Consulta Nº 66 DE 28/06/2016


 


Sucessão Societária. Manutenção dos créditos de ICMS pelo estabelecimento sucessor.


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A Companhia Siderúrgica Nacional - CSN, em correspondência endereçada ao Secretário de Fazenda, apresentou alguns questionamentos acerca do direito ao crédito de ICMS.  Após dar forma processual, a Subsecretaria da Receita encaminhou o processo nº E-04/083/357/2015 a esta Superintendência de Tributação para análise. Todavia, o administrativo foi devolvido orientando o contribuinte a reapresentar o questionamento sob a forma de consulta tributária adequando-o às disposições do Capítulo VI do Decreto 2473, de 6 de março de 1979, em razão de as respostas às dúvidas apresentadas envolverem interpretação da legislação tributária.

Ocorre que o questionamento foi reapresentado no mesmo administrativo e, novamente, junto à Subsecretaria da Receita, contrariando o caput do art. 151 do Decreto nº 2.473/791, que determina sua apresentação na repartição fiscal de circunscrição do contribuinte. O local de apresentação é de fundamental importância tendo em vista que, de acordo com os incisos I e II do art. 3º da Resolução nº 109, de 3 de setembro de 19762, informações quanto a ação fiscal iniciada e não concluída junto ao consulente, bem como a existência de auto de infração cujo fundamento esteja direta ou indiretamente relacionado às dúvidas suscitadas ainda pendente de decisão final, são prestadas obrigatoriamente pela repartição fiscal de circunscrição do contribuinte.  Essas informações quando fornecidas pelo próprio contribuinte, como consta da fl. 10 do presente, são inócuas e não suprem a manifestação fiscal, estando em desacordo com o comando legislativo.

Ressalte-se, ainda, que o contribuinte Congonhas Minérios S.A. é o sujeito passivo da obrigação, sendo o legalmente habilitado a formular consulta tributária, nos termos do art. 150 do PAT, não sendo possível em um administrativo aberto em nome da CSN inserir questionamento apresentado por empresa diversa.

Em que pese todo o exposto, por razões de economia processual, e levando em consideração o fato de o restante da documentação estar em consonância com os demais dispositivos da Seção I do Capítulo VI do PAT, formalizamos o presente administrativo a fim de respondermos aos questionamentos apresentados, condicionando a ciência do parecer à inexistência de ação fiscal iniciada e não concluída junto ao consulente, bem como de auto de infração cujo fundamento esteja direta ou indiretamente relacionado às dúvidas suscitadas ainda pendente de decisão final.  Informações essas que devem ser atestadas pela repartição fiscal neste administrativo antes de intimar o contribuinte a tomar ciência da solução de consulta.

I – RELATÓRIO

A consulente relata que, “...com o intuito de segregar as operações de mineração, transporte ferroviário e portuário, a CSN criou a empresa Congonhas...”, com matriz no Estado de Minas Gerais e filial no município de Itaguaí, no Estado do Rio de Janeiro (fl..

Em 30 de novembro de 2015, o estabelecimento fluminense da CSN transferiu ativos para o estabelecimento da Congonhas Minérios, localizado em Itaguaí, neste Estado.  No Estado de Minas Gerais foi realizado o mesmo procedimento entre os estabelecimentos das 2 (duas) empresas localizados naquela UF.  Em decorrência dessas operações a CSN recebeu o equivalente em participação societária na empresa Congonhas Minérios.

A consulente procede em seu relato afirmando que “Não houve mudança de endereço, paralização ou alteração das atividades de nenhum dos estabelecimentos. A única alteração foi no nome da sociedade detentora dos estabelecimentos, posto que deixou de ser a Companhia Siderúrgica Nacional para ser a Congonhas Minérios S.A.”

Afirma que as atividades até então realizadas no estabelecimento fluminense da CSN, I.E. nº 84.637.114, a partir de 31 de dezembro de 2015, foram, nas palavras da consulente, “incorporadas” por seu estabelecimento, I.E. 78.903.449, e que ambos os estabelecimentos estão registrados no mesmo endereço (fl.8). 

