Publicado no DOE - ES em 27 jan 2023
ICMS – compete/es – art. 5º da lei nº 10.568/16 – art. 530-l-f do RICMS/ES – indústria metalmecânica – aplicabilidade 1. As operações de desbobinamento, endireitamento e corte de vergalhão enquadram-se no conceito de industrialização, de forma que a saída dos produtos resultantes (ncm 7213.10.00 e ncm 7214.20.00) pode ser beneficiada pela redução da base de cálculo prevista no art. 5º, i, alínea “a”, da lei nº 10.568/16.
1. RELATÓRIO
Trata-se de consulta sobre interpretação e aplicação das regras relativas ao Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação (ICMS) no Estado do Espírito Santo.
A consulente é pessoa jurídica de direito privado estabelecida no Estado do Espírito Santo e opera sob o CNAE 2599-3/99 – Fabricação de estrutura metálica. Além disso, informa que está inscrita no Contrato de Competitividade da Indústria Metalmecânica. Posto isso, questiona se pode aplicar o benefício de redução de base de cálculo previsto no art. 5º, I, alínea “a” aos produtos classificados na NCM 7213.10.00 (fio-máquina de ferro ou aço não ligado, dentado, com nervura, sulco ou relevo, obtidos durante a laminagem) e na NCM 7214.20.00 (barras de ferro ou aço não ligado, simplesmente forjadas, laminadas, estiradas ou extrudadas, a quente, ..., dentadas, com nervuras, sulcos ou relevos, obtidos durante a laminagem, ou torcidas após laminagem).
Para subsidiar a análise, a consulente detalha o processo produtivo dos dois tipos de produtos. O processo é denominado desbobinamento de vergalhão com corte em medidas variáveis e é descrito pela consulente da seguinte forma:
Na aquisição, o vergalhão vem em bobina, sendo colocada em uma desbobinadeira, que possui o objetivo de desenrolar. Em seguida, passa por uma endireitadeira para colocar o produto em forma reta, mudando assim a apresentação do produto. Em seguida, recebe cortes em medidas diferentes de acordo com a necessidade de utilização do cliente. (g. n.)
Portanto, o processo produtivo pode ser resumido nas etapas de desbobinamento, endireitamento e corte do vergalhão. Os produtos resultantes desse processo são classificados na NCM 7213.10.00 e na NCM 7214.20.00.
Posto isso, questiona:
1- O processo de desbobinamento de vergalhão, conforme descrito, atende aos requisitos do artigo 5º, inciso I, alínea “a” da Lei 10.568/16, para que seja efetuada a redução de base de cálculo nas operações internas, de forma que a carga tributária efetiva resulte no percentual de sete por cento?
Por fim, declara que não se encontra sob ação fiscal relativamente ao objeto da consulta, nos termos do art. 808 c/c art. 845, III, ambos do RICMS/ES.
É o breve exame dos fatos.
2. APRECIAÇÃO
2.1 PRELIMINAR
Preliminarmente, constata-se que se encontram satisfeitas as exigências previstas nos artigos 842 e 845 do RICMS/ES, aprovado pelo Decreto nº 1.090-R, de 2002. Desta feita, cabe esclarecer que este parecer produzirá os efeitos previstos na legislação em vigor.
2.2 MÉRITO
O objeto da presente consulta é o benefício de que trata o art. 5º, I, alínea “a”, da Lei nº 10.568/16, regulamentado pelo art. 530-L-F, I, do RICMS/ES, como mostrado abaixo:
Art. 530-L-F. São concedidos os seguintes benefícios à indústria metalmecânica (Lei nº 10.568/16):
I – redução da base de cálculo, nas saídas internas de produtos não mencionados nos Anexos I e II do Convênio ICMS 52/91, de forma que a carga tributária efetiva resulte no percentual de sete por cento, devendo os créditos relativos às aquisições destes produtos ou dos insumos utilizados para a sua fabricação ser limitados aopercentual de sete por cento, na proporção destas saídas em relação às saídas totais; (g. n.)
