Publicado no DOU em 14 out 2022
Aprova o uso do canabidiol para o tratamento de epilepsias da criança e do adolescente refratárias às terapias convencionais na Síndrome de Dravet e Lennox-Gastaut e no Complexo de Esclerose Tuberosa.
(Sustado pela Resolução CFM Nº 2326 DE 24/10/2022):
O Conselho Federal de Medicina, no uso das atribuições que lhe confere a Lei nº 3.268, de 30 de setembro de 1957 , regulamentada pelo Decreto nº 44.045, de 19 de julho de 1958 , alterado pelo Decreto nº 10.911, de 22 de dezembro de 2021 , Lei nº 12.842, de 10 de julho de 2013 e Decreto nº 8.516, de 10 de setembro de 2015 , e;
Considerando que, nos termos do inciso II dos Princípios Fundamentais do Código de Ética Médica, o alvo de toda a atenção do médico é a saúde do ser humano, em benefício da qual deverá agir com o máximo de zelo e o melhor de sua capacidade profissional;
Considerando o artigo 7º da Lei nº 12.842, de 10 de julho de 2013 , que confere ao Conselho Federal de Medicina a competência para editar normas para definir o caráter experimental de procedimentos em medicina no Brasil, autorizando ou vedando sua prática pelos médicos;
Considerando a Resolução CFM nº 1.982, de 27 de fevereiro de 2012 , que normatiza a aprovação de novos procedimentos e terapias no Brasil pelo CFM;
Considerando o disposto no artigo 5º da Resolução CFM nº 2.113/2014 : Esta resolução deverá ser revista no prazo de 2 (dois) anos a partir da data de sua publicação, quando deverá ser avaliada a literatura científica vigente à época;
Considerando a RDC Anvisa nº 327/2019 , que cria uma nova categoria de produtos derivados de Cannabis e dispõe sobre os procedimentos para a concessão da Autorização Sanitária para a fabricação e a importação, bem como estabelece requisitos para a comercialização, prescrição, a dispensação, o monitoramento e a fiscalização de produtos de Cannabis para fins medicinais, e dá outras providências;
Considerando a RDC Anvisa nº 660/2022 , de 30 de março de 2022, que define os critérios e os procedimentos para a importação de produto derivado de Cannabis, por pessoa física, para uso próprio, mediante prescrição de profissional legalmente habilitado, para tratamento de saúde;
Considerando as disposições sanitárias publicadas pela RDC Anvisa nº 327/2019 , que facultam aos médicos a prescrição do canabidiol para uso compassivo, segundo as normas para prescrição de produtos do Receituário azul Tipo B ou Receituário amarelo Tipo A, conforme composição percentual de Tetrahidrocanabidiol (THC);
Considerando as revisões científicas sobre as aplicações terapêuticas e segurança do uso do canabidol realizada em dezembro de 2020 e em agosto de 2022;
Considerando a necessidade de controle tanto dos pacientes quanto dos médicos envolvidos com a terapêutica do uso do canabidiol;
Considerando, finalmente, o que ficou decidido na Sessão Plenária do Conselho Federal de Medicina realizada em 11 de outubro de 2022,
Resolve:
Art. 1º Autorizar a prescrição do canabidiol (CBD) como terapêutica médica, se indicadas para o tratamento de epilepsias na infância e adolescência refratárias às terapias convencionais na Síndrome de Dravet e Lennox-Gastaut e no Complexo de Esclerose Tuberosa.
Parágrafo único. Os pacientes submetidos ao tratamento com o canabidiol, ou seus responsáveis legais, deverão ser esclarecidos sobre os riscos e benefícios potenciais do tratamento por Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) (Anexo I).
Art. 2º É vedado ao médico a prescrição da Cannabis in natura para uso medicinal, bem como quaisquer outros derivados que não o canabidiol.
Parágrafo único. O grau de pureza do canabidiol e sua forma de apresentação devem seguir as determinações da Anvisa.
I - a prescrição de canabidiol para indicação terapêutica diversa da prevista nesta Resolução, salvo em estudos clínicos autorizados pelo Sistema CEP/CONEP.
II - ministrar palestras e cursos sobre uso do canabidiol e/ou produtos derivados de Cannabis fora do ambiente científico, bem como fazer divulgação publicitária.
Art. 4º Esta resolução deverá ser revista no prazo de 3 (três) anos a partir da data de sua publicação, quando deverá ser avaliada a literatura científica.
