Custos da burocracia


2 jul 2010 - IR / Contribuições

Portal do ESocial

Estudo da Fiesp quantifica os prejuízos calamitosos causados ao país por excesso de normas tributárias e velhos entraves cartoriais

Manicômio tributário: a expressão, utilizada por um especialista em direito administrativo, não soa exagerada para caracterizar um país em que convivem 63 tributos diferentes, regidos por um conjunto de normas que, nos últimos 20 anos, tem sofrido a média de 34 alterações por dia.

"O que acaba ocorrendo", diz o professor Carlos Ari Sundfeld, da Fundação Getúlio Vargas, "é um parasitismo nosso, dos advogados, para se aproveitar dessa confusão". O parasitismo, para utilizar o mesmo termo, replica-se na própria estrutura do poder público, criando camadas e mais camadas de funcionários encarregados de zelar pela observância -ou de facilitar a desconsideração- das regras que produzem sem cessar.

A dimensão dos custos com burocracia no Brasil foi quantificada em recente estudo da Fiesp. São R$ 46,3 bilhões por ano, mais do que todos os gastos com saneamento básico previstos no PAC 2 para os próximos quatro anos.

Num cálculo mais dramático, pode-se dizer que o prejuízo anual devido à fúria dos regulamentos públicos é aproximadamente mil vezes maior do que o total dos gastos emergenciais provocados pela recente calamidade das enchentes no Nordeste.

Desses R$ 46,3 bilhões, quase a metade (R$ 20 bilhões) corresponde ao que se perde com o tsunami tributário. Mas o pesadelo se estende, como é notório, para as incontáveis autorizações, alvarás, processos e impedimentos que, do mero registro de uma empresa familiar até fabulosas obras governamentais, emperram qualquer iniciativa econômica e colocam o Brasil entre os países mais burocráticos do mundo.

Segundo o Banco Mundial, a terra do "jeitinho" e dos bacharéis está na 129ª posição, entre os 183 países pesquisados.

Não se trata apenas da herança cultural ibérica, ou de alguma cisão entre a mentalidade, digamos, latina e a tradição anglo-saxônica. Portugal e Itália, apesar do folclore que possa cercá-los, situam-se em muito melhor colocação nesse levantamento.

Outras circunstâncias, como o desdobramento administrativo nas esferas municipal, estadual e federal, ou a própria importância do investimento estatal na economia do país, contribuem para solidificar tal situação.

O mais perverso é que todo mecanismo burocrático, de qualquer modo, sempre aparenta ter alguma razão para existir; no mínimo, destina-se a sobrepor um novo controle sobre a ineficiência dos que o precediam.

Grandes doses de ousadia, portanto, e mesmo de voluntarismo, seriam necessárias para que alguma liderança política decidisse adotar uma agenda transformadora nessa questão.

Por diferentes motivos, o perfil dos principais candidatos à Presidência não parece corresponder a esse desafio -o que torna ainda mais oportuno o estudo da Fiesp agora divulgado.

Tanto a reforma tributária quanto uma reforma ainda maior do próprio Estado dependem de esforços de mobilização e pressão que não dizem respeito apenas às entidades empresariais, mas aos interesses de toda a população.


Fonte: Folha de S.Paulo