Trata-se, portanto, de benefício concedido especificamente à indústria metalmecânica, conforme a literalidade do caput do art. 530-L-F do RICMS/ES. Para que esse dispositivo seja interpretado e aplicado, é importante buscar o tratamento normativo sobre o tema.
O art. 111 do Código Tributário Nacional (CTN) determina que:
Art. 111. Interpreta-se literalmente a legislação tributária que disponha sobre:
I – suspensão ou exclusão do crédito tributário;
III – dispensa do cumprimento de obrigações tributárias acessórias. (g. n.)
Também sobre o tema, afirma o Parecer Informativo nº 009/2021:
O mesmo critério [interpretação literal] pode ser aplicado aos benefícios fiscais, que seriam uma espécie de renúncia de receitas, conceito abrangente que inclui anistia, remissão, subsídio, crédito presumido, concessão de isenção em caráter não geral, alteração de alíquota ou modificação de base de cálculo que implique redução discriminada de tributos ou contribuições, e outros benefícios que correspondam a tratamento diferenciado, conforme art. 14 da Lei Complementar 101/2000.
A jurisprudência dos tribunais superiores é bastante clara a esse respeito, tendo o Superior Tribunal de Justiça afirmado:
TRIBUTÁRIO. BENEFÍCIO FISCAL. REDUÇÃO DE ALÍQUOTA. ART. 1º, XIV, DA LEI N. 10.925/2004. INTERPRETAÇÃO RESTRITIVA.
1. As disposições tributárias que concedem benefícios fiscais demandam interpretação literal, a teor do disposto no art. 111 do CTN.
2. O art. 1º, XIV, da Lei n. 10.925/2004 reduz à alíquota zero de PIS e COFINS incidentes na importação e sobre a receita bruta de venda no mercado interno de farinha de trigo classificada no código 1101.00.10 da TIPI, o que restringe o benefício apenas ao produto especificamente enquadrado no indigitado código classificatório.
3. A farinha de rosca não pode ser enquadrada no apontado código, pois as Notas Explicativas do Sistema Harmonizado (NESH), no Capítulo 11, ao explicitar as Considerações Gerais, apenas estabelecem que a farinha de rosca devem submeter-se à posição 1101 (Farinhas de trigo ou de mistura de trigo com centeio) para fins classificatórios, mas em nada a equiparam à farinha de trigo prevista no código 1101.00.10.
4. Ou seja, a farinha de rosca enquadra-se na posição 11.01, mas não se pode deduzir deste fato que sua classificação seja no específico código 1101.00.10, o que afasta a pretensão recursal da parte de beneficiar-se da alíquota zero, porquanto inviável a interpretação extensiva almejada.
Recurso especial improvido.
(REsp 1410259/PR, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 01/10/2015, DJe 09/10/2015) (grifo nosso) No mesmo sentido o Supremo Tribunal Federal, quando afirma que nem mesmo o Poder Judiciário pode estender o benefício fiscal sem previsão legal específica, devendo a interpretação ser literal, conforme se verifica nos julgados abaixo:
Ementa: CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE IMPORTAÇÃO. PNEUS. BENEFÍCIO FISCAL. REDUÇÃO DE 40% DO VALOR DEVIDO NAS OPERAÇÕES REALIZADAS POR MONTADORAS. PEDIDO DE EXTENSÃO A EMPRESA DA ÁREA DE REPOSIÇÃO DE PNEUMÁTICOS POR QUEBRA DA ISONOMIA. IMPOSSIBILIDADE. LEI FEDERAL 10.182/2001. CONSTITUIÇÃO FEDERAL (ARTS. 37 E 150, II).
CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL (ART. 111). Sob o pretexto de tornar efetivo o princípio da isonomia tributária, não pode o Poder Judiciário estender benefício fiscal sem que haja previsão legal específica. No caso em exame, a eventual conclusão pela inconstitucionalidade do critério que se entende indevidamente restritivo conduziria à inaplicabilidade integral do benefício fiscal.
