Publicado no DOE - CE em 14 out 2024
ICMS. Consulta Tributária. Empresa beneficiária de diferimento em operação de importação de matérias-primas e insumos pelo Fundo de Desenvolvimento Industrial (FDI) para utilização em processo de industrialização. Mercadorias inservíveis. Destruição. Necessidade de recolhimento do ICMS. Impossibilidade de creditamento. Artigo 72.o do Decreto n.o 33.327/2019. Parecer Cecon n.o 001/2017. IN 46/2013.
ICMS. Consulta Tributária. Empresa beneficiária de diferimento em operação de importação de matérias-primas e insumos pelo Fundo de Desenvolvimento Industrial (FDI) para utilização em processo de industrialização. Mercadorias inservíveis. Destruição. Necessidade de recolhimento do ICMS. Impossibilidade de creditamento. Artigo 72.o do Decreto n.o 33.327/2019. Parecer Cecon n.o 001/2017. IN 46/2013.
A empresa acima identificada, sob o Regime Normal de Recolhimento e não optante do Simples Nacional, com CNAE principal 2121101 (fabricação de medicamentos alopáticos para uso humano), dirigiu consulta tributária a esta Secretaria da Fazenda a fim de informar que firmou Contrato de Mútuo para o enquadramento no Fundo de Desenvolvimento Industrial (FDI), de forma a que as matérias-primas e insumos adquiridos por importação para a utilização em seu processo industrial fossem beneficiadas com diferimento. Entretanto, questiona o procedimento a ser seguido quando as mercadorias importadas não forem utilizadas no processo industrial por se tratarem de produtos inservíveis, de forma a serem destinados à destruição.
Em suma, apresentou os seguintes questionamentos:
1. Considerando a Importação com Diferimento do ICMS, CFOP 3.101, qual o procedimento adequado para regularização do imposto nesse momento?
2. A emissão da Nota Fiscal de Destruição, seguido da baixa de estoque, poderá ser emitida nos termos Parágrafo Único do Artigo 4.º da IN Sefaz 46/2013 e Inciso IV do Artigo 73 do Decreto 33.327/2019, onde a empresa irá efetuar saída subsequente do produto ora importado, sem que houvesse sua utilização/transformação?
Por fim, para a análise do mérito, fez-se necessário, primeiramente, o encaminhamento dos autos para que a Célula de Benefícios Fiscais (CEBEF) elaborasse Informação Fiscal.
É esse o relato.
O cerne da matéria posta ao exame desta Secretaria da Fazenda se traduz no questionamento de qual procedimento deve ser adotado para a destinação à destruição de mercadorias inservíveis, no caso em que foram adquiridas por importação beneficiada com diferimento do ICMS de 100% em razão de ser a empresa adquirente beneficiária do Fundo de Desenvolvimento Industrial (FDI).
Inicialmente, é importante diferenciar os casos de descarte de lixo das operações com sucatas. Essa diferenciação é essencial, pois a saída de lixo é, em princípio, ocorrência que não se reveste das características de saída de mercadoria, uma vez que, destituída de valor econômico, não satisfaz o conceito de mercadoria.
Assim, denomina-se “lixo” o material descartado, cedido de forma gratuita, sem valor econômico para quem o descarta e sem ônus financeiro para quem o recebe, não se traduzindo, portanto, em hipótese de incidência do ICMS. Não há nesse caso, então, como se utilizar do volume coletado como matéria-prima de novos produtos.
Já as sucatas apresentam valor econômico. Conforme o conceito amparado pela legislação tributária do Estado do Ceará (§ 2.º do artigo 643 do Decreto n.º 24.569/1997), tem-se que:
“Art. 643. Fica atribuída a responsabilidade pelo recolhimento do ICMS ao industrial que adquirir de pessoa física ou jurídica, ainda que não contribuinte do ICMS:
I - sucatas de metais, papel usado ou resíduo de papel, de plástico, de tecido, de borracha, fragmentos de vidros, e congêneres;
(...)
§ 2º Para efeito do disposto nesta Seção, considera-se sucata ou resíduo, as mercadorias que se tornarem definitiva e totalmente inservíveis para o uso a que se destinavam originariamente, só se prestando ao emprego como matéria-prima na fabricação de novo produto”.