À fl. 8, foi apresentado fluxograma com as seguintes informações:

CSN – “permanece com as atividades de siderurgia e com participação societária na empresa Congonhas Minérios. 

Congonhas Minérios – “assume as atividades de mineração através da Matriz em MG e Portuárias, através da filial em Itaguaí.”

O estabelecimento da CSN, filial Itaguaí, em 31/12/2015, era detentor de saldo credor decorrente de aquisições de insumos e de bens do ativo relacionados à sua atividade, com a transferência desses ativos para a Congonhas Minérios, que passou a exercer atividades antes executadas pela CSN, a consulente entende ser detentora do direito a esse saldo credor.

Adicionalmente, a consulente, à fl. 9, afirma que:

a) a alteração da denominação empresarial, ocorrida em função da aquisição do estabelecimento, manteve inalteradas as atividades exercidas, o que implica em sucessão dos direitos e obrigações previamente existentes, nos exatos termos do art. 133 do CTN, bem como, na manutenção de eventuais saldos credores, incluindo créditos decorrentes da aplicação do artigo 33 do § 7º da Lei nº 2.657/96;

b) o art. 16, do Livro I do RICMS/RJ positivou o princípio da autonomia dos estabelecimentos, segundo o qual os direitos e obrigações de natureza tributária estão diretamente atrelados ao estabelecimento, independentemente de sua titularidade;

c) a conferência do estabelecimento da CSN – Itaguaí ao capital da Congonhas resultou na transferência da titularidade do estabelecimento, sem implicar, com isso, solução de continuidade de suas atividades.  E que todos os ativos e passivos relativos ao referido estabelecimento foram mantidos pela empresa sucessora, logo os créditos de ICMS existentes na escrituração fiscal devem ser mantidos;

d) a Resolução SEFAZ nº 720/14, por não dispor de forma clara quanto a permissão da manutenção do crédito existente, está em desacordo com a própria legislação do Estado do Rio de Janeiro, sendo mais restritiva que o próprio Regulamento do ICMS, que prevê, em seu Livro VI, art. 43, a possibilidade de transferência dos livros fiscais no caso de aquisição de estabelecimento.

Isto posto, a Consulente requer a confirmação pela Superintendência de Tributação da procedência de seu entendimento no sentido de que devem permanecer passíveis de utilização, agora “...pelo estabelecimento detido pela Congonhas Minérios, todos os créditos de ICMS do estabelecimento previamente detido pela CSN, inclusive, os escriturados no livro registro de controle de créditos de ICMS do ativo permanente (CIAP) apurados anteriormente à operação societária descrita”.

O processo encontra-se instruído com cópias reprográficas que comprovam a habilitação do signatário da petição inicial (fls.12/13), bem como com DARJ referente ao recolhimento da taxa de serviços Estaduais (fls. 14/23).

II – ANÁLISE E FUNDAMENTAÇÃO

Preliminarmente, esclarecemos que o objetivo das soluções de consulta tributária é esclarecer questões objetivas formuladas pelos consulentes acerca da interpretação de dispositivos específicos da legislação tributária no âmbito da Secretaria de Fazenda do Estado do Rio de Janeiro, presumindo-se corretas as informações apresentadas pelos consulentes, sem questionar sua exatidão.  As soluções de consulta não convalidam informações, interpretações, ações ou omissões aduzidas na consulta.

Inicialmente, é importante ressaltar que a narração dos fatos é confusa, não deixando clara a operação societária efetivamente ocorrida.  A consulente ora relata que a empresa foi criada pela CSN, ora afirma que as atividades exercidas pela CSN foram incorporadas pela Congonhas e mais adiante afirma ter adquirido o estabelecimento.  Declara também que o ocorrido se restringe a mudança da indicação da sociedade detentora dos ativos, que não mais pertencem à Companhia Siderúrgica Nacional sendo atualmente propriedade da Congonhas Minérios S.A.

Considerando que não cabe a esta Superintendência verificar a exatidão das afirmações do contribuinte e tampouco confirmar a ocorrência dos fatos narrados, mas tão somente responder em tese as dúvidas apresentadas, passamos a analisar a legislação que trata da responsabilidade tributária por sucessão.

