Declaração de Inadmissibilidade de Consulta COTRI Nº 7 DE 26/06/2024


 Publicado no DOE - DF em 26 jun 2024


ISS. Cooperativa. Serviço de intermediação. A Cooperativa de trabalho, na qualidade de intermediadora da prestação de serviços entre os seus cooperados e terceiros, atrai para si a correspondente sujeição passiva, caso materialize uma das hipóteses legais de incidência do imposto e haja um preço pelo serviço prestado.


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Processo SEI nº 04034-00001823/2024-00

ISS. Cooperativa. Serviço de intermediação. A Cooperativa de trabalho, na qualidade de intermediadora da prestação de serviços entre os seus cooperados e terceiros, atrai para si a correspondente sujeição passiva, caso materialize uma das hipóteses legais de incidência do imposto e haja um preço pelo serviço prestado.

I - Relatório

1. Pessoa jurídica de direito privado, estabelecida do Distrito Federal, apresentou Consulta abrangendo Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza - ISS, regulamentado neste território pelo Decreto nº 25.508 , de 19 de janeiro de 2005 - RISS.

2. Relata que é constituída na forma de sociedade Cooperativa do ramo de trabalho, produção de bens e serviços, sem fins lucrativos, tendo como objeto a prestação de serviços desenvolvidos por seus cooperados na área de tecnologia.

3. Aduz que, na dinâmica de suas operações, tem por finalidade "contratar serviços para seus cooperados em condições e preços convenientes; fornecer a assistência necessária aos cooperados, para que estes possam executar o seu trabalho da melhor forma possível; organizar o trabalho de modo a bem aproveitar a capacidade dos cooperados, distribuindo-os conforme suas aptidões e interesses coletivos; promover a melhor forma de negociar com o mercado consumidor os serviços e os produtos desenvolvidos pelos cooperados".

4. Informa que, na qualidade de intermediadora da prestação de serviços entre os seus cooperados e os tomadores de serviços, recebe os pagamentos e, após descontar uma taxa de administração, repassa os valores para os cooperados, enquadrando tal atividade como ato cooperativo puro, conforme o art. 79 da Lei nº 5.764/1971 .

5. Aduz que só existe prestação de serviço sujeita à incidência de ISS na relação que se estabelece entre cooperados e tomadores de serviço. Esses serviços são tributados não sobre o faturamento ou receita, mas sobre um valor fixo (per capta), já que cooperados se encontram na condição de profissionais liberais.

6. Narra que, para efeito de recolhimento de ISS, considera o serviço prestado e o imposto devido no local de estabelecimento da Cooperativa.

7. Informa que há associados domiciliados fora do Distrito Federal e que, na maioria das vezes, os serviços são realizados de forma remota, com intermédio da Cooperativa.

8. Aduz que esses associados não conseguem emitir guias de recolhimento do ISS per capta no sistema disponível, por não possuírem domicílio fiscal no Distrito Federal.

9. Diante disso, apresenta os questionamentos abaixo transcritos, ipsis litteris:

"De acordo com o art. 146, III da Constituição Federal; artigos 1º , 5º e 7º da Lei Complementar nº 116/2003 e artigo 79 da Lei nº 5.764/1971 , há incidência de ISSQN sobre a relação de representação dos associados da consulente (ato cooperativo) perante os tomadores de serviços?

De acordo com a LC 116/2003 - art. 3º e RISS - art. 5º, no âmbito do Distrito Federal, dada a natureza jurídica da consulente, considerando o recolhimento de ISS na modalidade per capta pelos associados, o tributo é devido ao Distrito Federal ou ao ente federativo no qual encontra-se domiciliado o associado?"

II - Análise

10. Em análise de recebimento da Consulta, a Gerência de Programação Fiscal - GEPRO, subordinada ao Centro de Gestão de Malha e Programação Fiscal - CEMPRO, atestou que o Consulente não se encontrava sob ação fiscal. Todavia, tendo-se em vista o início da fase de análise do mérito da matéria arguida, cabe à Gerência de Esclarecimento de Normas (GEESC) a análise da (in) admissibilidade da Consulta Tributária, mormente em atenção ao disposto no inciso IV do art. 56 da Lei ordinária distrital nº 4.567/2011, cuja análise não cabe àquele órgão.

