Portaria Conjunta SEGUP/PROCON/PA/SEMU/SEJU/DPA-POLICIA CIVIL Nº 19 DE 06/02/2025


 Publicado no DOE - PA em 18 fev 2025


Regulamenta a Lei Estadual Nº 9238/2021, que dispõe sobre a obrigatoriedade de ação dos bares, restaurantes e estabelecimentos noturnos no enfrentamento de situações de risco de violências físicas, psicológicas e sexuais contra mulheres em suas dependências, e o Decreto Nº 3643/2024, que institui o protocolo “Não se cale”.


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A SECRETARIA DE ESTADO DAS MULHERES, em Articulação com a SECRETARIA DE ESTADO DE JUSTIÇA por intermédio do PROCON/PA e a SECRETARIA DE ESTADO DE SEGURANÇA PÚBLICA E DEFESA SOCIAL,a POLÍCIA CIVIL DO PARÁ por intermédio da DIRETORIA DE POLÍCIA ADMINISTRATIVA E DIRETORIA DE GRUPOS VULNERÁVEIS, no exercício das competências constitucionais e legais atribuídas aos secretários de estado,

CONSIDERANDO o Art. 1º da Lei Estadual Nº 9.238/2021 e as diretrizes do Decreto Nº 3.643/2024 que instituiu no estado do Pará o protocolo “Não se cale”;

RESOLVEM:

CAPÍTULO I - Das disposições introdutórias

Art. 1° -Esta Portaria conjunta regulamenta a Lei Estadual Nº 9.238/2021 complementarmente às disposições do Decreto Nº 3.643/2024, que institui o protocolo “Não se cale”, para dispor sobre a operacionalização de medidas de capacitação e fiscalização na atuação dos estabelecimentos de entretenimento para o atendimento às mulheres que se encontrem em situação de risco em suas dependências.

§ 1º - O protocolo “Não se cale” consiste em um conjunto de medidas a serem implementadas pelos responsáveis dos estabelecimentos de entretenimento e profissionais que neles atuem, de que trata a referida Lei e o Decreto, e serão fiscalizadas administrativamente pelo Estado do Pará.

CAPÍTULO II - Objetivos e definições

Art. 2° - São objetivos do protocolo de atendimento às vítimas de violência nos estabelecimentos de entretenimento:

I - promover a alteração de padrões de comportamento social, para enfrentar percepções pejorativas, atitudes violentas e estereótipos negativos sobre as mulheres;

II - prevenir a ocorrência de violências por meio de ações educativas e de comunicação;

III - capacitar pessoas que atuem nos estabelecimentos de entretenimento para identificar e agir em situações de ameaça de violência e risco às mulheres;

IV – Propagar informações e conhecimentos para uma atuação ativa dos colaboradores diante de uma situação de violência real ou potencial contra as mulheres;

V - promover o acolhimento e encaminhamento adequado às vítimas, de acordo com cada situação.

Art. 3° - Para fins do disposto no Protocolo “não se cale”, considera-se:

I – importunação sexual: atos libidinosos sem violência ou grave ameaça, constrangimentos ou comportamentos insistentes e abusivos, praticados contra a vontade da vítima, de forma verbal ou física, que tenham caráter libidinoso ou sexual, e que lhe causem incômodo ou ofensa, independentemente de o agente possuir qualquer relação anterior com a vítima;

II – estabelecimento de entretenimento: empresa ou empresário que exerça atividades de bar, restaurante, casa noturna, boate, casa de eventos, local de eventos, organização de eventos, casa de shows, clubes ou atividade similar;

III – empregado/a e colaborador/a: todo aquele que exerça no estabelecimento qualquer atividade, permanente ou eventual, relacionada ao objeto social do estabelecimento e que esteja sob o comando da direção local;

IV - local reservado: qualquer espaço dentro do estabelecimento que possibilite o atendimento seguro da mulher ameaçada, vítima de violência ou em situação de risco, e que permita a discrição em relação ao agressor e a terceiros;

V - revitimização: ato, questionamento ou discurso que gere constrangimento indevido ou estigmatização na mulher ameaçada, vítima de violência ou em situação de risco, capaz de induzir sentimento de culpa pela violência sofrida;

VI - situação de risco: toda ação que exponha a mulher a um contexto de vulnerabilidade e que possa torná-la vítima de violência;

VII - violência contra a mulher: toda conduta que configure violência física, moral, patrimonial, psicológica ou sexual, de forma presencial ou virtual, em razão da sua condição de mulher;

VIII - violência física: qualquer conduta que ofenda a integridade física ou a saúde corporal da mulher;

IX - violência moral: qualquer conduta que configure calúnia, difamação ou injúria da mulher;

X - violência patrimonial: qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades;

XI - violência psicológica: qualquer conduta que cause dano emocional, e diminuição da autoestima, prejudique e perturbe, ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, seja por ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição, insulto, chantagem, violação de sua intimidade, ridicularização, exploração ou limitação do direito de ir e vir, ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação;

XII - violência sexual: qualquer conduta que constranja a mulher a presenciar, manter ou participar de qualquer forma de relação sexual não con- sentida.

