Não incidência nas transferências interestaduais de bens do ativo imobilizado. Alínea “b” do inciso II do § 2º do art. 155 da Constituição da República Federativa do Brasil. Transferência do crédito remanescente de ICMS do CIAP. Impossibilidade.
Trata a presente consulta de requisição formulada pelo estabelecimento acerca da possibilidade de aproveitamento do crédito remanescente do ICMS referente ao ativo imobilizado transferido do estabelecimento situado em São Paulo para o do Rio de Janeiro, amparado pela não incidência.
A consulente, pessoa jurídica de direito privado, afirma que possui como atividade principal a extração de petróleo e gás natural e recebe bens destinados ao ativo imobilizado, aplicados diretamente na atividade fim.
Posteriormente, menciona o art. 179 da Lei nº 6.404/76 (definição do ativo imobilizado), o art. 20 da Lei Complementar nº 87/96, e complementa expondo que controla a “entrada das mercadorias destinadas ao ativo imobilizado que serão empregadas em sua atividade fim” através do registro no livro CIAP.
Em seguida, alega que o estabelecimento objeto desta consulta, localizado no Rio de Janeiro, recebe materiais, destinados ao ativo imobilizado, enviados pela filial inscrita no Estado de São Paulo. Explicita, quanto ao presente caso, que o estabelecimento localizado em São Paulo adquiriu o bem “Analisador de PH digital 0-14” (equipamentos, que segundo a requerente, são empregados em todos os tipos de processos industriais), com incidência do ICMS, e que adiante, o transfere para filial do Rio de Janeiro amparado pela não incidência do ICMS.
Ratifica, ainda que “apropriação do crédito do ICMS registrado no CIAP foi iniciada quando da sua aquisição no estabelecimento inscrito no CNPJ sob o n° 33.000.167/0643-47 — SP, em 17/0412014, até o momento da sua transferência, em 01I08I2016, portanto, 25 parcelas apropriadas e 23 parcelas a apropriar”.
Adiante, expõe seu entendimento, quanto às operações de transferências de bens destinados ao ativo imobilizado para outro estabelecimento do mesmo titular, embasado no Decreto nº 45.4901/00 – RICMS SP, e conclui que “qualquer tipo de saída do bem situado no Estado de São Paulo, para qualquer ponto do território nacional, está abrangido pela não incidência, e por conta disto não há o destaque do imposto no documento fiscal. Também não há dúvida de que o Estado de São Paulo possibilita a transferência para o estabelecimento destinatário dos bens, do saldo do crédito remanescente no estabelecimento de origem, quando das transferências ocorridas a partir do Estado de São Paulo, inclusive em operações interestaduais”.
Finaliza defendendo que o RICMS RJ também prevê a possibilidade de transferir o saldo remanescente do crédito de ICMS para outro estabelecimento do mesmo titular, destinatário dos bens do ativo imobilizado, transcrevendo os arts. 13 e 14 do Anexo II do Livro VI do RICMS RJ, assim como o art. 40 da Lei nº 2.657/96 que prevê a não incidência do ICMS sobre a saída de bem do ativo
permanente e de material de uso ou consumo para outro estabelecimento da mesma empresa, ainda que em operação interestadual.
Isto posto consulta:
“. Na transferência do bem do ativo imobilizado entre o estabelecimento localizado em São Paulo para o Rio de Janeiro, amparada pela não incidência do imposto, é permitido o aproveitamento do crédito remanescente do ICMS ainda não compensado e devidamente registrado no livro CIAP no estabelecimento de origem?
. Para a comprovação do crédito a ser compensado pelo estabelecimento destinatário situado no Rio de Janeiro, basta o contribuinte ter as informações descritas nos itens 1 e 2 do art. 61, §11 do Decreto 45.490100 RICMS SP, ou seja: (i) a quantidade e o valor das parcelas remanescentes oriundas o Estado de origem, (ii) o número e a data da nota fiscal de aquisição do bem pelo estabelecimento situado no Estado de origem e (iii) o valor do crédito original? Há necessidade de outras informações para a apropriação do crédito?
. No caso específico das transferências oriundas do Estado de São Paulo, onde a legislação daquele Estado obriga o contribuinte remetente do ativo (estabelecimento de origem) a inserir na nota fiscal de transferência do bem, no campo informações complementares, as informações relativas ao crédito remanescente, o Estado do Rio de Janeiro aceita esse documento fiscal como suporte para a compensação do crédito remanescente pelo estabelecimento destinatário situado neste Estado? Importante ressaltar que as informações contidas na nota fiscal de transferência de ativo exigida pelo Estado do Rio de Janeiro são basicamente as mesmas previstas pelo art. 61, §11 do Decreto 45.490100 (RICMS-SP).