11. Registra-se que a análise da matéria consultada está plenamente vinculada à legislação tributária.

12. Na situação narrada, por se tratar de uma Cooperativa de trabalho, estabelece-se uma relação entre esta e seus associados, profissionais autônomos na área de tecnologia. Ainda, forma-se uma relação entre esses associados e os terceiros que contratam os seus serviços. A Cooperativa age como intermediária, recebendo os pagamentos pelos serviços prestados, retendo uma taxa de administração e repassando o restante aos associados. Dessa forma, há também uma relação entre a Cooperativa e os terceiros, tomadores dos serviços.

13. A definição do que vem a ser Cooperativa de Trabalho encontra respaldo na Lei nº 12.690/2012 :

"Art. 2º Considera-se Cooperativa de Trabalho a sociedade constituída por trabalhadores para o exercício de suas atividades laborativas ou profissionais com proveito comum, autonomia e autogestão para obterem melhor qualificação, renda, situação socioeconômica e condições gerais de trabalho."

14. Na dicção da alínea "c" do inciso III do art. 146 da Constituição Federal , cabe à lei complementar editar normas dispensando adequado tratamento tributário ao ato cooperativo praticado pelas sociedades cooperativas. Em que pese até o presente momento não ter sido editada tal norma complementar, é mister observar a Lei nº 5.764/1971 que assim dispõe sobre o ato cooperativo:

"Art. 79. Denominam-se atos cooperativos os praticados entre as cooperativas e seus associados, entre estes e aquelas e pelas cooperativas entre si quando associados, para a consecução dos objetivos sociais.

Parágrafo único. O ato cooperativo não implica operação de mercado, nem contrato de compra e venda de produto ou mercadoria."

15. A Cooperativa de Trabalho recebe e organiza os profissionais a fim de que suas atividades sejam exercidas globalmente. Nos atos cooperativos entre as cooperativas e seus associados, não há remuneração que guarde relação direta com os serviços eventualmente realizados em prol dos associados, estando fora do campo de incidência do ISS. Resta esclarecer a extensão do conceito de ato cooperativo, especificamente, se ele abrange ou não a atividade de uma Cooperativa de Trabalho que atua como intermediadora de serviços executados por seus associados a terceiros, mediante a retenção de taxa de administração.

16. Pelo Princípio da Entidade, a personalidade jurídica da Cooperativa não se confunde com a dos seus associados. A Cooperativa, como pessoa jurídica, obterá faturamento nas suas relações com terceiros, sendo seus resultados positivos considerados receita tributável, nos termos dos arts. 86 e 87 da Lei nº 5.764/1971 :

"Art. 86. As cooperativas poderão fornecer bens e serviços a não associados, desde que tal faculdade atenda aos objetivos sociais e estejam de conformidade com a presente lei.

Art. 87. Os resultados das operações das cooperativas com não associados, mencionados nos arts. 85 e 86, serão levados à conta do "Fundo de Assistência Técnica, Educacional e Social" e serão contabilizados em separado, de molde a permitir cálculo para incidência de tributos."

17. A operação na qual a Cooperativa faz a intermediação de negócios com terceiros, oferecendo serviços a serem executados por seus cooperados e cobrando para si um valor específico para isso, não se qualifica como ato cooperado típico, haja vista que, mais do que meramente intermediar um serviço, a Cooperativa age como pessoa jurídica distinta de seus associados, desempenhando autonomamente papel na gestão do negócio assumido.

Nesse cenário, faz-se presente o ato cooperativo atípico, como são chamados aqueles praticados entre a cooperativa e terceiros não associados. Trata-se de Cooperativa auferindo receita própria, proveniente da sua atuação direta, que se sujeita à tributação.

18. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (Temas 177 e 323 da Repercussão Geral) firmou-se apontando para a possibilidade de tributação da receita advinda de operação de Cooperativa com terceiro não associado. Vejamos:

"EMENTA Recurso extraordinário. Repercussão geral. Artigo 146, III, c, da Constituição Federal. Adequado tratamento tributário. Inexistência de imunidade ou de não incidência com relação ao ato cooperativo. Lei nº 5.764/1971 . Recepção como lei ordinária. PIS/PASEP. Incidência. MP nº 2.158-35/2001 . Afronta ao princípio da isonomia. Inexistência. 1. O adequado tratamento tributário referido no art. 146, III, c, CF é dirigido ao ato cooperativo. A norma constitucional concerne à tributação do ato cooperativo, e não aos tributos dos quais as cooperativas possam vir a ser contribuintes. 2. O art. 146, III, c, CF pressupõe a possibilidade de tributação do ato cooperativo ao dispor que a lei complementar estabelecerá a forma adequada para tanto. O texto constitucional a ele não garante imunidade ou mesmo não incidência de tributos, tampouco decorre diretamente da Constituição direito subjetivo das cooperativas à isenção. 3. A definição do adequado tratamento tributário ao ato cooperativo se insere na órbita da opção política do legislador. Até que sobrevenha a lei complementar que definirá esse adequado tratamento, a legislação ordinária relativa a cada espécie tributária deve, com relação a ele, garantir a neutralidade e a transparência, evitando tratamento gravoso ou prejudicial ao ato cooperativo e respeitando, ademais, as peculiaridades das cooperativas com relação às demais sociedades de pessoas e de capitais. 4. A Lei nº 5.764/1971 foi recepcionada pela Constituição de 1988 com natureza de lei ordinária e o seu art. 79 apenas define o que é ato cooperativo, sem nada referir quanto ao regime de tributação. Se essa definição repercutirá ou não na materialidade de cada espécie tributária, só a análise da subsunção do fato na norma de incidência específica, em cada caso concreto, dirá. 5.

Na hipótese dos autos, a cooperativa de trabalho, na operação com terceiros - contratação de serviços ou vendas de produtos - não surge como mera intermediária de trabalhadores autônomos, mas, sim, como entidade autônoma, com personalidade jurídica própria, distinta da dos trabalhadores associados. 6. Cooperativa é pessoa jurídica que, nas suas relações com terceiros, tem faturamento, constituindo seus resultados positivos receita tributável. (...) 10. Recurso extraordinário ao qual o Supremo Tribunal Federal dá provimento para declarar a incidência da contribuição ao PIS/PASEP sobre os atos (negócios jurídicos) praticados pela impetrante com terceiros tomadores de serviço, objeto da impetração." (RE 599362, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, julgado em 06.11.2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-027 DIVULG 09.02.2015 PUBLIC 10.02.2015) (grifo nosso)

19. Logo, na hipótese de a atividade da Cooperativa envolvendo terceiros materializar serviço presente na Lista de Serviços do Anexo I do RISS e for cobrado um preço por esse serviço, é cabível a incidência de ISS.

20. Consta no Estatuto Social apresentado pelo Consulente que, dentre os objetivos da Cooperativa, está "contratar serviços para seus cooperados em condições e preços convenientes" e "promover a melhor forma de negociar com o mercado consumidor os serviços e os produtos desenvolvidos pelos cooperados", conforme as alínea "b" e "k" do § único do art. 2º.

21. É possível perceber circunstância na qual o Consulente age disponibilizando mão-de-obra qualificada (cooperados) a terceiros, sendo que o núcleo da prestação desse tipo de serviço se amolda à previsão do Subitem 17.04 - Recrutamento, agenciamento, seleção e colocação de mão-de-obra, da Lista de Serviços.

22. Nesse sentido, cuida-se de serviço tributado pelo ISS cujo o fato gerador é a prestação do serviço de agenciamento, seleção e colocação de mão-de-obra para terceiros; a prestadora é a Cooperativa, que será a contribuinte, à luz do art. 7º do RISS; e o tomador é o usuário.

23. À medida que a relação jurídica que se desenvolve entre a Cooperativa e terceiros é distinta daquela entre seus associados e esses mesmos terceiros, cada uma delas dará origem a diferentes fatos geradores de ISS.

24. O ISS, na operação em que a Cooperativa figura como prestadora, incide sobre o valor da taxa de administração retida, que é o preço do serviço. Já no que se refere ao desenvolvimento de serviços de tecnologia pelos cooperados, profissionais autônomos, o ISS vai ser recolhido anualmente, nos montantes específicos estipulados nos arts. 61 e 62 do RISS.

25. Sobre o tema, esta Gerência de Esclarecimento de Normas já se manifestou nesse sentido, na Solução de Consulta nº 9/2018, publicada no DODF em 13.11.2018, cuja ementa abaixo se reproduz:

"ISS. É fato gerador do imposto a situação que se amoldar na hipótese de incidência prevista em lei. A interveniência de cooperativa de trabalho, que materializar uma das hipóteses de incidência do imposto, atrairá para si a correspondente sujeição passiva."

26. Por outro lado, o repasse dos pagamentos recebidos pela Cooperativa àqueles cooperados que efetivamente executaram os serviços cobrados, após o decote da taxa de administração, caracteriza-se como ato cooperativo típico/puro, de modo que é autorizada a sua dedução da base de cálculo do ISS devido pela Cooperativa, fundamentada no art. 3º da Portaria SEF nº 59/2022 . Portanto, não há que se falar em bitributação. Vejamos:

"Art. 3º Para efeito de apuração do imposto devido pelas cooperativas, as deduções da base de cálculo aplicam-se somente aos serviços que configurem atos cooperados.