CAPÍTULO III - Das Ações de Efetividade e Fluxos

Art. 4º - São obrigações dos estabelecimentos de entretenimento em relação ao objeto deste Decreto, e que servirão de requisitos a serem verificados pela fiscalização pública:

I - afixar aviso, sob a forma de cartaz físico ou eletrônico, que informe a sua disponibilidade para prestar auxílio às mulheres que se encontrem em situação de risco, preferencialmente nos banheiros feminino; e, em garantir de forma ostensiva meios de informar aos frequentadores que naquele local as diretrizes do Protocolo são cumpridas.

II – criar canais de whatsapp, formulários, ou outros códigos que sejam discretos para que as vítimas consigam acionar o atendimento interno por esses meios, e que deverão ser informados nos cartazes de que trata o inciso anterior;

III - promover anualmente a capacitação de seus funcionários sobre o Protocolo de que trata este Decreto;

IV – guardar algum espaço reservado em suas dependências para o atendimento das vítimas;

V - prestar auxílio à mulher que, em suas dependências, encontre-se em situação de ameaça, risco ou que seja vítima de violência.

§ 1° - O cartaz deverá ser afixado em local de fácil visualização e no interior de todos os banheiros destinados ou disponíveis às mulheres.

§ 2° - Na hipótese de adoção de cartaz exclusivamente eletrônico, a veiculação do aviso de que trata o “caput” deste Artigo deverá ser permanente, de forma não alternada com outro conteúdo.

§ 3º - Os modelos de cartazes serão disponibilizados em sítio eletrônico pela secretaria de estado das Mulheres, contendo informações de contato para acionar o sistema de segurança Pública especializado no atendimento de violências, e conterá espaço em branco que deverá ser preenchido por cada estabelecimento, onde serão informados os meios de acionamento dos seus funcionários – seja por códigos, qr code que direcione a formulários ou a números de contatos, ou outro meio hábil a cada realidade, e que permita a discrição, agilidade, e fácil comunicação, em observância ao Art. 7º, § 2º do Decreto Nº 3.643/2024.

Art. 5º - A capacitação para atendimento nos termos do Art. 6º do Decreto Nº 3.643/2024, observará:

I – a abrangência de todos os seus empregados e colaboradores, para que estejam habilitados a identificar e combater o assédio sexual praticado contra a mulher que trabalhe no local ou o frequente a qualquer título;

II – e deve manter, como ponto-focal, no mínimo, 01 (um) funcionário/a por turno de funcionamento, para auxiliar a mulher que esteja sob ameaça, em situação de risco ou sofra violência em suas dependências;

III – deve ainda haver cautela no sentido de desestimular o uso de critérios sexistas para ingresso no estabelecimento.

§ 1º - A capacitação de que trata o “caput” deste poderá ser disponibilizada em meio de acesso público pela secretária de estado das Mulheres, podendo ser especializada conforme os diversos públicos-alvo ou segmentos econômicos, e deverá abordar, no mínimo:

1. As formas de violências contra as mulheres e meios de identificação;

2. A identificação de validade do consentimento – especificação da vulnerabilidade etária e por embriaguez;

3. o estímulo à criação de códigos ou sinais de comunicação não verbal para agilizar o pedido de socorro pela vítima e sua forma de divulgação;

4. formas adequadas de atendimento em situação de risco e vulnerabilidade;

5. Canais de acesso à rede de atendimento, fluxos práticos, e noções básicas sobre políticas públicas de proteção à mulher;

6. a importância do armazenamento de documentos e de imagens gravadas pelo estabelecimento e sua disponibilização aos órgãos de segurança, nos termos da lei;

7. a importância do comprometimento de todos com o enfrentamento da violência contra a mulher;

8. formas de escuta sem revitimização;

§ 2º - Após a conclusão dos cursos serão gerados certificados, que deverão ser armazenados pelo estabelecimento e colocados à disposição da fiscalização, observada a periodicidade anual.

§ 3º - De forma complementar, a secretaria de estado das Mulheres poderá disponibilizar cartilhas em acesso público que informem de forma prática e acessível os fluxos de atendimentos cabíveis para os tipos de violência, e para isso poderá contar com o auxílio da rede de Órgãos de atendimento à Mulher.

