11 ago 2010 - Trabalho / Previdência
Judiciário está dividido quanto ao ponto eletrônico
As empresas que atuam no comércio lojista de Porto Alegre (RS) terão até 28 de junho de 2011 para se adequar à Portaria 1.510/2009 do Ministério de Trabalho e Emprego que regulamenta o ponto eletrônico. A decisão é do juiz do trabalho, Volnei de Oliveira Mayer, da 23ª Vara do trabalho de Porto Alegre. A regra vale para empresas com mais de dez funcionários que já usam equipamentos eletrônicos de marcação de jornada de trabalho ou que venham a usá-los. O prazo acaba no dia 25 de agosto.
Em São Paulo, a Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel-SP), que compreende em média 700 bares e restaurante, também obteve decisão provisória para suspender a obrigatoriedade do uso dos pontos eletrônico. A decisão é juíza Regina Celi Vieira Ferro, titular da 48ª Vara do Trabalho de São Paulo.
O Sindicato dos Lojistas do Comércio de Porto Alegre, que representa cerca de 1,6 mil lojas, conseguiu liminar em Mandado de Segurança Coletivo para que as empresas não sejam autuadas, multadas e nem seja a elas impostas qualquer tipo de penalidade por não cumprirem as exigências contidas na referida Portaria por parte do Superintendente Regional do Trabalho e os agentes fiscais que lhe são subordinados.
No MS, o Sindilojas alegou que o tempo determinado pela Portaria não é o suficiente para que todas as empresas pudessem começar a utilizar o Registro Eletrônico de Ponto (REP). Além disso, sustentou que será necessário que as empresas adequarem os softwares e hardwares.
De acordo com o MS, o sindicato argumentou que as empresas não tiveram respeitado o prazo estabelecido, pois o MTE só aprovou o cadastro do REP a partir do último dia 12 de março. Até o último dia 13 de julho, em todo país, havia 60 apenas empresas cadastradas e aptas a utilizarem o ponto eletrônico.
O sindicato argumenta que onerosa e complexa é a adequação das empresas ao novo sistema de ponto eletrônico e a aplicação da lei é genérica, tanto para empregadores de grande porte como para médios e pequenos empregadores.
Além das dificuldades técnicas e de tempo alegadas, existe também, segundo o Sindilojas, a falta do produto no mercado. Dessa forma, é pedido o prazo de um ano para adequação das empresas de comércio do estado e mais 90 dias para orientação dos empregados, previsto nos artigos 627 e 23 do Decreto 4.552/2002 a contar do dia 26 de junho de 2011.
O juiz solicitou informações ao Superintendente Regional do Trabalho e a Advocacia-Geral da União. Depois os autos devem ser encaminhados ao Ministério Público do Trabalho para que, no prazo de dez dias, dê parecer sobre a decisão.
No caso da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel-SP), a juíza considerou as dificuldades dos estabelecimentos na adequação à portaria ministerial. Por isso, determinou que o superintendente Regional do Trabalho e Emprego na Cidade de São Paulo abstenha-se de exigir dos associados à Abrasel paulista o cumprimento da medida e também de aplicar autuações e multas aos beneficiados.
Entre outros pontos, a juíza enfatizou que o sistema exigido pelo Ministério do Trabalho dobraria o tempo despendido pelos trabalhadores na marcação de entradas e saídas, e que alguns transtornos surgiriam "em razão da quantidade excessiva de registradores eletrônicos de ponto, para atender a todos os empregados, o que, provavelmente repercutirá no preço final do produto".
O advogado da Abrasel, Percival Maricato, e diretor jurídico da Central Brasileira do Setor de Serviços (Cebrasse), destacou que a juíza também levou em consideração que a impressão dos horários levaria bares e restaurantes a gastos indesejáveis com papéis e tinta — o que vai na contramão das políticas de sustentabilidade.
Segundo Diogo Telles Akshi, que também é advogado da Abrasel-SP, a decisão da juíza foi muito importante, "pois a portaria prevê que se o ponto não for usado, fica descaracterizado o controle da jornada". Afirmou também que não usar o ponto é um retrocesso digital das empresas, "mas o tempo estabelecido pelo Ministério do Trabalho foi curto, e deve se levar em consideração a falta de equipamentos, que atendam as exigências da portaria, no mercado."
Akashi sustenta que o artigo 28 da portaria afronta também a segurança jurídica. O dispositivo considera descaracterizado o controle eletrônico de jornada efetuado pelos atuais equipamentos de ponto, e determina que o mesmo "não se prestará às finalidades que a lei lhe destina", engessando os meios de prova da jornada de trabalho no processo. Segundo o advogado, esse engessamento, ofende o princípio da persuasão racional ou livre convencimento motivado do juiz previsto no artigo 132 do CPC e nos artigos 765 e 832 da CLT. Além do direito da liberdade das provas previsto no artigo 332 e artigo 852-D da CLT.
Decisões contráriasOs trabalhadores de empresas de vigilância e segurança deverão usar o sistema de Registro Eletrônico de Ponto (REP) em seus locais de trabalho. A determinação, em liminar, é do juiz Eurico Zecchin Maiolino, da 21ª Vara Cível Federal do Tribunal Regional Federal da 3ª Região. Ele analisou o pedido da Associação Brasileira das Empresas de Vigilância e Segurança (Abrevis) para suspender a marcação eletrônica. A associação pediu também que a União se abstenha de autuar ou punir quem descumprir a medida.
