Fantasma da CPMF volta a rondar o contribuinte


17 nov 2010 - IR / Contribuições

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Embora não confirme sua volta, a presidente eleita Dilma Rousseff disse que há uma pressão dos governadores para reeditar a contribuição

Após as principais organizações empresariais do setor de comércio, serviços, indústria, setor da construção civil e agricultura se manifestarem contrárias ao retorno da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), o futuro governo está pensando com mais cuidado sobre o retorno do tributo. No início de novembro, em uma de suas primeiras entrevistas como presidente eleita, Dilma Rousseff afirmou não ter intenções de enviar ao Congresso Nacional qualquer projeto que criasse uma nova CPMF, mas admitiu haver um movimento dos governadores em favor da retomada do imposto.

Com a mobilização das categorias, líderes governistas no Congresso recuaram e descartaram recriação da CPMF. Mesmo assim, o tema apresenta-se como controverso no Senado, sendo analisado no contexto de uma possível reforma tributária ou mediante a substituição por outro tributo já existente. A oposição promete brigar, inclusive reeditando o movimento "Xô CPMF". Agora, a principal justificativa para a introdução de um novo imposto é a necessidade de mais recursos para a saúde. O ministro do Planejamento, Orçamento e Gestão, Paulo Bernardo, enfatizou que em 2007 já havia um acordo, inclusive com governadores e prefeitos, para aumentar em R$ 24 bilhões os repasses para o setor. Mas o governo foi derrotado no Congresso Nacional com a perda da contribuição.

Já o Ministro da Saúde, José Gomes Temporão, calcula que é necessário arrecadar mais, entre R$ 50 bilhões e R$ 60 bilhões. "Existem algumas vozes que vêm com a velha ladainha de que a saúde precisa de mais gestão. Quem fala isso fala de cima de seus magníficos planos de saúde e acha que o povo tem de ter uma saúde de segunda categoria", argumenta. Para o ministro, o debate sobre uma alternativa ao financiamento da saúde é positivo e, no caso de criação de um novo tributo, o Congresso precisa estabelecer claramente que os recursos serão usados apenas na saúde.

Contadores estão prontos para encarar desafios

Mesmo não sendo bem recebida pelos contribuintes, a possível da volta da CPMF encontrará respaldo no trabalho da classe contábil. "Os contadores estão preparados para encarar o desafio. Como profissional, posso afirmar que os clientes vão ficar com a contabilidade em dia", afirma o contador e ouvidor do Conselho Regional de Contabilidade do Rio Grande do Sul, Cláudio Morais Machado.

O especialista entende que, se há um efeito positivo na medida, é o de maior controle da movimentação financeira, algo que ocorre por causa da possibilidade de identificação dos sonegadores. Por outro lado, ele alega que, no lugar da nova contribuição, poderia haver gestão efetiva e mais controle. "No passado, vimos que a CPMF tinha grandes arrecadações, e esses valores eram desviados das funções da saúde. O que precisamos é de uma gestão adequada do encaminhamento dos tributos", afirma.

Pesquisa comprova desvios e divide opiniões sobre o imposto

Uma pesquisa realizada pela Fundação Getulio Vargas (FGV) entre 2001 e 2006 retratou que o dinheiro arrecadado durante a sua vigência da CPMF não foi usado necessariamente na área de saúde e Previdência Social, como determinava a lei. Os dados levantados demonstraram que, em média, 23,6% dos valores arrecadados com este imposto, já descontados os 20% do montante da desvinculação das receitas da União (DRU), ficaram nos cofres públicos por falta de autorização legal no orçamento, sugerindo, em função da própria limitação do sistema, formação de superávit primário ou excesso de arrecadação.

Professor da FGV, Eurico de Santi é a favor do retorno do imposto. Ele explica que o objetivo seria cobrar 0,1% sobre toda a movimentação da União, estados e municípios. "O dinheiro seria usado em um fundo de harmonização federativa para investimentos de infraestrutura", explica. Segundo ele, a intenção é dar transparência às contas públicas, possibilitando ao governo maior controle sobre a movimentação das entidades públicas.