Então, embora a sucata não tenha mais utilidade para os fins a que se propôs inicialmente, o volume coletado nesse caso tem valor econômico, tendo em vista a possibilidade de reciclagem.
Dessa forma, frente às escassas informações prestadas pela requerente, parte-se do pressuposto de que as mercadorias a serem recolhidas constituem “lixo”, já que se trata de material inservível para a consulente, e que empresa especializada coletará o material de forma não onerosa (ou seja, não haverá comercialização), em operação interna, para fins de destruição. Caso essa premissa não se coadune com o caso apresentado pela requerente, esta poderá retornar com novo peticionamento esclarecendo detalhadamente a situação que suscita dúvida.
Ademais, apresenta-se o teor da Informação Fiscal da Célula de Benefícios Fiscais (CEBEF), in verbis:
“A autora ingressou com o presente pedido de consulta sobre a aplicação da legislação estadual que trata acerca das operações de baixa de estoque decorrente da destruição de matéria prima importada com o diferimento do ICMS Importação, por se tratar de empresa beneficiária do Fundo de Desenvolvimento Estadual – FDI.
Afirma que não utilizou a matéria-prima importada em seu processo produtivo em decorrência de desvio de qualidade e que, por se tratar de produto inservível, irá contratar empresa especializada em destruição. Por tal razão, se dirige a esta Secretaria solicitando orientações quanto à regularização da operação com tais mercadorias.
Após breve síntese dos fatos, passamos a prestar as seguintes informações:
O assunto envolve a resposta a duas questões: o procedimento para a regularização do imposto e para o cumprimento das obrigações acessórias decorrentes da operação.
Quanto à regularização da obrigação principal:
Conforme atesta a requerente, a matéria-prima está relacionada na Resolução CEDIN 177/2018, que prevê o diferimento de 100% do ICMS incidente na operação de importação, nos seguintes termos:
RESOLUÇÃO CEDIN Nº 177/2018
I – Conceder a sociedade empresária FRESENIUS KABI BRASIL LTDA., (...) o DIFERIMENTO equivalente ao percentual de 100% (cem inteiros por cento) do ICMS incidente nas importações das matérias primas e insumos para utilização no processo industrial, especificadas no Anexo Único desta Resolução, em consonância com o que preceitua o Art. 13, §1º, item V do Decreto nº 24.569/97 – Regulamento do ICMS e o Decreto nº 32.482/2017. A concessão fica condicionada a apresentação do Certificado de Não Similaridade dos produtos, emitido pela SEFAZ.
Como se percebe pela leitura da citada resolução, o diferimento do ICMS concedido na importação se destina às matérias-primas e insumos para serem utilizadas no processo industrial. Neste caso, a incidência do imposto devido pela entrada do exterior é postergado para a operação tributada subsequente, que é a saída do produto industrializado.
No caso em análise, uma vez que o ICMS Importação fora diferido, esperava o Estado que o imposto fosse recolhido na operação subsequente.
Por razões alheias, não havendo uma operação subsequente de saída do produto industrializado, o imposto correspondente àquela matéria-prima deixará de ser recolhido, uma vez que deixou de ser aplicada na industrialização.
Assim, verifica-se que a condição pela qual o Estado concedeu o diferimento (“para utilização no processo industrial”) não foi cumprida, razão pela qual deve o requerente pagar o ICMS Importação, da mesma forma que faria uma empresa não beneficiada pelo FDI, tendo como referência à data do desembaraço aduaneiro.
Da impossibilidade do creditamento do imposto pago:
Uma vez pago o ICMS Importação, não poderá a indústria importadora creditar-se deste valor para compensar com seus débitos pelo fato de que a operação subsequente não irá acontecer, posto se tratar de matéria-prima inservível à aplicação ao processo industrial, que irá ser destruída.
Para justificar esse entendimento, vejamos o tratamento tributário dispensado pela legislação a caso semelhante, mas numa operação oriunda do próprio país.
A empresa industrial, quando adquire a matéria-prima numa operação com destaque de ICMS, escritura esse valor em seu livro fiscal para ser compensado com o débito decorrente da saída do produto industrializado.
