Consulta Nº 135 DE 26/10/2017


 


Lei nº 6.979/15. Aplicabilidade do diferimento na aquisição interna gás natural usado como insumo de processo produtivo. Gás Natural não se confunde com “Energia”. Contudo na operação descrita, a mercadoria adquirida configura “ material secundário”, com expressa inaplicabilidade do diferimento, segundo parte final do inciso V do art. 3º


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I – RELATÓRIO

Trata-se de consulta tributária acerca da possibilidade de aquisição de gás natural, utilizado como insumo em processo industrial, com o diferimento previsto no inciso V do art. 3º da Lei nº 6.979/15.

A consulente apresenta entendimento de que a vedação constante na parte final do citado inciso, especialmente quanto à impossibilidade de aplicação do diferimento na aquisição de energia, não se aplica às aquisições de gás natural, visto que este é uma mercadoria que pode ser usado para a produção de energia, não se confundindo com esta.

II – ANÁLISE E FUNDAMENTAÇÃO

II.1 - DOS ASPECTOS FORMAIS:

O processo encontra-se instruído com o DARJ referente ao recolhimento da Taxa de Serviços Estaduais (fls. 56), cópia dos Atos Constitutivos da consulente (fls. 25/50), bem como instrumento de mandato (fls. 51), conferindo poderes ao signatário da inicial.

Consta, ainda, declaração da AFE 12 informando que a consulente não se encontra sob ação fiscal, bem como pelo “atendimento por parte do contribuinte ao parágrafo 1º do artigo 1º e artigo 3º da Resolução 109/76 quanto aos requisitos nele enumerados” (fls. 64).

II.2 - DO MÉRITO:

O inciso V do art. 3º da Lei nº 6.979/15 prevê a aquisição interna, pelos optantes do Tratamento Tributário nele criado, de matéria-prima e outros insumos, quando destinado a processo industrial, com diferimento do ICMS incidente, ressalvado energia, água e materiais secundários.

Art. 3º - Fica concedido aos estabelecimentos de que trata o artigo 2º desta Lei diferimento do ICMS nas seguintes operações:

V - aquisição interna de matéria-prima, outros insumos e material de embalagem destinados ao seu processo industrial, exceto energia, água e materiais secundários, observado o disposto no artigo 4º desta Lei.

No caso apresentado, segundo exposto pela consulente, seu processo industrial faz uso de “gás natural” como insumo, questionando apenas acerca do enquadramento desta mercadoria no conceito de “energia”, excetuado do citado diferimento.

Conforme bem explicitado pelo Superintendente da ANP (fls. 53/54), gás natural não se confunde com energia, visto se tratar de mercadoria diversa que pode ser usada para a produção energética ou para outros fins (como por exemplo, como matéria-prima em indústrias petroquímicas).

Contudo, além de "energia", os materiais secundários também são expressamente excluídos do citado diferimento, conforme parte final do inciso V do art. 3º, supracitado, devendo, portanto, ser verificado se o gás natural adquirido se enquadra nesse conceito no caso concreto.

No caso em tela, apenas possui relevância o estudo das mercadorias utilizadas como insumos, pois engloba o gás natural objeto do questionamento.

No âmbito do ICMS, os insumos são tratados como "custo da mercadoria produzida" no inciso II do § 4º do artigo 13 da Lei Complementar Federal nº 87/96, reproduzido no inciso II do artigo 8º da Lei nº 2657/96.

II - o custo da mercadoria produzida, assim entendida a soma do custo da matéria-prima, material secundário, mão-de-obra e acondicionamento;

Assim, os insumos, para fins de ICMS, são divididos em: (a) matéria-prima; (b) material secundário; (c) mão-de-obra; e (d) acondicionamento.

Desta forma, podemos excluir, obviamente, os conceitos de mão-de-obra e de acondicionamento, pois o insumo "gás natural" não se enquadra como força do trabalho humano ou     como material para embalagem ou acondicionamento de produto.

Conforme disposto na literatura de contabilidade de custos, matéria-prima é definida como o bem, impressindível para a industrialização, se agrega fisicamente ao produto final.

Tal entendimento, inclusive, encontra amparo na no Parecer Normativo nº 10/75, editado por esta SUT, bem como na Portaria CAT 2/82, editada pela SEFAZ SP, que define como matéria-prima “toda a substância com que se fabrica alguma coisa e da qual é obrigatoriamente parte integrante”.

Conforme informado pela consulente, o gás natural será queimado para a produção de calor, a fim de possibilitar a fabricação do produto final. Ou seja, a referida mercadoria não integra fisicamente o produto final, nem é o principal insumo, motivo pelo qual não pode ser considerada matéria-prima.

Desta forma, por exclusão, conclui-se que, não sendo matéria-prima, mão-de-obra ou material de acondicionamento, o gás natural, na operação descrita, somente pode se enquadrar no conceito de material secundário.

Tal conclusão encontra, ainda, amparo no conceito de produtos de uso intermediário  utilizado pelo Superior Tribunal de Justiça, qual seja, “insumos que, apesar de integrarem o processo de industrialização, não integram o produto final, tampouco são consumidos de forma imediata e integral” (STJ, Primeira Turma, AgRg no REsp 139.996 SP, DJ 12-8-2002, p. 166).

Encontra, ainda, amparo no entendimento exarado pelo Supremo Tribunal Federal, que tem definido como produtos intermediários aqueles que “se consomem ou se inutilizam no processo de fabricação, como cadinho, lixas, feltros etc.” (STF, Primeira Turma, RE 79.601 RS, DJ 8-1-75, relator: Ministro Aliomar Baleeiro).

Por fim, deve-se ressaltar que tal entendimento está de acordo com as definições constantes no § 1º do art. 1º da Portaria SSER 35/13, que, embora não estar em vigor atualmente, deve ser utilizada para a busca do conceito de material secundário.

II - material secundário: o custo de todos os materiais e insumos consumidos direta e indiretamente na produção, inclusive energia elétrica;

Em derradeiro, cumpre ressaltar que, conforme expressa previsão na parte final do inciso V do art. 3º da Lei nº 6.979/15, a aquisição de material secundário não está abrangida pelo diferimento nele previsto, não sendo aplicável, portanto, ao gás natural adquirido no caso em tela.

III – CONCLUSÃO

Pelo exposto, conclui-se pela inaplicabilidade do diferimento previsto no inciso V do art. 3º da Lei nº 6.979/15 nas aquisições internas, por parte de optante pelo referido tratamento tributário, de gás natural, quando não agregar fisicamente o produto final do processo industrial, visto se tratar de material secundário, execepcionado na parte final do citado inciso.

C.C.J.T., em 11 de abril de 2025.