§ 1º Entende-se por ato cooperado os praticados entre as cooperativas e seus associados, entre estes e aquelas e pelas cooperativas entre si quando associados, para a consecução dos objetivos sociais, nos termos da Lei Federal nº 5.764 , de 16 de dezembro de 1971 e a Lei Federal nº 12.690 , de 19 de julho de 2012.

§ 2º Será objeto de dedução da base de cálculo:

I - a NFS-e emitida no Distrito Federal e aceita pelo tomador do serviço; e

II - a NFS-e emitida por cooperado inscrito no Cadastro Fiscal do Distrito Federal - CFDF e identificado no sistema.(Inciso acrescentado pela Portaria nº 318 DE 03.05.2024):

III - a NFS-e emitida por prestadores de serviços localizados fora do Distrito Federal."

27. Cumpre à Cooperativa emitir Nota Fiscal de Serviços eletrônica (NFS-e) para os tomadores não associados pelo pagamento referente aos serviços prestados pelos seus associados. Por sua vez, é responsabilidade dos associados emitirem NFS-e para a Cooperativa, indicando os valores que lhes foram repassados, já descontada a taxa de administração, ainda que recolham ISS per capita. À medida que estes valores estejam registrados, quando a Cooperativa gerar guia de ISS próprio, conseguirá abater todos os serviços dos associados.

28. Para determinar o ente federado competente para exigir ISS sobre os serviços realizados por associados de fora do Distrito Federal, importa observar a regra geral do art. 3º da Lei Complementar nº 116/2003 , reproduzida no art. 5º do RISS. Essa norma dispõe que o serviço é considerado prestado e o imposto é devido no local de estabelecimento prestador ou, na falta do estabelecimento, no local do domicílio do prestador.

29. Consigna-se que mesmo os cooperados que residem em outras unidades federativas precisam emitir NFS-e para o Distrito Federal. Isso é necessário para possibilitar o abatimento dos valores que lhe foram repassados do faturamento da Cooperativa, a fim de que esta possa apurar o ISS devido, consoante o § 2º do art. 3º da Portaria SEF nº 59/2022 .

30. Finalmente, caso haja dúvidas afetas ao modo de emissão de nota fiscal pela Cooperativa ou sobre a dedução da base de cálculo do ISS dos valores repassados aos associados, recomenda-se ao Consulente acessar a página eletrônica desta Subsecretaria de Receita, no endereço eletrônico https://www.receita.fazenda.df.gov.br/, dirigindo-se ao link "Atendimento Virtual", para interagir com o setor competente para oferecer orientações sobre essas questões de natureza procedimental.

II - Conclusão

31. Em atenção às indagações apresentadas, informa-se que:(1) Há incidência de ISS sobre a relação de representação dos associados do Consulente perante os tomadores de serviços, mediante taxa de administração.(2) Conforme a regra geral do art. 3º da Lei Complementar nº 116/2003 , o serviço considera-se prestado e o ISS devido no local de estabelecimento prestador ou, na ausência de estabelecimento, no local do domicílio do prestador. Portanto, no que concerne aos associados - profissionais autônomos que recolhem ISS em valor fixo mensal -, o tributo é devido ao ente federativo no qual se encontram estabelecidos ou domiciliados.

A presente Consulta é ineficaz, nos termos do disposto na alínea "c" do inciso I do art. 77 do Decreto nº 33.269 , de 18 de outubro de 2011, observando-se o disposto nos §§ 2º e 4º do art. 77, bem como no parágrafo único do art. 82, do mesmo diploma legal.

À consideração superior;

Brasília/DF, 21 de maio de 2024

LUÍSA MATTA MACHADO FERNANDES SOUZA

Gerência de Esclarecimento de Normas

Gerente

Aprovo o Parecer supra e assim decido, declarando a ineficácia da presente Consulta, nos termos do que dispõe a alínea "c" do inciso VI do art. 1º da Ordem de Serviço SUREC nº 129, de 30 de junho de 2022 (Diário Oficial do Distrito Federal nº 124, de 5 de julho de 2022, página 4).

Encaminhe-se para publicação, nos termos do inciso III do art. 252 da Portaria nº 140, de 17 maio de 2021.

Brasília/DF, 25 de junho de 2024.

DAVILINE BRAVIN SILVA

Coordenação de Tributação

Coordenadora