O Capítulo V do CTN dispõe sobre a responsabilidade tributária e em sua Seção II, trata da responsabilidade dos sucessores, destacando-se no presente caso a redação dos artigos 132 e 133:

“Art. 132. A pessoa jurídica de direito privado que resultar de fusão, transformação ou incorporação de outra ou em outra é responsável pelos tributos devidos até à data do ato pelas pessoas jurídicas de direito privado fusionadas, transformadas ou incorporadas.

Parágrafo único. O disposto neste artigo aplica-se aos casos de extinção de pessoas jurídicas de direito privado, quando a exploração da respectiva atividade seja continuada por qualquer sócio remanescente, ou seu espólio, sob a mesma ou outra razão social, ou sob firma individual.

Art. 133. A pessoa natural ou jurídica de direito privado que adquirir de outra, por qualquer título, fundo de comércio ou estabelecimento comercial, industrial ou profissional, e continuar a respectiva exploração, sob a mesma ou outra razão social ou sob firma ou nome individual, responde pelos tributos, relativos ao fundo ou estabelecimento adquirido, devidos até à data do ato:

I - integralmente, se o alienante cessar a exploração do comércio, indústria ou atividade;

II - subsidiariamente com o alienante, se este prosseguir na exploração ou iniciar dentro de seis meses a contar da data da alienação, nova atividade no mesmo ou em outro ramo de comércio, indústria ou profissão.” (grifos nossos)

O artigo 132 do CTN diz respeito à sucessão societária nas hipóteses de fusão, cisão e incorporação, reorganizações societárias com disciplina e procedimento específicos na Lei das Sociedades Anônimas, Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976, Capítulo XVIII, artigos 223 a 234 e no Código Civil, Capítulo X, artigos 1113 a 1122.  Não havendo dúvidas nessas situações quanto à responsabilidade do sucessor, tanto no que se refere aos bens e direitos quanto às obrigações.

Já o artigo 133 do CTN, diz respeito à sucessão empresarial ou trespasse.  Nesse caso, ocorrendo a aquisição do estabelecimento, aqui entendido como uma universalidade de bens, direitos e obrigações, o adquirente responderá pelos tributos devidos pelo estabelecimento adquirido, integralmente ou subsidiariamente, conforme cesse ou prossiga na exploração da atividade.

Para melhor compreensão do dispositivo supramencionado transcrevemos lição de Amaro (2014, p. 350): 

“O adquirente (sociedade ou firma individual) responde, pois, pelos tributos relativos ao estabelecimento adquirido, se o alienante cessar a exploração da atividade que vinha executando e não passar a explorar outra atividade. Na hipótese, afirma o Código que a responsabilidade do adquirente é integral. O que, na verdade, o Código quis dizer é que, nesse caso, o adquirente responde sozinho, ou seja, não há obrigação do alienante. Mas, se o alienante prossegue a exploração da atividade que desenvolvia no estabelecimento alienado, ou passa a explorar outra, dentro de seis meses contados da data da alienação, a responsabilidade do adquirente é meramente subsidiária, permanecendo, pois, como principal obrigado o alienante.

O dispositivo busca evitar que, na venda de estabelecimento, o alienante se livre do patrimônio que poderia dar respaldo a suas obrigações tributárias. Se o alienante continua em atividade, ou a reinicia, presume-se que mantenha a capacidade de pagar suas obrigações tributárias.  Caso, apesar disso, não a mantenha, e na medida em que não a mantenha, opera a responsabilidade subsidiária do adquirente pelos tributos gerados pela exploração do estabelecimento sob gestão do alienante.”( AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro. 20ª ed. São Pulo: Saraiva, 2014, grifos do autor)

Ainda na esfera federal, o Convênio SNº/10, de 15 de dezembro de 1970, que estabelece normas gerais acerca de obrigações acessórias, em seu art. 69, regulamenta o disposto nos artigos 132 e 133 do Código Tributário Nacional, nos seguintes termos:

“Art. 69. Nos casos de fusão, incorporação, transformação ou aquisição, o novo titular do estabelecimento deverá transferir, para o seu nome, por intermédio da repartição competente do Fisco estadual, no prazo de 30 (trinta) dias da data da ocorrência, os livros fiscais em uso, assumindo a responsabilidade pela sua guarda, conservação e exibição ao Fisco.

