Decreto nº 29.042/2001, artigo 10. Programa de Incentivo do Governo do Estado à Produção de Leite. Industrialização por encomenda.
I – RELATÓRIO
Trata o presente processo de consulta acerca da possibilidade de fruição do benefício previsto no artigo 10 do Decreto nº 29.042/2001 pelo consulente, assim como por um terceiro que será contratado para realizar industrialização por encomenda das mercadorias mencionadas nestes autos, conforme abaixo explicitado.
Afirma que é uma indústria do ramo de produtos laticínios (transcrevendo-os em uma tabela) e que realiza operações de vendas de mercadorias para contribuintes localizados neste Estado e em outros. Adiciona que todo o processo fabril é efetuado através da unidade fabril da consulente.
Informa que nas saídas dos produtos em epígrafe aos contribuintes desse e de outros Estados, utiliza do incentivo fiscal previsto no artigo 10 do Decreto nº 29.042/2001.
Em fl. 05, aduz um fluxo resumido da operação e um exemplo numérico.
Adiante, expõe que estuda a alteração do seu processo de fabricação dos produtos mencionados, transferindo a etapa da industrialização para um terceiro localizado no Estado do Rio de Janeiro, na modalidade industrialização por encomenda. Neste caso, a consulente compra os insumos (matérias primas, embalagens, produtos intermediários) e envia para este terceiro industrial, “com suspensão do ICMS, conforme previsto no inciso I do art. 52 do RICMS/RJ”.
Aprofunda na exposição e relata que o terceiro industrializa, sob encomenda, os produtos, tendo como resultado o produto final pronto para venda e consumo. “Ao finalizar o processo de industrialização emite duas notas fiscais para a consulente, sendo: i) Retorno dos insumos, matérias primas, embalagem com a devida suspensão do ICMS, respeitando o prazo de 180 dias ...; ii) A cobrança relativa ao serviço de industrialização, abrangendo nesta o valor da mão-de-obra, produtos intermediários aplicados, caso haja, e despesas cobradas do encomendante. Operação devidamente tributada pelo ICMS”.
Entende a consulente que mesmo contratando um terceiro (estabelecimento industrial) para industrializar seus produtos, através da modalidade de industrialização sob encomenda, com posterior saída (do estabelecimento da consulente) dos produtos acabados derivados do leite a contribuintes, ainda possui o direito de usufrui do benefício tratado no art. 10 do Decreto nº 29.042/01. Fundamenta este posicionamento transcrevendo o §3º do mesmo artigo.
Além disso, entende que o terceiro (estabelecimento industrial) “também detém o direito de se beneficiar do incentivo previsto no art. 10 do Decreto nº 29.042/01 sobre sua cobrança referente ao serviço de industrialização, posto que este também se reveste de característica de estabelecimento industrial”.
Finaliza afirmando que o aproveitamento do benefício ora analisado tanto pela consulente quanto pelo terceiro industrial “garante o objetivo crucial do Decreto nº 29.042/01, que é o incentivo do governo à produção de leite dentro do Estado do Rio de Janeiro”.
Isto posto, consulta:
1. “Diante o exposto acima, está correto o entendimento da consulente de que o incentivo fiscal citado no art. 10 do Decreto n. 29.042/01 permanece sendo aplicável as suas saídas de produtos derivados do leite com destina à clientes contribuintes do imposto, ainda que a industrialização tenha sido efetuada sob encomenda de terceiros?
2. Tal incentivo também é aplicável a terceiro (executar da industrialização) sobre sua cobrança referente ao serviço de industrialização, posto que este: i) se reveste da característica de estabelecimento industrial; ii) a operação é normalmente tributada pelo ICMS; iii) destinada à consulente, que é contribuinte do imposto?”
O presente processo encontra-se instruído com a inicial (fls. 03/08), cópia do DARJ, DIP e de comprovante de transação bancária, referentes à Taxa de Serviços estadual (fls. 09/11), cópias da ata de reunião dos sócios (fls.12/13), assim como da procuração e do documento de identificação (fls. 14/15).