Já para o presidente do Instituto Nacional dos Estudos Jurídicos e Empresariais (Inej), Luiz Alberto Pereira Filho, a volta da contribuição neste momento traz à tona o risco de repetir a mesma situação do passado. Segundo ele, se o valor arrecadado tivesse sido usado de forma correta, não seria necessária uma nova CPMF. "A ideia é boa, mas sua forma de aplicação é completamente equivocada", acredita.

Mobilização empresarial está articulada contra novos tributos

Após uma campanha eleitoral repleta de promessas sobre o tema da reforma tributária, a notícia da criação de um novo imposto foi recebida com surpresa pela Federação do Comércio de Bens e de Serviços no Estado do Rio Grande do Sul (Fecomércio/RS). "Nossa carga tributária já é muito pesada. Se houve um aumento acima da arrecadação, por que colocar mais um imposto que venha comprometer a cadeia produtiva?", questiona o presidente da Fecomércio, Zildo De Marchi. Segundo ele, seria um erro do governo penalizar a cadeia produtiva e comprometer a geração de empregos, principalmente porque se tem notícia de que a arrecadação está acima do previsto. Com a máquina superdimensionada, o que falta acontecer, na opinião do dirigente, é apresentar estrutura de custos do Estado.

De Marchi destaca que a expectativa era de se fazer ajustes no custo, mantendo o status atual e aumentando os benefícios na Previdência Social e nos setores básicos, como saúde, segurança e educação. O presidente da Fecomércio salienta que, diante da possibilidade da volta da CPMF, a entidade continuará mobilizada, em sintonia com as bases e Confederação Nacional da Indústria e do Comércio, para dialogar com o governo a fim de equacionar a situação cambial e monetária.

O presidente da Federação da Agricultura do Estado do Rio Grande do Sul (Farsul), Carlos Sperotto, compartilha a surpresa e decepção de De Marchi. Segundo ele, o repúdio à CPMF é uma unanimidade na classe empresarial. "Isso foi uma agressão que a categoria sofreu", afirma. Ele explica ainda que a posição do Sistema Farsul é contrário a qualquer restabelecimento do imposto. "Estamos em um caminho de desburocratização, esperávamos diminuição de tributos e não aumento", alega.

Sperotto alerta que, como a medida afetará todos os movimentos financeiros, uma das possíveis consequências no mercado será a busca por outros caminhos. "Todo movimento via bancária tem transparência. Contudo, o aumento da burocracia pode levar ao uso de outras vias, como o dinheiro vivo e outras espécies financeiras que não trazem contribuição", afirma. A diminuição do impacto dos tributos na economia deveria ser, na visão dele, a preocupação governamental.

Em sintonia com a Confederação Nacional da Indústria (CNI), a Federação das Indústrias do Rio Grande do Sul (Fiergs) iniciou, na semana passada, uma mobilização no Estado. A proposta é que as entidades dirijam-se aos parlamentares do atual Congresso Nacional e aos eleitos para evitar a recriação do tributo.

De acordo com o presidente da Fiergs, Paulo Tigre, mais imposto significa perda de competitividade para as empresas, o que ocorre através da guerra cambial e da acirrada competição em um mundo globalizado. "Além disso, essa questão já foi amplamente debatida pela sociedade e consolidada pela decisão do Congresso Nacional de acabar com a contribuição", afirma.

Para Tigre, a medida tem efeito cascata, onerando os produtos fabricados no Brasil em relação aos importados e reduzindo as vendas dos itens com maior valor agregado de produção nacional. "Hoje temos 39% do PIB em tributos. Então, em vez de discutir a recriação de mais um ônus, devemos debater, isto sim, uma reforma tributária que amplie a base de contribuintes, simplifique os procedimentos e diminua a carga sobre quem paga imposto", defende, lembrando que a crise internacional provou que a redução de alíquotas dá resultados positivos na dinamização da economia e na arrecadação dos governos.


Fonte: Jornal do Comércio – RS