§ 4º Em cada Município, as secretarias Municipais que detenham pasta de direitos para as mulheres poderão agir em colaboração na esfera local para padronização do fluxo de atendimento adaptada à sua realidade.

Art. 6° - Os estabelecimentos prestarão auxílio à mulher que, em suas dependências, encontre-se em situação de risco ou que seja vítima de violência.

§ 1° - Durante todo o período de funcionamento do estabelecimento deverá estar presente, no mínimo, um funcionário capacitado para prestar o auxílio de que trata o “caput” deste Artigo.

§ 2° - O atendimento da mulher em situação de risco ou vítima de violência deverá ocorrer em local seguro e reservado, afastado do agressor por ela apontado e de terceiros, e observar:

1. a priorização no socorro à vítima, inclusive com acionamento do serviço médico de urgência, se necessário;

2. o respeito à autonomia da vontade da vítima capaz;

3. o caráter humanizado e acolhedor do atendimento;

4. a não revitimização;

5. a presença de, ao menos, uma terceira pessoa, preferencialmente mulher, no recinto de atendimento;

6. a possibilidade de a vítima ser acompanhada também por pessoa por ela indicada, se assim o desejar.

§ 3° - O auxílio por parte do estabelecimento será prestado mediante a oferta de um acompanhante até o veículo ou outro meio de transporte indicado pela mulher, ou comunicação à polícia.

§ 4° - Nas ocorrências que envolvam estupro, estupro de vulnerável ou violação sexual mediante fraude, a vítima deverá ser imediatamente encaminhada ao serviço médico e ao registro de ocorrência policial, se necessário, respeitada a autonomia de sua vontade desde que a vítima seja capaz.

§ 5° - Na hipótese de a vítima ser criança ou adolescente, desacompanhada dos pais ou responsáveis, deverão ser acionados os órgãos de segurança, atendendo-se o disposto no Artigo 18 da Lei Federal N° 8.069, de 13 de julho de 1990 - estatuto da criança e do adolescente (eca).

Art. 7° - Para fins de comprovação dos atendimentos de que trata o Artigo 6° deste Decreto, o estabelecimento devem manter registros, preferencialmente eletrônicos, com a finalidade exclusiva de registrar as ocorrências e providências adotadas para cumprimento deste Decreto.

§ 1° - Para ser considerado elemento de prova pela autoridade fiscalizadora, o registro deverá conter, no mínimo, as seguintes informações:

a) data, hora e local dos fatos que identifique o tipo de violência sofrida;

b) identificação do noticiante, se houver;

c) identificação da vítima, ainda que por meios indiretos, e, sempre que possível o registro de sua idade e identificação racial;

d) identificação, ainda que por meios indiretos, do suposto agressor apontado pela vítima;

e) descrição dos fatos ocorridos com menção à forma de auxílio prestado pelo estabelecimento

f) informação sobre eventual recusa da vítima em aceitar o auxílio oferecido pelo estabelecimento ou seu encaminhamento ao serviço médico, colhendo, nessas hipóteses, sua assinatura;

g) identificação de testemunhas dos fatos, se possível;

h) identificação do funcionário que efetuou o registro. 

§ 2° - Consideram-se meios indiretos de identificação quaisquer informações que permitam distinguir minimamente os envolvidos, como qualquer dado eventualmente fornecido no ingresso no estabelecimento, número de cartão utilizado para pagamento, descrição física, dentre outras.

§ 3º - Tais registros também devem ser disponibilizados à conferência da fiscalização.

CAPÍTULO IV - Da forma de fiscalização e sanções aplicáveis

Art. 8º - A fiscalização administrativa dos estabelecimentos de lazer nos termos da Lei Nº 9.238/2021 e Decreto Estadual Nº 3.643/2024 ocorrerá a cargo da diretoria de Proteção e defesa do consumidor – PROCON/PA – vinculado à secretaria de estado de justiça, em colaboração técnica à Secretaria de Estado das Mulheres, que também poderá contar com o apoio do sistema estadual de segurança Pública.

Parágrafo único – Os dados obtidos através das fiscalizações realizadas pelos Órgãos descritos no Artigo anterior serão registrados e compartilhados para informação e armazenamento entre os mesmos, devendo cada um agir na sua respectiva competência, facilitando o monitoramento pela Secretaria de Estado das Mulheres.

Art. 9° - A constatação do descumprimento da Lei Estadual Nº 9.238, de 2021, e do Decreto Nº 3.643, de 2024, observadas as disposições desta Portaria conjunta, sujeita os infratores às sanções administrativas previstas na lei federal n° 8.078, de 11 de setembro de 1990 (código de defesa do consumidor), sem prejuízo das de natureza civil, penal e de outras definidas em normas específicas.