Caso esta matéria-prima não venha a ser integrada ao processo produtivo por estar inservível, vencida, estragada, obsoleta etc., vindo a ser descartada e baixada do estoque, deverá a empresa industrial, além de emitir o documento fiscal decorrente da baixa (sem o destaque do ICMS – portanto, sem débito), estornar o crédito da operação de aquisição da matéria-prima. É o que dispõe o art. 73 do Decreto 33.327/2019:
Art. 73. Salvo disposição da legislação em contrário, o sujeito passivo deverá efetuar o estorno do ICMS de que se tiver creditado sempre que o serviço tomado ou a mercadoria entrada no estabelecimento:
I – for objeto de saída ou prestação de serviço não tributadas ou isentas, sendo esta circunstância imprevisível na data da entrada ou da utilização do serviço;
IV – não for, por qualquer motivo, objeto de operação ou prestação subsequente, ressalvado o disposto no art. 61;
Neste caso, não podendo utilizar o crédito da matéria-prima para compensação, a indústria arcará com o custo tributário que onerou a aquisição, uma vez que o valor do ICMS foi desembolsado pelo adquirente.
Assim, o valor contabilizado como ICMS Recuperar será baixado como custo ou despesa. Em se tratando de uma operação de importação, teríamos o mesmo raciocínio: a indústria pagaria o ICMS importação da matéria-prima e se creditaria do valor pago. Quando do descarte e da baixa daquela em seu estoque, deverá estornar o crédito da operação de aquisição.
Da mesma forma, a indústria arcará com o custo tributário que onerou a aquisição.
Salientamos que não se trata de operação de devolução da matéria-prima importada ou de desfazimento da operação de importação. A matéria-prima foi nacionalizada e assim permanecerá.
Sendo a adquirente indústria beneficária do FDI, o tratamento não pode ser diferente. Em que pese o ICMS devido pela importação não ter sido pago quando do desembaraço aduaneiro, posto que diferido para a operação subsequente, sendo esta operação subsequente não tributada ou não realizada (neste caso, em decorrência da baixa do estoque por destruição), passa a ser devido o ICMS importação que, após o pagamento, não poderá ser levado à crédito. Assim, da mesma forma, a indústria beneficária do FDI arcará com o custo tributário que onerou a aquisição, uma vez que o valor do ICMS foi desembolsado pela adquirente.
E, neste caso, como o pagamento do ICMS devido pela importação ocorrerá no momento atual, quando já se sabe que não poderá ser levado à crédito em sua conta gráfica, deve se falar em vedação ao crédito, nos termos do art. 72 do Decreto 33.327/2019:
Art. 72. Fica vedado o aproveitamento de crédito de ICMS nas seguintes hipóteses:
I – operação ou prestação beneficiadas com isenção ou não incidência, salvo determinação em contrário da legislação;
Desta forma, dá-se o mesmo tratamento tributário tanto para as aquisições dentro do país e de fora do país, seja a empresa beneficiária ou não do FDI.
O benefício fiscal não pode ser desvirtuado para conceder tratamento diferenciado quando descumpridas as regras do acordo firmado.
Quanto à regularização da obrigação acessória:
Quanto à regularização da operação relativamente à emissão dos documentos fiscais pertinentes, remetemos aos procedimentos descritos no PARECER CECON Nº 001/2017, devendo ser observadas as regras da IN 46/2013.
É o que tínhamos a informar.”
Portanto, conforme esclarecido na Informação Fiscal, a consulente deverá recolher o ICMS que deixou de ser arrecadado em virtude da aplicação do diferimento de 100% do imposto pelo FDI, em virtude de não ter adimplido com um dos requisitos essenciais à sua aplicação, qual seja, o de utilização das mercadorias no processo industrial, na forma do art. 13, §1.º, V, do Decreto n.º 24.569/1997 (legislação vigente à época e atualmente substituída pelo item 34.0.3 do Anexo II do Decreto n.º 33.327/2019).
A consulente também não poderá se creditar desse valor em sua conta gráfica, posto que se trata de caso de vedação ao crédito, nos termos do art. 72 do Decreto 33.327/2019. Caso já tenha se
creditado, deverá estornar os créditos relativos a essas mercadorias em sua conta gráfica, em atenção ao art. 73 do Decreto 33.327/2019.