A extensão do benefício àqueles que não foram expressamente contemplados não poderia ser utilizada para restaurar a igualdade de condições tida por desequilibrada. Precedentes. Recurso extraordinário provido. (RE 405579, Relator(a): JOAQUIM BARBOSA, Tribunal Pleno, julgado em 01/12/2010, DJe-149 DIVULG 03-08-2011 PUBLIC 04-08-2011 EMENT VOL- 02559-02 PP-00144 RTJ VOL-00224-01 PP-00560) (grifo nosso)
APELAÇÃO. TRIBUTÁRIO.
PREFACIAL DE NULIDADE DA SENTENÇA.
INDEFERIMENTO DO PEDIDO DE PROVA PERICIAL.
QUESTÃO EMINENTEMENTE DE DIREITO.
PROGRAMAS DE PARCELAMENTO.
ARTIGOS 111 E 155-A DO CTN. INTERPRETAÇÃO RESTRITA DOS BENEFÍCIOS FISCAIS.
DENÚNCIA ESPONTÂNEA NÃO CARACTERIZADA. VERBA HONORÁRIA. REDUÇÃO.
NÃO CABIMENTO. (...) Nos termos do art. 111 do CTN, a interpretação dos benefícios fiscais deve ser estrita, impedindo, desse modo, a aplicação analógica das regras previstas na Medida Provisória nº 38/02, na Lei nº 9.964/00, que institui o REFIS, e na Lei n. 11.101/05, não estando o Poder Judiciário autorizado a modificar ou estender os efeitos das leis concessivas, vedada a sua atuação como legislador positivo. (g.n.) (...) (STF – ARE: 755314 RS, Relator: Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Data de Julgamento: 01/08/2013, Data de Publicação: DJe-150 DIVULG 02/08/2013 PUBLIC 05/08/2013)
Portanto, o benefício fiscal em análise, na forma de redução da base de cálculo (que pode ser entendida como uma isenção parcial ou exclusão parcial do crédito tributário), deve ser interpretado literalmente, de forma a atender à regra do art. 111 do CTN.
Conforme exposto anteriormente, o benefício é aplicável à indústria metalmecânica. Resta-nos, agora, interpretar esse conceito para concluir se a atividade desenvolvida pela consulente pode ser enquadrada como atividade industrial.
O Parecer Informativo nº 009/2021 também tratou do tema:
Partindo dessa noção, o ordenamento jurídico brasileiro regula tal temática por meio do Regulamento do Imposto sobre Produtos Industrializados
(Decreto 7212/2010 – RIPI), que no seu art. 4º caracteriza industrialização como qualquer operação que modifique a natureza, o funcionamento, o acabamento, a apresentação ou a finalidade do produto, ou o aperfeiçoe para consumo, exemplificando alguns desses processos nos incisos do dispositivo.
Nesse cenário, considerando que a legislação capixaba não possui definição própria dos conceitos de estabelecimentos industrial e atacadista, é possível aproveitar os conceitos contidos no RIPI. De acordo com tal diploma normativo, o industrial é aquele que executa qualquer das operações referidas no art. 4º, de que resulte produto tributado, ainda que de alíquota zero ou isento, já o atacadista é aquele que efetua vendas de bens de produção, exceto a particulares em quantidade que não exceda a normalmente destinada ao seu próprio uso; de bens de consumo, em quantidade superior àquela normalmente destinada a uso próprio do adquirente; e que pratique a revenda de mercadoria. (g. n.)
