Solução de Consulta SRE Nº 7 DE 25/08/2022


 


ICMS – CONSULTA FISCAL. 1. Lei Complementar nº 194/2022. 2. Questionamento quanto ao momento de produção de efeitos internos no âmbito estadual. 3. Entendimento pela necessidade de veículo normativo estadual. 4. Decreto Estadual nº 83.840/2022. 5. Efeitos a partir de 01/07/2022, conforme art. 3º desse decreto. 6. Hipótese de suspensão da eficácia de dispositivos da lei estadual contrários à lei complementar superveniente versando sobre normas gerais em matéria tributária, a teor do § 4ª do art. 24, da Constituição Federal de 1988. 7. Operações com energia elétrica. 8. Aplicação da alíquota do imposto prevista para as operações em geral, salvo hipótese de previsão para utilização de alíquota inferior. 9. Fundo Estadual de Combate e Erradicação de Pobreza – FECOEP. 10. Manutenção da cobrança até 31/12/2023. 11. Momento da ocorrência do fato gerador na aquisição de energia elétrica em outro Estado quando não destinados à comercialização ou à industrialização. 12. Expressa previsão no art. 2º XIV, da Lei nº 5.900/96. 13. Restituição de eventual recolhimento a maior a título da exação fiscal somente pode ser autorizado a quem provar ter assumido o ônus tributário, ou estiver devidamente autorizado por quem o tenha suportado.


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I – DOS TERMOS DA CONSULTA

1. Trata-se de Consulta Fiscal formulada por CEMIG GERAÇÃO E TRANSMISSÃO S.A., atuando no ramo de venda de energia elétrica para este Estado na condição de substituto tributário do ICMS, por meio da qual objetiva obter posicionamento desta SEFAZ quanto às seguintes indagações:

a) “Considerando que a alteração das alíquotas do ICMS sobre as operações com energia elétrica nesse Estado, em decorrência da Lei Complementar (LC) nº 194/2022, ocorreu por meio do DECRETO Nº 83.840, DE 01 DE JULHO DE 2022, é correto o entendimento de que a referida LC revogou tacitamente todos os dispositivos da legislação estadual que estabeleciam alíquotas de ICMS superiores a alíquota geral para operações com energia elétrica, de modo que, a partir de 23/06/2022, as operações com energia elétrica passaram a se sujeitar à alíquota geral aplicada nesse estado? Se não, a partir de qual data devem ser observadas as alterações relativas às alíquotas de ICMS aplicáveis sobre energia elétrica, em decorrência da LC 194/2022?”;

b) “A Lei Complementar nº 194/2022 considera a energia elétrica um serviço essencial e indispensável, que não pode ser tratado como supérfluo. Considerando que a instituição e o financiamento de Fundo de Combate à Pobreza encontram-se previstos no artigo 82, §1º, ADCT da CR/88, é correto o entendimento de que não mais haverá a incidência de percentual destinado ao Fundo de Combate à Pobreza desse Estado sobre as operações com energia elétrica?”;

c) “O fato gerador do ICMS é o momento da entrada da energia nesse Estado ou a emissão do documento fiscal? Sendo o momento da entrada da energia, na hipótese de emissão de NF relativa a operações com energia elétrica sujeitas a diferentes alíquotas, sua aplicação deverá ser feita proporcionalmente, considerando-se o período de vigência de cada alíquota?”; e

d) “Caso esta Companhia tenha procedido ao faturamento da energia comercializada para esse Estado de forma diversa da resposta a esta consulta, poderia corrigir eventual diferença de pagamento a maior do ICMS por meio do abatimento (compensação) do respectivo valor, no total do imposto devido na guia de recolhimento de período subsequente?”.

2. Para tanto, acresce que, com a publicação da Lei Complementar nº 194/2022, a energia elétrica foi classificada como bem essencial e indispensável, limitando a alíquota do ICMS ao patamar das operações em geral e determinando também a não incidência do imposto sobre serviços de transmissão e distribuição e encargos setoriais vinculados às operações com energia elétrica. E como previsto em seu art. 15, sua entrada em vigor ocorreu com a sua publicação em 23/06/2022.

3. Ademais, o Estado de Alagoas publicou o Decreto nº 83.840/2022, que em seu parágrafo único do art. 1º, também definiu regramento específico em relação à aplicação das alíquotas e do financiamento ao Fundo Estadual de Combate e Erradicação de Pobreza – FECOEP.

4. Pontua que sua consulta visa confirmar a correta interpretação da legislação tributária no que se refere ao momento de aplicação das alterações promovidas pela LC nº 194/2022, sobretudo, a alíquota de ICMS nas operações envolvendo energia elétrica. Ressalta, por fim, que o princípio da anterioridade (art. 150, III, alíneas “b” e “c” da CF/88) afastaria a cobrança imediata de tributos apenas no caso de instituição ou majoração, não se aplicando ao presente caso, em que houve uma redução do tributo devido.    

5. Comprovado o recolhimento da taxa de fiscalização e serviços (SEI nº 13465290).

6. Sendo o que importa relatar, assim chegam estes autos da Chefia de Administração Fazendária – 1ª Região (SEI nº 13478253), para análise e resposta, na forma do art. 59, caput, da Lei nº 6.771/06.

