõe o art. 121 do Código Tributário Nacional - CTN, aprovado pela Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966:
Art. 121. Sujeito passivo da obrigação principal é a pessoa obrigada ao pagamento de tributo ou penalidade pecuniária.
Parágrafo único. O sujeito passivo da obrigação principal diz-se:
I – contribuinte, quando tenha relação pessoal e direta com a situação que constitua o respectivo fato gerador;
II – responsável, quando, sem revestir a condição de contribuinte, sua obrigação decorra de disposição expressa de lei.
Percebe-se, do dispositivo supracitado, que a autoridade fiscal, quando iniciar o lançamento tributário, poderá atribuir a condição de sujeito passivo da relação jurídico tributária ao contribuinte, pessoa que tem relação pessoal e direta com a situação que constitua o respectivo fato gerador, ou ao responsável, pessoa que, mesmo não sendo contribuinte, sua responsabilidade decorre de expressa disposição legal.
Nesse sentido, pode-se dizer, em relação ao caso concreto em análise, que poderá ser atribuída a condição de sujeito passivo à empresa, contribuinte do imposto, desde que esta ainda mantenha personalidade jurídica (não tenha sido devidamente extinta).
No que tange ao questionamento da GMIF acerca da possibilidade de atribuição da condição de sujeito passivo aos sócios da empresa, já que esta realizou pedido de dissolução na Juceal, cabe destacar as recentes modificações legislativas ocorridas na Lei nº 11.598, de 3 de dezembro de 2007, que estabelece diretrizes e procedimentos para a simplificação e integração do processo de registro e legalização de empresários e de pessoas jurídicas.
Nesse contexto, importa anotar que a Lei Complementar nº 147, de 7 de agosto de 2014, modificou substancialmente o procedimento para extinção de empresários e de pessoas jurídicas quando acrescentou o art. 7º-A ao texto da Lei 11.598, de 2007, vejamos:
Art. 7º-A. O registro dos atos constitutivos, de suas alterações e extinções (baixas), referentes a empresários e pessoas jurídicas em qualquer órgão dos 3 (três) âmbitos de governo, ocorrerá independentemente da regularidade de obrigações tributárias, previdenciárias ou trabalhistas, principais ou acessórias, do empresário, da sociedade, dos sócios, dos administradores ou de empresas de que participem, sem prejuízo das responsabilidades do empresário, dos titulares, dos sócios ou dos administradores por tais obrigações, apuradas antes ou após o ato de extinção.
(Incluído pela Lei Complementar nº 147, de 2014)
§ 1º A baixa referida no caput deste artigo não impede que, posteriormente, sejam lançados ou cobrados impostos, contribuições e respectivas penalidades, decorrentes da simples falta de recolhimento ou da prática comprovada e apurada em processo administrativo ou judicial de outras irregularidades praticadas pelos empresários ou por seus titulares, sócios ou administradores. (Incluído pela Lei Complementar nº 147, de 2014)
§ 2º A solicitação de baixa na hipótese prevista no caput deste artigo importa responsabilidade solidária dos titulares, dos sócios e dos administradores do período de ocorrência dos respectivos fatos geradores. (Incluído pela Lei Complementar nº 147, de 2014)
Diferentemente do que ocorria até então, observa-se que atualmente se permite, nos termos do caput do art. 7º-A do referido diploma legal, o registro da extinção (baixa) de empresas perante as Juntas Comerciais ou Cartórios de Pessoas Jurídicas sem a devida apresentação de certidões de regularidade de obrigações tributárias, previdenciárias ou trabalhistas, do empresário, da sociedade, dos sócios, dos administradores ou de empresas de que participem.
Saliente-se, ademais, de acordo com a interpretação do caput c/c o § 1º do mesmo artigo, que a baixa da pessoa jurídica não impede o lançamento das obrigações tributárias, apuradas antes ou após o ato de extinção, relativas à falta de recolhimento do tributo, ou da prática comprovada e apurada, em processo administrativo ou judicial, de outras irregularidades praticadas pelos empresários ou por seus titulares, sócios ou administradores.
Destaque-se, também, nos termos do § 2º do mesmo artigo, que a solicitação de baixa, sem o respectivo pagamento dos tributos devidos, importa em responsabilidade solidária dos titulares, sócios e administradores das sociedades no período de ocorrência dos respectivos fatos geradores.