O art. 4º do RIPI, referenciado acima, determina que:
Art. 4º Caracteriza industrialização qualquer operação que modifique a natureza, o funcionamento, o acabamento, a apresentação ou a finalidade do produto, ou o aperfeiçoe para consumo, tal como:
I - a que, exercida sobre matérias-primas ou produtos intermediários, importe na obtenção de espécie nova (transformação);
II - a que importe em modificar, aperfeiçoar ou, de qualquer forma, alterar o funcionamento, a utilização, o acabamento ou a aparência do produto (beneficiamento);
III - a que consista na reunião de produtos, peças ou partes e de que resulte um novo produto ou unidade autônoma, ainda que sob a mesma classificação fiscal (montagem);
IV - a que importe em alterar a apresentação do produto, pela colocação da embalagem, ainda que em substituição da original, salvo quando a embalagem colocada se destine apenas ao transporte da mercadoria (acondicionamento ou reacondicionamento); ou
V - a que, exercida sobre produto usado ou parte remanescente de produto deteriorado ou inutilizado, renove ou restaure o produto para utilização (renovação ou recondicionamento).
Parágrafo único. São irrelevantes, para caracterizar a operação como industrialização, o processo utilizado para obtenção do produto e a localização e condições das instalações ou equipamentos empregados. (g. n.)
Especificamente sobre as operações realizadas pela consulente (desbobinamento, endireitamento e corte), existe o Ato Declaratório Interpretativo RFB nº 1, de 05 de março de 20151, que afirma, em seu art. 2º:
Art. 2º A operação de desbobinamento, endireitamento, corte e dobra dos rolos de ferro (aço) em que o produto final seja um artefato de ferro, bem como, a confecção de carcaça de ferro para concreto armado, configura industrialização (beneficiamento), e, consequentemente, aplicam-se à receita bruta decorrente dessa operação os percentuais de 8% (oito por cento) e 12% (doze por cento), para determinação da base de cálculo do IRPJ e da CSLL, respectivamente, para as pessoas jurídicas tributadas com base no lucro presumido. (g. n.)
Portanto, utilizando os conceitos trazidos pelo RIPI e a intepretação do ADI RFB nº 1, de 2015, é possível concluir que as atividades desenvolvidas pela consulente na produção das mercadorias de NCM 7213.10.00 e NCM 7214.20.00 são enquadradas no conceito de industrialização (modalidade “beneficiamento”), de forma que a consulente pode se utilizar do benefício de redução da base de cálculo previsto no art. 5º, I, alínea “a”, da Lei nº 10.568/16 para esses produtos.
Em última análise, é importante verificar que os produtos de NCM 7213.10.00 e NCM 7214.20.00 não são mencionados nos Anexos I e II do Convênio ICMS 52/91 (requisito explícito na alínea “a”, do art. 5º, I, da Lei nº 10.568/16), apenas para confirmar o entendimento de que é aplicável o benefício.
3. CONCLUSÃO
Feitas essas considerações, passemos ao exame das indagações da consulente:
1) O processo de desbobinamento de vergalhão, conforme descrito, atende aos requisitos do artigo 5º, inciso I, alínea “a” da Lei 10.568/16, para que seja efetuada a redução de base de cálculo nas operações internas, de forma que a carga tributária efetiva resulte no percentual de sete por cento?
Resposta: Sim. O processo de desbobinamento de vergalhão, composto pelas etapas de desbobinamento, endireitamento e corte, atende aos requisitos do art. 5º, I, alínea “a”. O benefício trazido por esse dispositivo é aplicável aos produtos de NCM 7213.10.00 e NCM 7214.20.00.
Nos termos do art. 849 do RICMS/ES, a consulente deve adotar o entendimento contido nesta solução de consulta dentro do prazo de dez dias, contados do seu recebimento.
É o parecer.
Vitória/ES, 27 de janeiro de 2023.
(documento assinado digitalmente)
ROGÉRIO BARBOSA VIANA LIMA
Auditor Fiscal Da Receita Estadual
De acordo.
(documento assinado digitalmente)
ALEXANDRE DE CASTRO PEREIRA
Supervisor de Orientação e Estudos Tributários – SUJUP/GETRI
Aprovo o Parecer Consultivo nº 043/2023. Comunique-se ao interessado e, conforme o disposto no art. 857 do RICMS/ES, remeta-se uma cópia à Gerência Fiscal para as providências cabíveis.
(documento assinado digitalmente)
HUDSON DE SOUZA CARVALHO
Gerente Tributário