Quanto à regularização das obrigações acessórias, destaca-se o procedimento previsto no Parecer CECON n.º 001/2017 e na IN n.º 46/2013, acerca da necessidade de emissão de Nota Fiscal
Eletrônica (NF-e) quando da saída do material inservível, indicando o CFOP 5.927 (Lançamento efetuado a título de baixa de estoque decorrente de perda, roubo ou deterioração), sem destaque do imposto. In verbis:
IN N.º 46/2013
Art. 4º Integrarão também o custo os valores das seguintes parcelas:
I – quebras ou perdas de matérias-primas, material de embalagem e demais produtos, ocorridas na fabricação, no transporte e manuseio, de acordo com a natureza do bem e da atividade, conforme parâmetros aceitos em normas e padrões técnicos pertinentes;
II – quebras ou perdas de estoque por deterioração, obsolescência ou pela ocorrência de riscos não cobertos por seguros, desde que comprovadas através de:
a) laudo ou certificado de autoridade sanitária ou de segurança, que especifique e identifique as quantidades destruídas ou inutilizadas e as razões da providência;
b) certificado de autoridade competente, nos casos de incêndios, inundações ou outros eventos semelhantes;
c) laudo de autoridade fiscal demandada a certificar a destruição de bens obsoletos, invendáveis ou danificados, quando não houver valor residual apurável.
Parágrafo único. Para operacionalização do disposto no inciso II do caput deste artigo, a empresa deverá emitir documento fiscal relacionando as mercadorias avariadas para efeito de baixa nos estoques, estornando os créditos, se for o caso. (grifos nossos)
PARECER CECON N.º 0001/2017
Com efeito, os materiais deteriorados e imprestáveis de que trata a presente consulta não se revestem da condição de mercadorias, visto que não são objetos de mercancia, não tendo sequer valor econômico. Dessa forma, a consulente deverá calcular o crédito fiscal do qual se apropriou, proporcionalmente, relativamente aos insumos cuja industrialização resultou na "produção" de tais materiais inservíveis, em cada mês. Encontrado, mês a mês, o valor de tal crédito, deverá estorná-lo em sua Escrituração Fiscal Digital (EFD), em observância ao disposto no art. 66, II, do Decreto n.º 24.569, de 31 de julho de 1997. A planilha relativa aos cálculos do valor do crédito fiscal estornado deverá ser arquivada pelo prazo prescricional de cinco anos, para o caso de eventuais verificações fiscais.
Passamos a responder às indagações na ordem em que foram formuladas:
1. Sim, há necessidade de emissão de Nota Fiscal eletrônica (NF-e), visto que se trata de um resíduo industrial (para a produção do qual foram utilizados insumos adquiridos) e o documento fiscal é necessário para justificar o valor do estorno do crédito fiscal de que falamos acima, prestando-se a eventuais verificações fiscais por parte desta Secretaria.
2. A NF-e a ser emitida por ocasião de cada saída do material imprestável para aterro sanitário ou estação de tratamento deverá indicar o CFOP
5.927 (Lançamento efetuado a título de baixa de estoque decorrente de deterioração de mercadorias). O documento fiscal acompanhará os materiais até o local de descarte. (grifos nossos)
(...)
O documento fiscal deverá acompanhar os materiais até o local de destruição ou descarte, com especificação do endereço para o qual serão remetidos, da empresa especializada na destruição.
No campo Informações Complementares da NF-e, a consulente deverá, ainda, anotar o número deste parecer, e também indicar no campo próprio da NF-e o peso total do material transportado, bem como, na medida do possível, a descrição da natureza do material.
Por fim, fica o sujeito passivo obrigado ao registro da operação de saída na Escrituração Fiscal Digital (EFD), bem como à observância da Resolução RDC n.º 222, de 28 de março de 2018, e das
demais normas da vigilância sanitária e de serviços geradores de resíduos de serviços de saúde.
Por todos os fatos e fundamentos acima expostos, sanados os questionamentos da consulente, concluímos o presente parecer à consideração superior.
A data da publicação indicada refere-se à data em que a consulta foi incluída digitalmente no Portal da SEFAZ/CE.