Posteriormente, em fl. 23 o p.p. foi encaminhado a esta coordenadoria pelo Sr. Auditor Fiscal Chefe da AFE 10, “informando que a empresa não está sob ação fiscal e não há auto de infração relacionada à matéria”.
II – ANÁLISE E FUNDAMENTAÇÃO
Preliminarmente, cumpre ressaltar que, conforme disposto no Regimento Interno da SEFAZ, aprovado pela Resolução SEFAZ nº 89/2017, a competência da Superintendência de Tributação, bem como da Coordenadoria de Consultas Jurídico Tributárias abrange a interpretação da legislação tributária fluminense em tese, cabendo à verificação da adequação da norma ao caso concreto exclusivamente à autoridade fiscalizadora ou julgadora.
Ademais, esclarecemos que o objetivo das soluções de consulta tributária é elucidar questões objetivas formuladas pelos consulentes acerca da interpretação de dispositivos específicos da legislação tributária no âmbito da Secretaria de Fazenda e Planejamento do Estado do Rio de Janeiro, presumindo-se corretas as informações e documentos apresentados pela consulente, assim como as informações e verificações de competência da autoridade fiscal, sem questionar suas exatidões. As soluções de consulta não convalidam tratamentos tributário, regimes, cálculos, interpretações, benefícios, informações, ações ou omissões aduzidas na consulta. Cabe, ainda, destacar que não compete à SUT a verificação quanto à devida confirmação de entrada em receita da Taxa referente à consulta jurídico-tributária prevista na legislação, sendo requisito formal de verificação, no momento da instrução processual, por parte da repartição responsável pela abertura do presente.
Isto posto, passemos à matéria tratada no presente instrumento. Inicialmente, faz-se necessária uma análise quanto alguns conceitos dispostos na legislação.
Segundo o inciso IV do art. 3º1 do Livro XVII do Decreto nº 27.427/00, estabelecimento industrial é aquele que realiza operação que modifique a natureza, o funcionamento, o acabamento, a apresentação ou a finalidade de produto, ou o aperfeiçoe para o consumo ou para o uso como matéria-prima por outro industrial.
Quanto à industrialização por encomenda trata-se de operação em que um estabelecimento promove a saída de produtos cuja industrialização tenha sido realizada por outro estabelecimento, mediante a remessa, pelo autor da encomenda, de matérias-primas, produtos intermediários, embalagens, recipientes, moldes, matrizes ou modelos.
Neste momento, imprescindível destacar que a legislação tributária fluminense não conceitua e/ou regulamenta a industrialização por encomenda. Por esta razão, na ausência de disposição expressa, e visando à devida aplicação da legislação tributária recorreremos ao tema tratado pelo Decreto nº 7.212, de 15 de junho de 2010 - RIPI – que regulamenta a cobrança, fiscalização, arrecadação e administração do Imposto sobre Produtos Industrializados - IPI.
Note-se que, conforme preceitua o inciso IV do art. 9º do RIPI, “equiparam-se a estabelecimento industrial os estabelecimentos comerciais de produtos cuja industrialização tenha sido realizada por outro estabelecimento da mesma firma ou de terceiro, mediante a remessa, por eles efetuada, de matérias-primas, produtos intermediários, embalagens, recipientes, moldes, matrizes ou modelos”.
Assim sendo, o Decreto nº 29.042/01, que dispõe sobre o “Programa de Incentivo do Governo do Estado à Produção de Leite” (que possui como objeto o aumento da produção, produtividade e melhoria da qualidade do leite, com a utilização dos recursos gerados por este programa), prevê em seu art. 10 a autorização para que o estabelecimento industrial credite-se do valor correspondente ao ICMS incidente nas operações em que promover a saída de produto industrializado derivado de leite, inclusive leite UHT Longa Vida comercializado em caixa, destinado ao contribuinte do imposto, vedado o aproveitamento de quaisquer outros créditos de ICMS. Infere-se, então, que o caput do art. 10 deste normativo não restringe expressamente a natureza de estabelecimento, permitindo, portanto, o aproveitamento do crédito em epígrafe pela consulente (encomendante), que, no caso, é equiparada ao estabelecimento industrial, segundo conceito do Regulamento do IPI.