De acordo com o juiz, o artigo 74 da Consolidação das Leis do Trabalho diz que cabe ao Ministério do Trabalho a expedição de instruções para a disciplina do registro manual, mecânico ou eletrônico da anotação da hora de entrada e saída dos trabalhadores nos estabelecimentos em que houver mais de dez trabalhadores.
Ele enfatizou que a criação de requisitos para o exercício da obrigação legal do controle eletrônico apontando como ilegal não criou obrigações diferentes daquelas previstas na própria lei, nem tampouco se mostra inadequada para atingir a finalidade legal.
Em seu pedido, a Abrevis alegou que as obrigações acessórias impostas pelo Ministério do Trabalho e Emprego acarretam grandes prejuízos, que o equipamento tem custo muito alto, além de, a cada apontamento de horário pelos empregados, emitir recibo. Segundo a Abrevis, isso enseja a disponibilidade de técnicos especializados para ajustes diários na máquina.
No Superior Tribunal de Justiça, o ministro Cesar Asfor Rocha, também negou pedido de liminar em Mandado de Segurança no qual a Fundação Faculdade de Medicina pedia para se isentar da obrigação de implantar um novo registro eletrônico de ponto.
Com um quadro de 11 mil funcionários, a faculdade argumentou que o ato implica a troca de todos os equipamentos, cujas aquisições e manutenções vão gerar gastos “monumentais” para a instituição. Em consequência, projetos assistenciais voltados para a sociedade deixariam de receber investimentos.
Ao analisar o pedido, o ministro Cesar Rocha entendeu que não foram atendidos os requisitos que autorizam a concessão da liminar. Segundo ele, os documentos apresentados não levam à conclusão sobre a ilegalidade sustentada pela faculdade. Embora a portaria entre em vigor no dia 21 de agosto de 2010, o ministro considerou que o perigo de a demora da decisão judicial gerar dano irreparável não estava configurado. Isso porque não ficou comprovada a iminente lavratura de autos de infração ou imposição de multa em caso de descumprimento da portaria.
Cesar Rocha solicitou informações ao Ministério do Trabalho e Emprego e parecer do Ministério Público Federal. O mérito do pedido ainda será julgado pela 1ª Seção do STJ. O relator é o ministro Castro Meira.
Esperando decisãoNo mesmo sentido, a Central Brasileira do Setor de Serviços (Cebrasse) entrou com Mandado de Segurança junto à Justiça do Trabalho da capital paulista contra o Superintendente Regional do Trabalho e Emprego no Estado de São Paulo, para que associados à entidade não sejam obrigados a cumprir determinações da portaria 1.510 do ministério do Trabalho. A Central representa aproximadamente 85 associações e sindicatos da área de serviços.
Para o advogado da Cebrasse, Percival Maricato, "trata-se de mais um dos muitos equívocos da administração pública, gerando custos, desperdícios e perda de tempo e de recursos". Ele calcula que a troca de cerca de dois milhões de relógios de pontos, ao custo mínimo unitário em torno R$ 3 mil cada, levaria as empresas a gastarem em torno de R$ 6 bilhões. Com demais custos relativos à troca do sistema – certificações, treinamentos, manutenção e outros –, o montante dos gastos chegaria a R$ 20 bilhões no bolso dos empregadores. "A obediência à portaria ministerial, além de caríssima, inútil e complicada para as empresas e para o poder público, seria ainda um crime contra o meio ambiente", protesta o advogado.
De acordo com ele, a pretexto de impedir fraudes e punir empresas desonestas na aferição das horas de trabalho dos empregados, o novo sistema fere princípios elementares do Direito e pune os inocentes, não os desonestos. "Um crime contra o país, característico de burocracias insensíveis e desconhecedoras da realidade vivida fora de suas escrivaninhas", diz Maricato.
Empresas idôneas deverão arcar com os novos custos, lançando-os sobre preços de produtos e serviços, prevê o advogado. Para atender todos os requisitos da portaria e do fisco, os pequenos, médios e até mesmo grandes empreendimentos precisarão desviar foco, recursos e equipamentos de suas atividades fins e canalizá-los para o ponto eletrônico e outras exigências fiscais.
Maricato estima gastos com manutenção e certificações em equipamentos sofisticados para o armazenamento de informações, impressoras integradas, porta padrão USB externa para captura de dados armazenados por fiscais, e baterias capazes de funcionar 1.440h, em caso de falta de energia – “uma verdadeira parafernália”.
O aumento de gastos não poupará sequer o próprio governo, ao exigir departamentos, equipamentos e mais funcionários: as próprias fornecedoras de equipamentos, programas ou certificação devem registrar-se no Ministério do Trabalho, criando mais procedimentos, custos e freios à agilidade e a eficiência.
De acordo com o advogado, essas alterações contínuas na rotina das empresas, atentam contra o direito mais elementar da iniciativa privada: o da segurança jurídica.
"Sem investimentos, não há desenvolvimento econômico, consequentemente produtos e serviços, qualidade de vida, possibilidade de vida urbana, social mesmo, é preciso que os empreendedores tenham segurança jurídica, certeza de que as regras do jogo não vão mudar a toda hora, que os negócios não serão onerados, especialmente por inutilidades burocráticas, equipamentos desnecessários, complicações no que pode ser simples e efetivo", argumenta.
Ele afirma que o ponto eletrônico é mais um fator gerador de burocracia, custos, insegurança jurídica, o suficiente para tornar tal intervenção ilegal e inconstitucional.
Segundo o advogado, o MS foi feito com pedido de distribuição de urgência, mas ainda não foi julgado. A Portaria entra em vigor no próximo dia 25 de agosto.
Fonte: Conjur