. Como há dificuldade para identificar todos dados previstos na legislação do Estado de São Paulo quando da emissão da nota fiscal de transferência do bem, perguntamos se o contribuinte pode utilizar carta de correção para complementar os dados adicionais citados, de forma a subsidiar a recuperação dos créditos no estabelecimento de destino do Estado do Rio de Janeiro.
. Caso negativo, qual procedimento o contribuinte deve seguir para suportar o registro do crédito remanescente?
. Para a compensação do saldo do crédito remanescente é necessário pedido de autorização prévia ao Estado do Rio de Janeiro para a compensação deste crédito? Se positivo, qual seria o fundamento legal?”
O presente processo encontra-se instruído com a inicial (08 folhas), cópias do DARJ, do Demonstrativo de Item de Pagamento e do comprovante de pagamento referentes à taxa de serviços estaduais, assim como cópia de atos constitutivos (38 folhas). Em seguida, acosta cópia da procuração, substabelecimento e documento de identificação (21 folhas).
Em derradeiro, o processo foi encaminhado a esta Superintendência pela AFE 04, conforme despacho, com a informação de que: “Existe ação fiscal RAF Nº 494074-51 iniciada e ainda não concluída no estabelecimento de inscrição estadual nº 81.281.88-2, do programa de fiscalização 04VEROPE, sem vínculo com o tema objeto da consulta formulada no presente processo eletrônico; Também não se constatou qualquer autuação ainda pendente de decisão final para esse contribuinte, cujo fundamento esteja direta ou indiretamente relacionado à consulta formulada no presente processo; Insta ainda destacar que o pedido foi instruído com a comprovação do recolhimento da TSE correspondente”.
Preliminarmente, cumpre ressaltar que, conforme disposto no Regimento Interno da SEFAZ, aprovado pela Resolução SEFAZ nº 89/2017, a competência da Superintendência de Tributação, bem como da Coordenadoria de Consultas Jurídico Tributárias abrange a interpretação da legislação tributária fluminense em tese, cabendo à verificação da adequação da norma ao caso concreto exclusivamente à autoridade fiscalizadora ou julgadora.
Ademais, esclarecemos que o objetivo das soluções de consulta tributária é elucidar questões objetivas formuladas pelos consulentes acerca da interpretação de dispositivos específicos da legislação tributária no âmbito da Secretaria de Fazenda e Planejamento do Estado do Rio de Janeiro, presumindo-se corretas as informações e documentos apresentados pela consulente, assim como as informações e verificações de competência da autoridade fiscal, sem questionar suas exatidões. As soluções de consulta não convalidam regimes, cálculos, interpretações, benefícios, informações, ações ou omissões aduzidas na consulta. Cabe, ainda, destacar que não compete à SUT a verificação quanto à devida confirmação de entrada em receita da Taxa referente à consulta jurídico-tributária prevista na legislação, sendo requisito formal de verificação, no momento da instrução processual, por parte da repartição responsável pela abertura do presente.
Assim sendo, passemos a analisar o mérito da questão. Inicialmente, imprescindível tecermos algumas observações quanto aos conceitos tratados na presente consulta.
Nos termos do inciso IV do art. 179 da Lei nº 6.404/76 são classificados como ativo imobilizado “os direitos que tenham por objeto bens corpóreos destinados à manutenção das atividades da companhia ou da empresa ou exercidos com essa finalidade, inclusive os decorrentes de operações que transfiram à companhia os benefícios, riscos e controle desses bens”.
Nesse diapasão, os incisos XXV e XXVI do artigo 40 da Lei nº 2.657/96 assim dispõem:
Art. 40 - O imposto não incide sobre operação e prestação:
[...]
XXV - de saída de bem do ativo permanente e de material de uso ou consumo para outro estabelecimento da mesma empresa, ainda que em operação interestadual;
XXVI - de entrada de bem do ativo permanente e de material de uso ou consumo, em relação à diferença entre a alíquota interna e a interestadual, quando recebido em transferência interestadual de outro estabelecimento da mesma empresa.
Observe que as operações de transferências de bens do ativo imobilizado entre estabelecimentos de mesma titularidade devem ser realizadas pelo mesmo valor do ativo constante do inventário.