Nesse contexto, faz-se necessário enfatizar que a responsabilidade dos devedores solidários é concebida como um tipo de responsabilidade por transferência, que está disciplinada nos arts. 124 e 125 do CTN:
Art. 124. São solidariamente obrigadas:
I - as pessoas que tenham interesse comum na situação que constitua o fato gerador da obrigação principal;
II - as pessoas expressamente designadas por lei.
Parágrafo único. A solidariedade referida neste artigo não comporta benefício de ordem.
Art. 125. Salvo disposição de lei em contrário, são os seguintes os efeitos da solidariedade:
I - o pagamento efetuado por um dos obrigados aproveita aos demais;
II - a isenção ou remissão de crédito exonera todos os obrigados, salvo se outorgada pessoalmente a um deles, subsistindo, nesse caso, a solidariedade quanto aos demais pelo saldo;
III - a interrupção da prescrição, em favor ou contra um dos obrigados, favorece ou prejudica aos demais.
Verifica-se, desse modo, que na solidariedade solidária o credor tem a prerrogativa de exigir o cumprimento do total da obrigação tributária de qualquer um dos coobrigados, ou de todos, se assim o desejar; que o Fisco não fica adstrito a uma ordem de preferência, ou seja, não há benefício de ordem, de modo que se cobre inicialmente de um, para só depois fazê-lo com relação ao outro devedor solidário; e que o pagamento de um dos obrigados aproveita aos demais.
Sendo assim, em relação ao caso discutido nestes autos, pode-se afirmar que a sujeição passiva também poderá ser atribuída a todos sócios, na condição sujeitos passivos por solidariedade, tendo em vista que a empresa solicitou sua dissolução sem apresentar comprovação de quitação dos débitos tributários.
Quanto ao questionamento acerca de qual sócio deveria ser responsabilizado, remanescentes ou antigos, quando há modificação do quadro societário, cabe destacar o que dispõe o § 3º do art. 7º-A da Lei nº 11.598, de 2007:
(...)
§ 2º A solicitação de baixa na hipótese prevista no caput deste artigo importa responsabilidade solidária dos titulares, dos sócios e dos administradores do período de ocorrência dos respectivos fatos geradores. (Incluído pela Lei Complementar nº 147, de 2014)
De acordo com o dispositivo mencionado, infere-se que a demarcação da responsabilidade de cada sócio, no caso de solicitação de baixa com débitos tributários, restringe-se aos fatos geradores ocorridos no período em que ele fazia parte do quadro societário da empresa.
Porém, considerando a falta de informações acerca das modificações do quadro societário da empresa, sugere-se que essa análise seja realizada no âmbito do processo administrativo tributário, momento em que os autuados poderão apresentar impugnação ao lançamento e juntar documentos que comprovem o exato período que demarca sua responsabilidade.
CONCLUSÃO
Diante de tudo que foi exposto, conclui-se que:
1) a apresentação de pedido de dissolução da empresa na Juceal não extingue sua personalidade jurídica de imediato, já que a pessoa jurídica continua a existir até que se conclua sua liquidação, nos termos dos arts. 51, 1.102 e 1.109 do Código Civil, de 2002, e do art. 207 da Lei nº 6.404, de 1976;
2) poderá ser atribuída a condição de sujeito passivo: i) à empresa, contribuinte do imposto, desde que esta não tenha sido extinta (dissolvida e liquidada); e ii) a todos os sócios, na condição de responsável solidário, conforme art. 7º-A, §§ 1º e 2º, da Lei nº 11.598/2007, e art. 124, II, do CTN;
3) a responsabilidade do sócio se restringe aos fatos geradores ocorridos no período em que ele fazia parte do quadro societário da empresa, conforme art. 7º-A, § 2º, da Lei nº 11.598/2007; porém, considerando a falta de informações acerca das modificações do quadro societário, sugere-se que essa análise seja realizada no âmbito do processo administrativo tributário, momento em que os autuados poderão apresentar impugnação ao lançamento e juntar documentos que comprovem o exato período demarcatório de sua responsabilidade.
É o parecer, salvo melhor juízo.
Assessoria da Gerência de Tributação, em Maceió, 28 de abril de 2017.
Afrânio Menezes de Oliveira Júnior
Em Assessoramento
De acordo. Aprovo o parecer exarado, que encaminho à apreciação do Sr. Superintendente da Receita Estadual.
Gerência de Tributação, em Maceió, 28 de abril de 2017.
Jacque Damasceno Pereira Júnior
Gerente de Tributação