Perceba, ainda, que o § 3º2 do art. 10 do Decreto nº 29.042/01 permite a acumulação de crédito de ICMS de 2% do valor que seria devido, caso não estivesse em vigor a sistemática definida no caput deste artigo, desde que atendidos aos requisitos previstos neste ato, o que não ficou comprovado ser o caso da consulente. Finalmente, é cediço que tanto o caput quanto o § 3º do art. 10 limitam a concessão do crédito em epígrafe a uma única saída do produto acabado, realizada pelo titular da marca do produto, pronto para consumo final.
De outro modo, a consulente entende, equivocadamente, que o terceiro (estabelecimento contratado) “também detém o direito de se beneficiar do incentivo previsto no art. 10 do Decreto nº 29.042/01 sobre sua cobrança referente ao serviço de industrialização...”. Atente para o fato de que, segundo o caput do artigo 10, o aproveitamento do crédito fica restrito ao estabelecimento industrial que promover a saída de produto industrializado em epígrafe, pelo valor correspondente ao ICMS incidente nessas operações, vedado o aproveitamento de quaisquer outros créditos de ICMS, inclusive os referidos nos artigos 1º, 3º e 4º.
Portanto, vale registrar que a operação de envio, pela encomendante, de matéria prima, insumo e demais materiais utilizados no processo de industrialização por encomenda, goza de suspensão do ICMS, nos termos do inciso I3 do artigo 52 do Livro I do RICMS RJ/00, devendo cumprir as demais determinações previstas na legislação.
Ademais, relativamente aos materiais supra citados no parágrafo anterior, cabe observar o inciso II4 do artigo 3º c/c inciso II5 do artigo 4º, ambos da Lei nº 2.657/96, que determina que o ICMS incide na saída de estabelecimento industrializador, em retorno ao do encomendante, ou para outro por ordem deste, de mercadoria submetida a processo de industrialização que não implique prestação de serviço compreendido na competência tributária municipal, ainda que a industrialização não envolva aplicação ou fornecimento de qualquer insumo, onde a base de cálculo é o valor acrescido relativo à industrialização, abrangendo mão-de-obra, insumos aplicados, se for o caso, e despesas cobradas do encomendante, que deve ser tributada pela alíquota normal do imposto, tendo como base de cálculo o valor da referida operação. Assim, o estabecimento encomendante da industrialização terá direito ao crédito corretamente destacado na Nota Fiscal do estabelecimento industrializador, observadas as normas dos artigos 35 a 37 da citada lei e demais restrições e condições ao crédito previstos na legislação tributária.
III – RESPOSTA
Desta forma, considerando todo o exposto, passemos às respostas:
1) Sim, tendo em vista que não há previsão expressa na legislação tributária fluminense um conceito ou regulamentação acerca da operação de industrialização por encomenda, e que o RIPI equipara ao estabelecimento industrial os estabelecimentos comerciais de produtos cuja industrialização tenha sido realizada por outro estabelecimento da mesma firma ou de terceiro, mediante a remessa, por eles efetuada, de matérias-primas, produtos intermediários, embalagens, recipientes, moldes, matrizes ou modelos;
2) Não, pois o caput do art. 10 do Decreto nº 29.042/01 é claro ao expor que o aproveitamento do crédito fica restrito ao estabelecimento industrial (titular da marca), que promover uma única saída do produto acabado em epígrafe, pronto para o consumo final, pelo valor correspondente ao ICMS incidente nessas operações, vedado o aproveitamento de quaisquer outros créditos de ICMS, inclusive os referidos nos artigos 1º, 3º e 4º.
Fique a consulente ciente de que esta consulta perderá automaticamente a sua eficácia normativa em caso de mudança de entendimento por parte da Administração Tributária, ou seja, editada norma superveniente dispondo de forma contrária.
Pelo o exposto, opino pelo retorno dos presentes autos à Auditoria-Fiscal Especializada de Produtos Alimentícios - AFE 10, para cientificar o interessado.
C.C.J.T., em 07 de novembro de 2018.