Art. 5º Revoga-se a Resolução CFM nº 2113/2014 , publicada no DOU de 16 de dezembro de 2014, Seção 1, p. 183.
Art. 6º Esta resolução entra em vigor na data da sua publicação.
JOSÉ HIRAN DA SILVA GALLO
Presidente do Conselho
DILZA TERESINHA AMBRÓS RIBEIRO
Secretária-Geral
ANEXOS:
ANEXO I: MODELO DE TERMO DE CONSENTIMENTO INFORMADO LIVRE E ESCLARECIDO
ANEXO I TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
Prezado(a) Senhor(a), Os dados abaixo visam orientá-lo(a), fornecendo-lhe informações importantes sobre o uso do canabidiol indicado pelo seu médico e os possíveis riscos associados.
DECLARAÇÃO DO PACIENTE
Eu,.....; portador da cédula de identidade nº....., ou meu representante legal,....., portador(a) da cédula de identidade nº....., declaro, para os devidos fins e efeitos de direito, que tomei conhecimento de que sou portador da enfermidade.....
Após a avaliação e investigação diagnóstica pelo médico....., fui informado sobre as possíveis opções de tratamento dos sintomas em decorrência da minha enfermidade. De acordo com o médico acima, de minha escolha, as medidas terapêuticas adequadas foram adotadas anteriormente a esta proposta de tratamento medicamentoso que estou escolhendo, tendo sido caracterizada a condição de REFRATARIEDADE MEDICAMENTOSA às medicações habituais e aprovadas para o controle clínico de minha doença.
REFRATARIEDADE MEDICAMENTOSA é definida quando pelo menos dois medicamentos, escolhidos e utilizados de maneira apropriada e em doses terapêuticas, não melhoraram de forma significativa os sintomas de minha doença, mesmo sem produzir efeitos colaterais significativos.
O médico me informou que alguns estudos sugerem que essa substância extraída da maconha (planta Cannabis sativa), chamada canabidiol (ou CBD), não produz os efeitos típicos da maconha e pode melhorar os sintomas que venho apresentando.
Fui igualmente informado de que, a exemplo de quaisquer outros procedimentos médicos, o medicamento proposto (CANABIDIOL) não é isento de riscos ou agravos à minha saúde. Os efeitos indesejáveis mais conhecidos, até o momento, são: sonolência, fraqueza e alterações do apetite, no entanto, efeitos em prazo mais longo ainda não foram adequadamente estudados. Além disso, o canabidiol pode interferir com a quantidade no sangue das medicações que estou utilizando, o que pode diminuir a eficiência delas ou aumentar seus efeitos colaterais indesejáveis.
Estou ciente que durante o tratamento podem surgir complicações de diferentes naturezas, como efeitos colaterais ainda não descritos ou reações alérgicas inesperadas.
Fui informado que o canabidiol ainda não é registrado como medicação, sendo sua prescrição indicada na situação de ausência de resposta de minha doença às outras medicações disponíveis. Também fui informado que o médico responsável poderá responder às minhas dúvidas quando necessário.
Sou igualmente sabedor que, apesar do empenho do meu médico, não existe garantia absoluta no resultado desta medicação com relação à melhora dos sintomas da minha doença.
Data Assinatura do Paciente Assinatura do Representante Legal Nome completo do médico
Ambiente científico: congresso nacional realizado por Sociedade de Especialidade vinculada à Associação Médica Brasileira (AMB).
Programa de Acesso Expandido: programa de disponibilização de medicamento novo, promissor, ainda sem registro na Anvisa ou não disponível comercialmente no país, que esteja em estudo de fase III em desenvolvimento ou concluído, destinado a um grupo de pacientes portadores de doenças debilitantes graves e/ou que ameacem a vida e sem alternativa terapêutica satisfatória com produtos registrados.
Fases de desenvolvimento de medicamentos para uso medicinal em humanos:
Fase I (Primeiro Estudo em Seres Humanos): é o primeiro estudo universalmente aceito em seres humanos, embora em pequeno grupo de voluntários sadios. Objetiva estabelecer uma avaliação preliminar da segurança e do perfil farmacocinético do novo fármaco.
Fase II (Estudo Terapêutico Piloto): estudo realizado com número limitado (pequeno) de pacientes (pessoas afetadas pela doença). Objetiva demonstrar a atividade farmacodinâmica e estabelecer, em curto prazo, a segurança do princípio ativo e também estabelecer as relações dose-resposta, com o objetivo de obter dados sólidos para consubstanciar os estudos posteriores.