II – DA ANÁLISE E FUNDAMENTAÇÃO

7. Atendidos os requisitos formais previstos, com o signatário da petição inicial bastante procurador, efetuado o pagamento da taxa de fiscalização e serviços diversos e com as declarações exigidas pela legislação (art. 204, VI, do Regulamento do PAT/AL – Decreto nº 25.370/2013), passa-se a análise dos questionamentos feitos.

8. Quanto ao mérito das indagações feitas, observa-se que se concentram, basicamente, em saber qual a data a partir da qual as disposições da Lei Complementar nº 194/2022, que entrou em vigor na data de sua publicação que ocorreu em 23/06/2022, passaram a produzir efeitos internos no Estado de Alagoas.

9. Ademais, em face do que também consta no art. 82, § 1º, dos Atos das Disposições Constitucionais Transitórias – ADCT da CF/88[1], há dúvida sobre a incidência do adicional de alíquota do ICMS relacionado ao Fundo Estadual de Combate e Erradicação de Pobreza – FECOEP nas operações com energia elétrica.

10. Nesse passo, como se sabe, a Lei Complementar nº 194, de 23 de junho de 2022, alterou a Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 (Código Tributário Nacional), e a Lei Complementar nº 87, de 13 de setembro de 1996 (Lei Kandir), para considerar bens e serviços essenciais e indispensáveis os relativos aos combustíveis, ao gás natural, à energia elétrica, às comunicações e ao transporte coletivo. Além disso, em relação às operações com esses produtos e serviços, também vedou a fixação de alíquotas do ICMS em patamar superior ao das operações em geral.

11. Para produção de efeitos no âmbito estadual, o entendimento na SEFAZ/AL foi que tal regramento necessitaria de instrumento normativo interno, podendo decreto do Chefe do Poder Executivo ser utilizado para tanto. E foi com base nesse modo de entender que foi editado o Decreto nº 83.840/2022, a seguir reproduzido na íntegra, para análise e resposta às dúvidas suscitadas na presente consulta fiscal:

Decreto nº 83.840/2022:

“O GOVERNADOR DO ESTADO DE ALAGOAS, no uso das atribuições que lhe conferem o inciso IV do art. 107 da Constituição Estadual, e o que mais consta do Processo Administrativo nº E:01500.0000021554/2022,

Considerando o disposto na Lei Complementar Federal nº 194, de 23 de junho de 2022, e tendo em vista a necessidade de preservar a manutenção e a continuidade dos diversos Programas Sociais Estaduais mantidos com os recursos financeiros provenientes do Fundo Estadual de Combate e Erradicação de Pobreza – FECOEP, como é o caso, dentre outros, do Programa Cria, do Programa do Leite, e do Programa Auxílio Chuva,

Art. 1º Nos termos da Lei Complementar Federal nº 194, de 23 de junho de 2022, para fins da incidência do Imposto Sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação – ICMS, sobre as operações com os combustíveis, o gás natural, a energia elétrica, as comunicações e o transporte coletivo, não serão aplicadas alíquotas sobre as operações referidas em patamar superior ao das operações em geral.

Parágrafo único. Até 31 de dezembro de 2023, sobre as operações a que se refere o caput deste artigo, deve ser aplicado, conforme o caso, os adicionais de alíquota previstos no art. 2º e no art. 2º-A da Lei Estadual nº 6.558, de 30 de dezembro de 2004, que instituiu o Fundo Estadual de Combate e Erradicação de Pobreza – FECOEP.

Art. 2º O presente Decreto possui caráter excepcional e extraordinário e não revoga as disposições previstas na Legislação Estadual do ICMS.

Art. 3º Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação, produzindo efeitos a partir de 1º de julho de 2022 e pelo período em que houver a vigência e eficácia da Lei Complementar Federal nº 194, de 2022, e suas alterações.” (grifou-se)

12. Quanto à produção de efeitos desse novel regramento, note-se que o art. 3º é claro ao estabelecer o dia 01/07/2022 como parâmetro de vigência. Isto é, a partir dessa data, as operações e serviços prestados com combustíveis, gás natural, energia elétrica, comunicações e transporte coletivo devem ser tributados com as alíquotas previstas para as operações em geral.

13. Em relação ao adicional de alíquota do ICMS destinado ao Fundo Estadual de Combate e Erradicação de Pobreza – FECOEP, o parágrafo único do art. 1º do Decreto nº 83.840/2022 também é expresso ao definir que sua cobrança deve ocorrer até 31/12/2023. E as razões para tanto constam nos “considerandos”, qual seja, necessidade de preservar a manutenção e a continuidade dos diversos programas sociais em vigor mantidos pelo fundo, como é o caso do Programa Cria, do Programa do Leite e do Programa Auxílio Chuva.