§ 1° - A fiscalização dos estabelecimentos enquadrados como microempresa ou empresa de pequeno porte deverá ser prioritariamente orientadora e de caráter educativo, nos termos do Artigo 55 da Lei Complementar Federal N° 123, de 14 de dezembro de 2006.

§ 2° - As sanções administrativas mencionadas no “caput” deste Artigo serão aplicadas pelo PROCON/PA, após regular processo administrativo no qual se assegure a ampla defesa e o contraditório.

§ 3º - A emissão de licenças de funcionamento pela diretoria de Polícia administrativa da Policia civil do estado (PC/PA) observará como boas práticas os termos da circular geral Nº 02/2022-dPa/Pc-Pa, que trata da emissão de alvará/licenças ante a exigência constante da Lei Estadual Nº 9.238/2021.

CAPÍTULO V - Das Ações Integradas

Art. 10 - Os órgãos, serviços e equipamentos públicos estaduais trabalharão de forma integrada e coordenada para garantir os cuidados necessários à mulher em risco, ameaça ou vítima de violência ou que se encontre em situação de risco nos estabelecimentos indicados neste Decreto, observadas as peculiaridades de cada localidade.

CAPÍTULO VI - Das medidas de incentivo ao enfrentamento da violência contra a mulher

SEÇÃO I - Do Selo “Estabelecimento Seguro”

Art. 11 - Fica instituído o selo “estabelecimento seguro” a ser concedido àqueles que desenvolvam ações de enfrentamento da violência contra a mulher e de estímulo à criação de ambientes mais seguros, de acordo com as medidas previstas neste Decreto, sem prejuízo das demais medidas internas que possam ser adotadas em cada estabelecimento.

§ 1º - O selo a que se refere o caput deste Artigo:

1. será outorgado anualmente pela secretaria de estado das Mulheres aos estabelecimentos que atendam ao disposto neste capítulo e em normas complementares editadas pela Pasta;

2. terá validade anual;

3. poderá ser utilizado pelos contemplados em campanhas publicitárias, embalagens e materiais gráficos e promocionais durante seu período de validade.

§ 2º - Em casos excepcionais, observadas as limitações administrativas, o prazo de renovação poderá ser estendido.

Art. 12 - O selo de que trata o Artigo 11 deste Decreto possuirá três categorias, representadas pelas cores bronze, prata e ouro, de acordo com a importância e complexidade da ação desenvolvida pelo estabelecimento.

Parágrafo único - ato da secretária de estado das Mulheres disciplinará o formato dos selos, a forma, o procedimento, os critérios e o meio para sua concessão.

SEÇÃO II - Do Prêmio “Estabelecimento Seguro”

Art. 13 - Fica instituído o Prêmio “estabelecimento seguro” a ser concedido anualmente aos estabelecimentos que tenham, pelo menos, recebido o selo “estabelecimento amigo da Mulher” na categoria ouro no período de 12 (doze) meses anteriores à abertura de edital de chamamento público
para outorga da premiação, e desenvolvam ações de destaque para garantir a segurança das mulheres em suas dependências.

Art. 14 - A Secretaria de Estado das Mulheres, para estes fins, poderá instituir no edital de chamamento público critérios adicionais de avaliação para outorga da premiação, e instituir comissão avaliadora.

CAPÍTULO VII - Disposições Finais e Transitórias

Art. 15 - A secretária de estado das Mulheres e a diretoria do PROCON/PA poderão expedir, no âmbito de suas competências, os atos necessários à execução do protocolo de atendimento e medidas de fiscalização.

Art. 16 - A capacitação de que trata o Artigo 5° desta Portaria deverá ser realizada nos seguintes prazos, contados a partir da publicação do ato da secretária de estado das Mulheres que disponibilizará as informações necessárias ao acesso à plataforma de treinamento:

I - para funcionários de bares, casas noturnas, clubes, boates e atividades similares: em até 100 (cem) dias;

II - para funcionários de restaurantes e atividades similares: em até 120 (cento e vinte) dias;

III - para funcionários de casa ou local de eventos, casa de espetáculos, empresas organizadoras de eventos e atividades similares: em até 150 (cento e cinquenta) dias.

Art. 17 – Esta Portaria entra em vigor na data de sua publicação.

Belém, 06 de fevereiro de 2025.

PAULA GOMES

Secretária de Estado das Mulheres

EVANDRO GARLA

Secretário de Estado de Justiça

UALAME MACHADO

Secretário de Estado de Segurança Pública e Defesa Social

WALTER RESENDE DE ALMEIDA

Delegado Geral da Polícia Civil