Parágrafo único. A repartição competente do Fisco estadual poderá autorizar a adoção de livros novos em substituição aos anteriormente em uso.” (grifos nossos)

Já o Livro VI do Regulamento do ICMS, aprovado pelo Decreto nº 27.427, de 17 de novembro de 2000, (RICMS/00), que disciplina as obrigações acessórias, em seu artigo 43, transcrito abaixo, também regula a matéria de forma similar ao convênio supracitado, embora desatualizado no que diz respeito a possibilidade de dar continuidade a escrituração nos livros fiscais em uso ou mesmo de utilizar os documentos fiscais remanescentes tendo em vista a obrigatoriedade de adoção de documentos fiscais eletrônicos e da escrituração fiscal digital pelos contribuintes do ICMS.  

“Art. 43. Nos casos de fusão, cisão, incorporação, transformação ou aquisição, bem como nos casos de transmissão a herdeiro ou legatário, o novo titular do estabelecimento deverá transferir para o seu nome, por intermédio da repartição fiscal competente, no prazo de 30 (trinta) dias, contados da data da ocorrência, os livros fiscais em uso, assumindo a responsabilidade por sua guarda, conservação e exibição ao Fisco.

§ 1.º Nas hipóteses deste artigo, salvo disposição em contrário, será permitida a utilização dos documentos fiscais remanescentes, mediante a aposição de carimbo com o novo nome empresarial ou o novo endereço, conforme o caso.

§ 2.º O novo titular assumirá, também, a responsabilidade pela guarda, conservação e exibição ao Fisco dos livros fiscais já encerrados pertencentes ao estabelecimento.

§ 3.º Nas hipóteses deste artigo, a critério da repartição fiscal competente, pode ser autorizada a adoção de livros novos em substituição aos anteriormente em uso.

§ 4.º Relativamente a documentos e arquivos eletrônicos, inclusive a EFD ICMS/IPI, além da responsabilidade pela guarda, o contribuinte deverá observar as disposições específicas concernentes a esses documentos e arquivos.” (grifos nossos)

É certo que, nos casos a que se refere o caput do art. 43 do Livro VI do RICMS/00, tendo em vista as soluções tecnológicas em uso para emissão de documentos fiscais e escrituração fiscal e ainda a nova redação do Anexo I, da Parte II, da Resolução SEFAZ nº 720/14, dada pela Resolução SEFAZ n.º 994/2016, que dispõe sobre o Cadastro de Contribuintes do ICMS, determinando a obrigatoriedade de  nova inscrição estadual para os estabelecimentos da empresa sucessora, resultantes do processo de fusão, incorporação ou cisão, torna-se necessária a alteração da legislação, em especial da Resolução SEFAZ nº 720/14, para operacionalizar a transferência de mercadorias em estoque, bens do ativo e manutenção dos créditos pelo estabelecimento sucessor.

Dessa forma, a configuração das hipóteses de sucessão societária previstas nos dispositivos supracitados implica na assunção, pelo estabelecimento sucessor, dos deveres e obrigações do estabelecimento fusionado, cindido, incorporado, transformado ou adquirido, garantindo-se assim a manutenção dos direitos (créditos).    

III – RESPOSTA

Pelo exposto, é entendimento desta Superintendência que nos casos de fusão, cisão, incorporação, transformação ou aquisição de estabelecimento, sendo estabelecimento entendido como uma universalidade de bens, direitos ou obrigações e não apenas o ativo ou conjunto de ativos, é permitido ao estabelecimento sucessor a manutenção dos créditos detidos anteriormente pelo estabelecimento fusionado, cindido, incorporado, transformado ou adquirido, nos termos do art. 43 do Livro VI do Regulamento do ICMS, aprovado pelo Decreto nº 27.427, de 17 de novembro de 2000, (RICMS/00).

CCJT, em 28 de junho de 2016