14. Por oportuno, a fim de suprir possível incompatibilidade na aplicação das disposições do próprio decreto e da Lei Complementar nº 194/2022 com a legislação estadual do ICMS, cabe esclarecer que, diferentemente do que consta na parte final da redação do art. 2º do Decreto nº 83.840/2022, no sentido de que não revogariam “as disposições previstas na Legislação Estadual do ICMS”, em verdade, a hipótese é de suspensão da eficácia dos dispositivos da lei estadual por contrariar lei complementar nacional superveniente versando sobre normas gerais em matéria tributária, a teor do § 4º do artigo 24 da Constituição Federal de 1988[2].

15. No que concerne ao questionamento sobre o momento de ocorrência do fato gerador da energia elétrica no caso de aquisição interestadual, desnecessário maiores divagações ante o que claramente dispõe o inciso XIV do art. 2º da Lei nº 5.900/96, verbis:

Art. 2º Considera-se ocorrido o fato gerador do ICMS no momento:

(...)

XIV - da entrada no território deste Estado de lubrificantes e combustíveis líquidos e gasosos derivados de petróleo e energia elétrica oriundos de outro Estado, quando não destinados à comercialização ou à industrialização;

*Nova redação dada ao Inciso XIV do artigo 2º pelo inciso I do artigo 1º da Lei nº 6.209/00.

(...) (grifou-se)  

16. Ademais, lembre-se que se a energia for destinada à industrialização ou à comercialização, não há incidência do imposto na entrada neste Estado quando advinda de outro Estado, a teor do art. 3º, III, da Lei nº 5.900/96.

17. Por fim, quanto ao questionamento sobre a correção de eventual diferença de imposto recolhida a maior nas operações, via compensação ou abatimento em recolhimento posterior, como não é a requerente que assume o ônus tributário nas operações, ou pelo menos nada disse ou juntou para se entender de modo diverso, tal procedimento não se revela legítimo, já que a legislação somente permite a restituição a quem provar ter assumido o ônus tributário, ou está devidamente autorizado por quem o suportou, conforme dispõe o art. 62, I, § 1º, da Lei nº 6.771/06, e art. 165, I, e art. 166 do Código Tributário Nacional – CTN.

III – DA CONCLUSÃO/RESPOSTA

18. Com base no acima exposto, em resposta às dúvidas suscitadas na presente consulta fiscal em relação às operações realizadas com energia elétrica, propõe-se o seguinte:

(i) Seria “correto o entendimento de que a referida LC revogou tacitamente todos os dispositivos da legislação estadual que estabeleciam alíquotas de ICMS superiores a alíquota geral para operações com energia elétrica, de modo que, a partir de 23/06/2022, as operações com energia elétrica passaram a se sujeitar à alíquota geral aplicada nesse estado?”

Resposta: A Lei Complementar nº 194/2022, versando sobre normas gerais superveniente em matéria tributária, não revogou tacitamente dispositivos da lei estadual, mas suspendeu a eficácia daqueles no que lhe são contrários, a teor do § 4º, do art. 24 da Constituição Federal de 1988.

No âmbito estadual, o regramento da Lei Complementar nº 194/2022, somente passou a produzir efeitos internos com a edição do Decreto nº 83.840/2022 que, segundo seu art. 3º, ocorreu a partir de 01/07/2022.

A partir de 01/07/2022, às operações com energia elétrica, deve ser aplicada a alíquota prevista na legislação estadual para operações com produtos em geral, salvo as hipóteses em que haja previsão de utilização de alíquota inferior a esta.   

(ii) Seria “correto o entendimento de que não mais haverá a incidência de percentual destinado ao Fundo de Combate à Pobreza desse Estado sobre as operações com energia elétrica?”

Resposta: Em relação ao adicional de alíquota do ICMS destinado ao Fundo Estadual de Combate e Erradicação de Pobreza – FECOEP, deve continuar sendo aplicado às operações com energia elétrica até 31/12/2023, consoante previsto no parágrafo único do art. 1º do Decreto nº 83.840/2022;

(iii) “O fato gerador do ICMS é o momento da entrada da energia nesse Estado ou a emissão do documento fiscal?”

Resposta: O momento de ocorrência do fato gerador nas operações com energia elétrica adquirida em outro Estado, ocorre na entrada neste Estado, quando não destinada à comercialização ou à industrialização, conforme claramente definido no art. 2º, XIV, da Lei nº 5.900/96; e

(iv) Poderia “corrigir eventual diferença de pagamento a maior do ICMS por meio do abatimento (compensação) do respectivo valor, no total do imposto devido na guia de recolhimento de período subsequente?”

Resposta: A restituição de eventual recolhimento a maior a título da exação fiscal na forma da legislação de regência, somente pode ser autorizada a quem provar ter assumido o ônus tributário, ou a quem estiver autorizado por quem o tiver suportado.

É o parecer que se submete à apreciação superior.

Gerência de Tributação, Maceió (AL), 25 de agosto de 2022.  

ALBERTO JORGE SILVA

Auditor Fiscal da Receita Estadual

AFRE VIII - Matr. 82.011-3

De acordo:

Encaminho à apreciação e homologação do Superintendente Especial da Receita Estadual - SERE, na forma do art. 59, p único, da Lei nº 6.771/06.

Ronaldo Rodrigues da Silva

Chefe de Análise de Processo

Jacque Damasceno Pereira Júnior

Gerente de Tributação