Adicionalmente, necessário se faz diferenciar a transferência do ativo imobilizado nas operações internas das operações interestaduais. No caso de transferência interna de bens do ativo imobilizado entre estabelecimentos de mesma titularidade, o destinatário do bem terá direito ao crédito relativo à sua aquisição, correspondente ao valor do crédito remanescente, devendo proceder de acordo com o Anexo II, Livro VI do RICMSRJ/00.
Já a hipótese de utilização dos créditos remanescentes na transferência interestadual do ativo imobilizado entre estabelecimentos de mesma titularidade não encontra amparo na legislação tributária fluminense, dependendo de anuência entre os estados envolvidos, mediante convênio, protocolo ou acordo, até hoje não implementados.
Desta forma, assim como os insumos, a legislação do ICMS até admite o crédito de ICMS dos bens destinados ao ativo imobilizado, desde que não estejam amparados por isenção ou não incidência. Atente ao que determina, principalmente, o disposto no caput do artigo 20, assim como seu §5º1 da Lei Complementar nº 87/96:
Art. 20 - Para a compensação a que se refere o artigo anterior, é assegurado ao sujeito passivo o direito de creditar-se do IMPOSTO ANTERIORMENTE COBRADO EM OPERAÇÕES DE QUE TENHA RESULTADO A ENTRADA de mercadoria, real ou simbólica, no estabelecimento, inclusive a destinada ao seu uso ou consumo ou ao ativo permanente, ou o recebimento de serviços de transporte interestadual e intermunicipal ou de comunicação.
Em suma, somente seria possível o aproveitamento do crédito remanescente de ativo imobilizado (diretamente ligados à finalidade da empresa) transferido entre estabelecimentos localizados no Estado do Rio de Janeiro, obedecendo, ainda, os artigos 132 e 143 do Anexo II do Livro VI do RICMSRJ. Isto é, assiste direito ao contribuinte creditar-se daquilo que esteja vinculado ao seu processo produtivo e que tenha gerado débito de ICMS, respeitando assim o consagrado princípio constitucional da não-cumulatividade.
A propósito, e em sintonia com o acima explicitado, a operação amparada pela não-incidência acarreta a anulação de crédito relativo às operações anteriores, de acordo com inciso II do §2º do art. 155 da Constituição da República Federativa do Brasil.
Art. 155 - Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre:
[...]
II - operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior;
§ 2º - O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte:
[...]
II - a isenção ou não-incidência, salvo determinação em contrário da legislação:
a) não implicará crédito para compensação com o montante devido nas operações ou prestações seguintes;
b) acarretará a anulação do crédito relativo às operações anteriores;
Considerando todo o exposto acima, passemos as respostas. Não é permitido o aproveitamento de crédito remanescente relativo à operação de transferência interestadual entre estabelecimentos da mesma titularidade. Observando o princípio constitucional da não cumulatividade, a Lei Complementar nº 87/96 somente admite o crédito de ICMS dos bens destinados ao ativo imobilizado, desde que não estejam amparados por isenção ou não incidência.
De igual forma, o inciso II do §2º do art. 155 da Constituição da República Federativa do Brasil determina que a operação amparada pela não-incidência acarreta a anulação de crédito relativo às operações anteriores, de acordo com inciso II do §2º do art. 155 da Constituição da República Federativa do Brasil. Em suma, somente seria possível o aproveitamento do crédito remanescente de ativo imobilizado (diretamente ligados à finalidade da empresa) transferido entre estabelecimentos localizados no Estado do Rio de Janeiro, obedecendo, ainda, os artigos 134 e 145 do Anexo II do Livro VI do RICMSRJ. Isto é, assiste direito ao contribuinte creditar-se daquilo que esteja vinculado ao seu processo produtivo e que tenha gerado débito de ICMS, respeitando assim o consagrado princípio constitucional da não-cumulatividade. Os demais questionamentos apresentados encontram-se prejudicados tendo em vista o teor da resposta concedida acima, relativa ao questionamento 22.1.
Fique a consulente ciente de que esta consulta perderá automaticamente a sua eficácia normativa em caso de mudança de entendimento por parte da Administração Tributária, ou seja, editada norma superveniente dispondo de forma contrária.
Pelo o exposto, opino pelo retorno dos presentes autos com vistas à Auditoria-Fiscal Especializada de Petróleo e Combustível - AFE 04, para cientificar o interessado.
C.C.J.T., em 03 de agosto de 2018.