29 out 2010 - Trabalho / Previdência
A Europa está fazendo a coisa correta ao enfrentar a questão da aposentadoria, tendo de pagar por essa postura um alto preço político em meio à crise financeira da qual ainda não se libertou.
A França decidiu votar a reforma simplesmente porque não podia mais adiá-la.
Sua população envelheceu e tem um bom nível de renda.
A proposta da reforma previdenciária é razoável (basicamente para elevar de 60 para 62 anos a idade-limite), mas o francês não resiste ao desejo de ir às ruas protestar e fazer barulho.
Na Alemanha, a idade mínima para aposentadoria já é de 67 anos.
Os alemães têm melhor situação financeira e nunca se deixaram enganar com as regras do acordo de Maastricht (basta fazer 3% de superávit primário e o resto se ajeita...).
Os ingleses, menos barulhentos, estão fazendo o ajuste com um contundente corte de benefícios no Orçamento apresentado semana passada.
O fato de, mesmo fazendo os ajustes em condições razoáveis, as reformas previdenciárias produzirem tanto barulho devia servir de exemplo para o Brasil porque nós temos de enfrentar esse problema num futuro muito próximo.
E vamos fazê-lo sem que a população tenha atingido riqueza semelhante à da europeia.
Significa que precisamos começar já a planejar, discutir, votar e pôr em prática o que a sociedade decidir.
A população brasileira está envelhecendo muito depressa e a expectativa de vida ao nascer tem crescido bastante.
Diante desse quadro, precisamos acompanhar a situação do envelhecimento para poder financiar a aposentadoria desses idosos.
Temos hoje praticamente 7% da população com mais de 65 anos e estamos gastando 13% do Produto Interno Bruto (PIB) com Previdência.
Daqui a 15 anos vamos ter 14% da população brasileira com mais de 65 anos.
Se projetarmos o avanço demográfico, há redução da taxa de fertilidade da mulher brasileira, produto da educação, da melhora da saúde e da sua participação no mercado de trabalho.
Atualmente a taxa de crescimento está abaixo de 1%, quer dizer, a população brasileira vai começar a diminuir a partir de 2035 ou 2040. Vamos passar por um máximo -220 a 230 milhões de habitantes na terceira década deste século- e depois começar a diminuir.
É importante entender que vamos ter uma redução do número de pessoas de até 15 anos e um grande aumento do número de pessoas com mais de 65 anos.
Isso significa que aquelas pessoas de 15 a 65 anos vão ter de trabalhar para sustentar os que (ainda) vão continuar trabalhando e aqueles que já trabalharam.
A produtividade do trabalho naquela faixa (15 a 65 anos) precisa crescer muito.
Cada trabalhador precisará contribuir para sustentar um menor de idade e um velhinho a mais.
Isso mostra que não podemos continuar adiando a correção dos sistemas de seguridade social. Os problemas são tanto em função de quantidades como qualitativos.
Por exemplo, é muito grande (e continua a crescer) a diferença entre os benefícios pagos ao aposentado do serviço público e aquilo que é destinado aos trabalhadores do setor privado.
Um país decente não pode continuar a admitir divergência de tal natureza.
O déficit da previdência este ano é de 90 bilhões de reais.
Metade dessa despesa é para pagar a previdência dos servidores públicos, que mantém 1 milhão de aposentados; a outra metade é do setor privado, que tem 28 milhões de beneficiados.
É uma situação de iniquidade que não se sustentará por muito tempo, por mais que a burocracia e o Congresso em Brasília se esforcem para adiar o necessário debate da reforma previdenciária.
Fonte: DCI / SP