Fase III (Estudo Terapêutico Ampliado): estudo realizado com grandes e variados grupos de pacientes. Objetiva determinar o risco-benefício a curto e longo prazo das formulações do princípio ativo e seu valor terapêutico relativo, além de explorar o perfil das reações adversas e características especiais: interações farmacológicas e biodisponibilidade.
Fase IV (Estudo Pós-Comercialização): estudo realizado com base nas características que autorizaram o novo medicamento. Objetiva fazer uma vigilância pós-comercialização para estabelecer o valor terapêutico, o surgimento de novas reações adversas, suas frequências e as estratégias de tratamento.
O Ato de Droga Orfã (DO) do FDA: prevê a concessão de um estatuto especial a um medicamento ou produto biológico ("droga") para o tratamento de uma doença rara ou condição a pedido de um patrocinador. Para um medicamento se qualificar para designação de medicamento órfão, tanto a droga e a doença quanto a condição devem atender a certos critérios especificados do FDA previstos na "21 CFR § 316". Órfão qualifica o patrocinador da droga para vários incentivos de desenvolvimento da ODA, incluindo os créditos fiscais para testes clínicos qualificados. Um pedido de comercialização para um medicamento de prescrição que recebeu designação de medicamento órfão não o torna sujeito a taxas de utilização de drogas de prescrição, a menos que o aplicativo inclua uma indicação de que não seja a doença ou condição rara para a qual a droga foi também designada.
Síndrome de Dravet: a epilepsia mioclônica grave é caracterizada por crises febris do tipo clônica, generalizadas ou unilaterais, geralmente prolongadas durante o primeiro ano de vida, e crises mioclônicas entre 1 (um) e 4 (quatro) anos de vida. A partir do início das crises mioclônicas, ocorre um atraso do desenvolvimento neuropsicomotor, atraso de linguagem, ataxia em 80% dos casos e hiperreflexia. As crises epilépticas são de difícil controle medicamentoso. O EEG mostra no início do quadro atividade teta rítmica de 4 Hz a 5 Hz nas regiões centro-parietais; tardiamente o EEG mostra complexos ponta-onda e polipontas-onda, por vezes, multifocal.
Síndrome de Lennox-Gastaut: é uma forma grave de epilepsia, caracterizada por diferentes tipos de crises epilépticas recorrentes, frequentemente associadas a retardo mental e a um padrão eletroencefalográfico característico, constituído por alentecimento da atividade de base, presença de complexos lentos ponta-onda (1,5 Hz a 2,5 Hz) de projeção difusa e predomínio anterior, além de descargas por polipontas (trem de espículas) de projeção difusa no registro eletroencefalográfico realizado em sono. A Síndrome de Lennox-Gastaut é responsável por 2% a 3% das epilepsias da infância. Geralmente ocorre em crianças de 1 (um) a 7 (sete) anos, principalmente na idade pré-escolar.
Síndrome de Doose: é uma epilepsia com crises mioclônico-astática, ocorre em 0,2% das crianças com epilepsia, apresenta características semelhantes à Síndrome de Lennox-Gastaut, na qual o retardo mental pode ser evitado com o controle adequado das crises epilépticas. A epilepsia inicia entre 2 (dois) e 5 (cinco) anos de idade, caracterizada por crises epilépticas do tipo dropattacks, mas outros tipos de crises podem estar associados. O EEG mostra ondas do tipo teta em região parietal. As crises epilépticas geralmente estão associadas com o declínio do desenvolvimento neuropsicomotor, podendo levar ao retardo mental e ataxia.
Epilepsia resistente ao tratamento: as que se enquadram na definição proposta pela International League Against Epilepsy (ILAE). (Fisher RS et al. A practical clinical definition of epilepsy. Epilepsia. 2014; 55:475-82): falha de resposta a adequado ensaio clínico com dois anticonvulsivantes tolerados e apropriadamente usados (seja como monoterapia ou em combinação) para alcançar remissão de crises de modo sustentado.
Berg et al. (1996) consideram uma criança portadora de epilepsia de difícil controle medicamentoso quando apresenta pelo menos uma crise epiléptica por mês, por um período mínimo de 2 (dois) anos e que, durante esse período, três diferentes drogas antiepilépticas foram utilizadas em monoterapia ou politerapia. (9 - BERG AT; LEVY SR; NOVOTNY EJ; SHINNAR S. Predictors of intractable epilepsy in childhood: a case-control study. Epilepsia. 1996;37 (1):24-30)
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